#32anos: “A consciência ambiental crescente por parte dos stakeholders irá determinar a evolução dos novos investimentos”

No ano em que a Ambitur comemora o seu 32º aniversário, e quando as empresas do setor do turismo conseguiram finalmente “respirar” depois das ondas negras que a pandemia trouxe a nível global, quisemos ouvir os Conselheiros Ambitur, assim como a secretária de Estado do Turismo e o presidente do Turismo de Portugal, sobre o que nos pode esperar nos próximos tempos. Que desafios se levantam na próxima década e que resultados deve o turismo ambicionar, quais os grandes objetivos e estratégias a ter em mente e que temas estruturais importa resolver? Foi a estas questões que procuraram responder. O horizonte não se assemelha tão risonho como as empresas turísticas ou os organismos que tutelam o setor gostariam e muitos são os fatores que provocam incerteza e dúvidas sobre o futuro. Como perspetivam então este novo turismo que temos pela frente? Ouvimos hoje o que nos diz Manuel Proença, presidente do Grupo Hoti Hotéis e Conselheiro Ambitur.

Os desafios que se colocam ao nosso setor turístico na pós-pandemia são diversos e com níveis de complexidade heterogénea, mas sempre subordinados ao grande objetivo de conseguir melhor qualidade, mais valor acrescentado e maior sustentabilidade no longo prazo. Numa análise de alto nível, há cinco grandes áreas que influenciarão o turismo no futuro:

  • As alterações climatéricas e o impacto crescente dos fenómenos climáticos, influenciarão a forma como irá evoluir o setor. As garantias de redução das emissões de gases poluentes, recentemente anunciadas na COP 27 para cumprimento dos objetivos de Paris, terão seguramente consequências no turismo.

A consciência ambiental crescente por parte dos stakeholders, nomeadamente clientes e financiadores, irá determinar a evolução, natureza e localização dos novos investimentos turísticos.

Questões como a incorporação dos custos ambientais no modelo de desenvolvimento, nomeadamente as taxas de carbono, o aumento do custo energético e da água, influenciarão o modelo de serviço a prestar e obrigará o setor a adaptar-se e a evoluir para novos conceitos de mobilidade e de serviço. As preocupações ambientais implicarão, por isso, importantes investimentos da indústria turística, e da hoteleira em particular, para melhorar a sua eficiência.

A reflexão sobre a capacidade de carga dos destinos turísticos e o modelo de gestão que potencie a maximização do rendimento da atividade turística, serão eixos centrais para as futuras decisões das empresas e dos governos.

  • A evolução da sociedade ocidental, vai gerar novos desafios e novas oportunidades, com o surgimento de novos segmentos de procura. A dinamização do teletrabalho e a digitalização das organizações veio dinamizar o surgimento de um novo segmento de procura: – os nómadas digitais e os residentes temporários. Estes segmentos valorizam atributos que a indústria turística terá de incorporar na sua oferta para dar resposta às suas necessidades e potenciar o seu rendimento.

O aumento da produtividade da sociedade e a tendência crescente para a redução do trabalho semanal, nos países mais desenvolvidos, poderão incentivar novos comportamentos e tipos de procura, com a dinamização dos short breaks e um aumento das viagens de curta e média distância em lazer.

A maior consciência e preocupação crescente dos clientes pelas boas práticas de sustentabilidade ambiental e social vai aumentar a pressão e obrigar a uma maior adaptação dos prestadores de serviços do setor turístico para inovar e implementar novas práticas mais alinhadas com a mitigação da pegada ambiental.

  • O enquadramento macroeconómico dos próximos anos, será também desafiante para o futuro do setor, nomeadamente a alteração do paradigma relativo à estabilidade de preços e às taxas de juro dos financiamentos, muito importantes para o investimento, em particular, no setor da hotelaria.

É, por isso, expectável que o setor se confronte com uma realidade mais adversa, a curto prazo, nomeadamente com taxas de juro e custo do capital muito mais elevados do que a realidade no passado recente. Este enquadramento, obrigará seguramente a redefinir os modelos de crescimento e os objetivos dos investidores.

  • A imersão permanente da sociedade no mundo da tecnologia, continuará a tornar-nos cada vez mais recetivos a aceitar ou até preferir a tecnologia, onde existia contacto humano. Se as exigências do mercado laboral forem tornando a prestação dos serviços de hospitalidade progressivamente mais complexa, é de esperar que cada vez mais componentes desses serviços sejam providenciados pela tecnologia, por persuasão ao auto-serviço, que passa a ser assegurado pelo próprio cliente. O alastrar da tecnologia trará também a oportunidade para que a prestação dos serviços de excelência seja garantida pela rapidez e fiabilidade do processo digital, significativamente enriquecida pela qualidade do contacto humano, sentido de empatia e capacidade de resolver problemas inesperados dos clientes.

 

  • Na área laboral, estaremos perante uma nova gestão das pessoas num mundo pós-pandémico, com o mercado de trabalho cada vez mais reduzido, competitivo e exigente, o que obrigará a indústria de serviços a inovar na abordagem à retenção e captação de mão-de-obra e a recrutar trabalhadores no estrangeiro.

O capital humano será crítico no médio prazo, para garantir a melhoria das experiências e qualidade de serviço a prestar aos clientes, e consequentemente a competitividade do setor.

No futuro, não será só relevante pagar melhor para reter talento, mas também dar formação, perspetivas de carreira, prémios anuais, boas condições laborais e reconhecimento pelos contributos de cada colaborador das nossas empresas.

Porém, num país com uma das mais baixas taxas de produtividade da Europa – como é o caso de Portugal – onde ainda existem trabalhadores a gozar um só dia de folga semanal, não faz sentido, é desajustado e inoportuno, alinhar na moda, e passar ao regime laboral da semana de 4 dias, num setor que funciona 24 horas por dia e 7 dias por semana.

Neste contexto, temos que estar preparados e motivados para responder positivamente aos novos desafios que se nos deparam e contribuirmos, conjugadamente, setor privado, público e governo, na justa medida das suas funções e responsabilidades, para um setor turístico, com mais qualidade, mais sustentável e mais competitivo, no que estou certo, vamos conseguir.

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