“A ambição é querer ser diferente”

Quem é António Loureiro? Uma pessoa que tem sempre uma piada para contar? Uma pessoa para quem a relação pessoal é sempre mais forte que a profissional? Uma pessoa que não gosta que lhe façam frente…
Acordo sempre otimista, raramente acordo mal disposto. Relativamente às amizades, é verdade, não quer dizer que isso seja sempre bom no negócio, porque às vezes esperamos um determinado tipo de reações e ficamos perturbados se essas não acontecem. Mas também não vou mudar aos 56 anos. Coloco sempre muito a relação pessoal atrelada à relação profissional. Estou nisto há 32 anos, são as pessoas que conheço, no fundo os meus clientes já são os meus amigos de casa, já não é fácil separar as coisas… É com eles que vou à pesca, ao teatro, aos concertos. Sempre com pessoas ligadas ao turismo… É um pouco difícil separar isso, a minha mulher queixa-se um pouco…

Foi uma caminhada difícil até atingir a sua posição na Travelport?
Não. Tive muita sorte ao longo da minha carreira, pois a minha vida coincide com aquele momento em que era necessário uma pessoa para aquela posição e consideraram que eu tinha as competências para o fazer. Já tinha um background técnico nesta área, já tinha relações com os GDS enquanto estive na aviação, tendo sido fácil a transição, assim como a minha integração na área de vendas.

Como começou o seu percurso profissional?
Comecei como vendedor das Páginas Amarelas, o que me deu uma experiência comercial muito forte. Depois entrei para a aviação para a LAR, ainda como TAP; estava-se na transição. Tive depois a sorte de ir para os Açores, tendo pedido uma licença sem vencimento, onde fiquei a conhecer muitos dos seus profissionais assim como o arquipélago. Aqui ganhei muita experiência do ponto de vista operacional diretamente relacionado com os aviões, mas também por aí fui conhecendo as agências todas que fretavam os aviões na altura das companhias que representava. Depois voltei para a LAR Transregional e estive até à saída. Soube em 1991 que a Galileo iria sair da TAP, algures no tempo, tendo acontecido oficialmente a 7 de outubro de 1992, sendo que nós já estávamos contratados para ir para o GDS.
Entrei para a Galileo então numa fase de migração dos sistemas, o que para mim era fácil, porque conhecia quer os sistemas por parte da Galileo Internacional, quer da TAP. Acabei por ter sucesso na forma como conduzi a parte da migração dos sistemas, porque na altura havia uma fricção normal entre as duas entidades. Na altura batemos alguns recordes de migrações, mas o que é facto é que, quando terminámos a migração, não tínhamos a maioria do mercado, pois alguns clientes neste processo passaram para a WorldSpan.
Depois desta função técnica, atribuíram-me o cargo de Sales Manager, ainda com um Country Manager da TAP. Quando Gordon Wilson, hoje presidente da Travelport, chega a Portugal, em 1995, nomeia-me Sales & Marketing Manager. Após um ano e meio, Gordon Wilson sai e entra o Pedro Barata, que esteve de 1998 a 1999, sendo nomeado para o cargo no final de 1999. Estive então os últimos 25 anos nesta empresa.

Fazer parte de uma multinacional da dimensão da Travelport implica o quê? Que obrigações e deveres lhe são inerentes?
Para a maneira de ser de um Português não é fácil estar num cargo destes. Aquilo que antes de estarmos cotados em bolsa fazíamos, a partir do momento em que entramos em Bolsa tudo muda. Já não foi fácil da primeira vez, quando entrámos para a Cendant. Depois aliviou, pois estávamos cotados via Cendant e não diretamente. Atualmente não, estamos cotados diretamente. Tudo é muito mais rígido e, muitas vezes, com a mentalidade portuguesa, temos dificuldade em explicar e perceber o funcionamento da empresa, dos seus compromissos.
A equipa portuguesa é a equipa mais antiga da Europa, com uma rotatividade pequena ao longo destes 25 anos.

Em Portugal, o empresariado deveria estar mais atento ao mundo das multinacionais, tentando retirar algo mais para a gestão dos seus negócios?
Num paralelismo com uma agência de viagens multinacional da área do corporate, vê-se que há pequenos detalhes, e não tem a ver com o GDS com o qual trabalham; formas de trabalho diferentes, de ‘report’, e é nessa área que vamos trabalhar este ano, e tentar chamar a atenção aos nossos clientes para não ficarem para trás. Não estou a dizer que uns tenham coisas melhores que os outros, mas têm coisas diferentes, que talvez as empresas valorizem mais, ou de uma forma diferente. Isso permite-lhes ter uns ‘fees’ diferentes, um valor acrescentado palpável. As multinacionais têm determinadas pequenas funcionalidades, seja no apoio ao passageiro, entre outros, que lhes dão uma mais-valia. Têm, por exemplo, o serviço orientado para o facto de cobrarem mais caro, sendo mais competitivas. E a marca também tem um peso de destaque. Uma empresa gosta sempre de ser servida por uma multinacional.
Este ano iremos fazer um inquérito às empresas exatamente para aferir quais as preferências que estas dão no relacionamento com as agências.

Na Travelport já foi considerado o melhor country manager de todo o mundo; o que significa esta distinção para si?
Não estava à espera da distinção. No dia em que começa a conferência anunciaram o prémio e passaram-me um cheque. Não estava mesmo à espera. O Cristiano Ronaldo está habituado a que lhe digam que é o melhor todos os dias, eu não, foi especial. Naquela altura foi uma distinção justificada. Vínhamos de uma série de sucessos, que coincidem com sermos a melhor organização da Europa. Estava na altura indexado para ir para o Brasil.

Mudou algo para si?
Internamente, dentro do grupo, passámos a ser mais conhecidos, tornando-se mais fácil o relacionamento com as divisões mundiais do Grupo. Ao recebermos esta distinção as pessoas pensam que temos algo diferente.

Recentemente, ao receber a Medalha de Mérito Turístico Grau Ouro da APAVT, ressalvou que esta distinção tinha ainda mais significado para si. Porquê?
Teve mais importância porque é um reconhecimento nacional. Em 1995 fui ao Congresso da APAVT e fiquei impressionado com o que se fazia, tendo então tomado a decisão de sermos os maiores apoiantes desta Associação, que será sempre a única que representará todo o setor. Sinto que este foi um reconhecimento por essa decisão e manutenção da mesma ao longo dos anos. Esta foi uma distinção pessoal, o que dá um gostinho especial.

Como define ambição… considera-se ambicioso?
Sim. A ambição é conseguirmos concretizar uma parte dos sonhos, em termos profissionais, o que para mim é muito importante. Sou muitas vezes acusado de querer fazer tudo e de estar em tudo, e isso é verdade… muitas vezes estamos por detrás de coisas que umas falham outras não. A ambição é querer ser diferente e fazer coisas diferentes para ajudar a atividade do turismo em Portugal, essa é a minha ambição.

Se não trabalhasse no turismo em que setor gostaria de trabalhar?
Apenas na aviação.

O que tem o turismo de tão especial?
Mexe com tudo, é transversal a tudo. Todos os dias no ensina uma coisa diferente, mesmo quando pensamos que em algo não há conexão com a atividade turística, ela aparece. Por exemplo, quando se trabalha numa multinacional de tecnologia, e tendo em conta o que esta abarca todos os dias, por vezes é difícil acompanhá-la dia a dia. Agora veja na atividade do turismo o que vem por aí… Mais importante do que acompanhar a parte da evolução é parar de falar nas tendências e começar a falar nas realidades.

O que falta aos empresários nacionais para chegarem mais longe?
Só falta uma grande capacidade de investimento. Não vão mais longe não é por falta de qualidade ou ideias. Estamos todos reféns uns dos outros e acabamos por não conseguir movermo-nos exatamente por isso. Este é um negócio de margens muito pequenas, todos já sabemos quanto é que isto liberta. Uma agência de viagens que não tenha uma componente de incoming terá alguma dificuldade em sobreviver ou manter-se competitiva. O corporativo não chega para tudo, até porque o que este quer das agências de viagens é crédito.

Depois do mobile para onde se encaminha a tecnologia?
Não faço a mínima ideia. Há coisas que há cinco anos eu só pensava que viriam daí a 20, e hoje já as temos. Neste momento têm que se estudar as realidades, senão estaremos a inventar disparates que nunca irão funcionar. Estamos num patamar em que a tecnologia só é travada por regulamentos, decretos-lei ou legislação, não é travada por mais nada. Na Europa há sempre o medo de substituir as pessoas, o facto da nova geração vir toda ela já formatada.

*Esta é a 2ª Parte da Grande Entrevista publicada na Edição 298 da Ambitur.

Leia aqui a 1ª parte.