Adolfo Mesquita Nunes: “O setor privado não pode assumir compromissos que presumem que a normalidade voltou”

E porque a economia portuguesa depende muito do turismo, este setor merece uma “atenção extraordinária” por parte das políticas públicas: “Estamos a falar da suspensão de uma das principais atividades económicas portuguesas, o que significa que a sua paragem por mais tempo do que o normal provoca não só efeitos económicos mas também sociais graves”.

E foi precisamente sobre que “políticas públicas” podem e devem ser adotadas para o turismo que Adolfo Mesquita Nunes, secretário de Estado do Turismo entre 2013 e 2015, se debruçou no webinar “Covid-19 e Turismo: e daqui em diante?”, promovido pela Escola Superior de Hotelaria e Turismo do Estoril (ESHTE) e que contou com a participação de outros antigos secretários de Estado do Turismo. “Faz sentido ter um plano especial para o setor, não tanto pela crise em que vai trabalhar, mas pelos efeitos sociais que pode gerar”, afirma o responsável, ressaltando que “ainda é muito cedo para perceber com que linhas é que o setor do turismo se vai ‘coser’”. E porque o turismo depende “não apenas do nosso mercado” mas também “daquilo que se passa nos principais mercados emissores”, o responsável atenta que “não temos noção” que limitações serão impostas em caso de uma segunda vagaOs países vão adotar as mesmas regras de confinamento e proibições que adotaram nesta primeira fase? Que países é que o vão fazer? De que forma é que, com fronteiras fechadas, isso pode impactar o setor?”. Sendo um setor particularmente “exposto à concorrência por si”, Adolfo Mesquita Nunes realça que agora “está igualmente exposto às decisões políticas que vão ser tomadas pelos outros estados”.

E é neste quadro de incertezas que o setor deve trabalhar, considera o responsável, ressaltando que o “setor privado” não pode “assumir compromissos que presumem que a normalidade voltou quando temos tantas incógnitas pelo caminho”.

Quando se falam em perdas e quedas abruptas, Adolfo Mesquita Nunes recorda que o “essencial do nosso destino está cá e não foi destruído”, sendo fulcral “garantir que o setor privado se mantém” e, para tal, são “necessárias políticas de apoio por mais tempo”. Também “alterar as políticas de comunicação”, adaptando-as aos “erros de perceção que as pessoas podem ter relativamente à viagem”, fazem parte do leque de adaptações que o setor deve ter em nota e que vão reforçar,“não só as questões de segurança” mas também “as motivações e as experiências”. Já do ponto de vista autárquico e nacional, o responsável defende também uma “adaptação do espaço público” à necessidade de transmitir essa mensagem de segurança sanitária.

Por outro lado, também o setor empresarial terá que se “adaptar” àquilo que são as “novas exigências da procura” e perceber que as “propostas de valor” de há seis meses podem estar “desatualizadas” mas sem “ter perdido qualidade”. Desde a animação turística à hotelaria, passando pelas agências de viagens, “todos têm que adaptar a proposta de valor àquelas que são as novas exigências da procura”. E, neste setor, o responsável salienta a necessidade de ser garantido um “fluxo maior de comunicação e mais segmentado para as empresas”. Atualmente, as regras têm sido adaptadas à realidade de cada empresa pelo que é necessário “protocolos sanitários adaptados a cada uma das atividades”, isto é, um “gestor de destino” capaz de responder às questões: “O que precisa de fazer perante um surto? Como é que se deve posicionar? Ou que mecanismo é que deve ativar?”.

Numa mensagem otimista, o antigo secretário de Estado não tem dúvidas de que o setor tem todo o potencial para crescer: “Isso não se alterou”. No entanto, é crucial que o “ecossistema” se mantenha “intacto para beneficiar dessa realidade”. Também a “resposta” do mercado nacional é motivo de otimismo: “Há muitas oportunidades que o setor vai ter para se desenvolver e inovar”, mas, para tal, precisam de ser “garantidos instrumentos do ponto de vista financeiro”.

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