#Agênciasdeviagens: “É crucial existir responsabilidade solidária entre agências”

Que futuro norteará o setor das agências de viagens, quais os caminhos que poderão ser os mais indicados? Em tempos de mudança, Ambitur.pt está a publicar auscultações feitas a vários quadrantes do setor de distribuição de viagens em Portugal. Maria José Silva, CEO da RAVT, responde a três questões essenciais.

 

Voucher: esta é a solução ideal para o setor das viagens ou um mal menor?

“a) Considerando a situação gravíssima de não obtenção de devolução dos valores pelos fornecedores, que vão com isto deixar todo o resto da cadeia de valor do Turismo sem esse capital para poder devolver aos clientes de imediato, o que existe agora nesta solução é apenas um mal menor, que ajuda a resolver uma parte de problemas, para apenas alguns tipos de viagem e de serviços turísticos, em determinadas datas, numa determinada circunstância. Contudo, o que permite algum oxigénio para poder continuar a operação, ter tempo e mais lucidez para encontrar em conjunto as melhores soluções para todos, desde destinos, produtores, intermediários e clientes.

  1. A situação ideal seria a devolução total do pagamento integral dos valores pagos pelo cliente, dos serviços não prestados, mas que permitisse, obviamente, acautelar que a prestação dos fornecedores, agências e seus parceiros, que prestaram serviços em reservas e apoio constante antes, durante e após esta crise COVID, tivessem alguma remuneração dos seus serviços. Creio que os clientes nas suas vidas não trabalham para ninguém Pro Bono e as suas empresas não prestam serviços de igual modo free.
  2. No entanto, não se pode, em cenário tão grave, o pior do século segundo muitos especialistas mundiais, esperar ter um pó de mágica e daí nascer uma única solução que seja o milagre da salvação de todos os males e de forma standard em serviços que são cada vez mais tudo menos standard, que têm de tal forma complexidade e diversidade que sabíamos não conseguir amenizar impactos em todas as opções, mesmo que se tenha pedido muito, tudo de tudo, que se tenha tentado o máximo que se pode e sabe. Neste processo, o esforço foi elevado, de equipa alargada, com união e cooperação como nunca existiu, entre APAVT, os grupos de redes de agências de todos os tipos e formas de operar, bem como operadores. Só isso já foi de louvar e sabemos agora que conseguimos unir esforços quando é bem necessário, em harmonia e prol de um objetivo comum e o bem de quem representamos.
  3. Poderia ser melhor? Podia. Como em tudo na vida, mas o perfeito é inimigo do bom e da necessidade de resposta urgente. Foi o possível, já é uma vitória termos algo e há que agora centrar-se no positivo porque de negativo para nos desorientar já existe todo o resto do ambiente PEST. Mais vale um pássaro na mão que todos a voar. Na verdade, a parábola do copo com água a meio aplica-se muito bem aqui, há que ver a realidade, nem meio cheio e nem meio vazio, é uma sorte em tempos de “guerra” e recessão, de crise forte, a pior do século, poder ter um copo, ainda ter água para matar parcialmente a sede e ainda poder perder tempo a opinar. Opinar e dissertar agora se o copo está cheio, vazio, se é branco ou vermelho, se quente ou frio, se seria melhor redondo ou quadrado, que poderia ter sido maior ou mais pequeno, mais largo ou mais ajustado, mais leve ou mais pesado, enquanto a sede persiste, há urgência em solucionar, em agir, é desviar do ponto essencial, a necessidade vital de “matar a sede” e poder continuar, sem morrer de imediato.
  4. Esta lei é a primeira pedra lançada na construção de uma casa até ao telhado, a base está lançada e daqui em diante permite muitas renegociações paralelas com todos os tipos de serviços e fornecedores. Step by Step e temos até 31 de dezembro de 2020″.

 

Que outras questões estão hoje em cima da mesa para o setor das agências de viagens, como poderão ser resolvidos e qual/ais a/s sua/s urgência/s?

“Neste momento temos todas as questões em cima da mesa, desde logo como resolver este tsunami, como manter empresas, como manter equipas, como corresponder a necessidades sanitárias, como pagar impostos, quando se pode abrir, como, onde, valerá a pena agora, ou depois, qual será a forma de operar a seguir, como ficam os hotéis, quais, como ficam os cruzeiros, como ficam as companhias aéreas, como se terá que proceder na nova realidade, quais o preços disto, que destinos vão abrir fronteiras, que tipos de vistos, taxas turísticas, destinos com que capacidade de receber fluxos, quando, como, onde, que produtos poderemos vender, com que parceiros, com que segurança, como dar confiança aos clientes, …. uma imensidão de questões que não caberiam aqui nestas poucas linhas. Na verdade, num único momento um bicharoco invisível obriga a uma mudança profunda, com enorme rapidez, obriga a rever todos os destinos, todo o globo, todas as estruturas, todas as formas de pensar, todas as forma de agir, as formas de se relacionar, as formas de ser e de sentir”.

 

A responsabilidade das agências e do FGVT tem que ser revista? 

  1. “FGVT – não me parece ser necessário rever. Na verdade, a tão contestada solidariedade de agências, que parece primeiro assustar, isto se fossemos todos um bando de egoístas, inconscientes, aldrabões, incapazes e irresponsáveis, o que não somos, vem agora mais do que nunca mostrar o quanto é crucial existir a responsabilidade solidária entre agências, o que as obrigou a pensar e agir em união, em responsabilidade e com solidariedade dos operadores, que os obriga a terem que cumprir o mesmo que as agências retalhistas e a terem que devolver valores aos clientes, a ajudar o subsetor e o cliente final. Estes sem isto poderiam bem desertar e deixar, no final, os agentes sós a cumprirem o enorme risco e responsabilidade perante o cliente final, o que não é o caso, não só pela solidariedade de FGVT, mas pela solidariedade e verdadeira parceria entre agentes grossistas e retalhistas. Atuamos em equipa e necessitamos uns dos outros, somos totalmente interligados e interdependentes e isso, de uma vez por todas, os agentes e o setor têm que entender. Aplica-se uma das grandes máximas de gestão, estratégia, liderança, de cooperação: Teoria de Jogos, que demonstra maior eficácia não deixando nenhum prejudicado, quando atuam unidos, em conjunto, revelando maior força, maior cumplicidade, maior é a possibilidade de sobreviver que apenas cada um por si. Parece algo básico até para o meu filho que já com 5 anos gritava ao ver o D’Artagan – Um por todos e todos por um!
  2. da Revisão da Diretiva, o oposto do acima, claramente necessita de revisão. Sem bem se lembram dos factos, sempre foi contestada ao longo de anos por todas as associações de todos os países e formatos, pela Ectaa, Gebta, WTAA e por aí fora, grandes e pequenas. Pois sempre foi claro que a responsabilidade solicitada e o risco gigante, o fardo que meteram apenas numa só peça do motor, em cima da operação e distribuição, é Brutal, injusto e prova-se agora inviável e inexequível sem levar um setor inteiro ao chão e com isso estruturas inteiras sociais e económicas dos países. Contudo, os votos pesaram mais na cabeça dos líderes da altura e a Defesa do Consumidor conseguiu mais do que devia, colocando-se, em casos extremos como o desta crise, em situação de inimigo próprio, uma vez que a cumprir escrupulosamente a lei da Diretiva iria levar à rutura da maioria das empresas e ficariam sem proteção e sem nada de nada , com os seus serviços e valores financeiros perdidos para sempre.

Felizmente, por todos os países do mundo, entenderam a gravidade do monstro diretiva de viagens que criaram e agiram de forma a amenizar impactos, para primeira resposta à crise. Contudo, o passo seguinte, vital, será não continuar a insistir no mesmo erro e rever de uma vez esta diretiva. Alguns países estão já neste sentido e espero que Portugal seja o próximo com consciência e responsabilidade para defender o Estado, as empresas, o setor que tanto ajuda a economia e os clientes.

Deixo apenas mais um par de considerações. Só conseguiremos ultrapassar esta fase e manter o Turismo e toda a máquina pronta para operar em finais de 2020, ou em 2021, estando todos unidos, todos a tentar aguentar os castelos que neste setor são construídos com peças de dominó, e assim que deixarmos cair algumas em locais estratégicos, ou com algum aglomerado, cairá tudo a seguir. Porém, é sabido que os agentes, como já escrevi antes, são como o Bambu, abanam, batem com a cabeça no chão, mas relançam-se, aguentam. O turismo idem, mostrou ser das atividades com maior resiliência e capacidade para rápidas recuperações de economias inteiras, de países inteiros, com efeito multiplicador fantástico e lá chegaremos novamente, com uma nova normalidade semelhante embora melhor que antes. Agora é aguentar ao máximo o embate, não desmotivar, não desistir, e após a tempestade, mais lindo será o arco-íris e melhor será a bonança. Sairemos todos melhores, com enorme aprendizagem e reajustes que já seriam necessários. Demora, mas não tarda”.