O Alentejo é o destino do mês de junho na Ambitur.pt. Num roteiro de cinco dias pela região norte e centro deste vasto território, pudemos conhecer melhor as histórias e “estórias” de projetos, imóveis, centros interpretativos, lugares de “culto” aos vinhos e à boa gastronomia alentejanos, sempre contadas pelos próprios, por quem ali vive e melhor do que ninguém sabe do que está a falar.

E a história de hoje é Ruben Honrado quem a conta. De Vila de Frades para Silicon Valley, nos EUA, foi o percurso escolhido por um filho desta terra alentejana para se profissionalizar e poder contribuir com uma visão moderna e inovadora para o projeto iniciado pelos pais. Desde os seus seis anos que António Honrado, o pai, faz vinho de talha e sempre teve o sonho de abrir um restaurante onde esse vinho pudesse estar presente. E assim foi, há cerca de 25 anos, com o País das Uvas, em homenagem a um livro escrito por um autor local, Fialho de Almeida. Neste espaço, as talhas servem de elemento decorativo, mas não só; mantêm sobretudo o seu papel de armazenamento do vinho até ao dia em que são abertas e o vinho pode ser consumido por quem não quer deixar morrer a tradição.
E em Vila de Frades podemos dizer que, de facto, a tradição ainda é o que era, transmitindo-nos a sensação de que o tempo parou. Mas a verdade é que não parou e pelas mãos das novas gerações é possível preservar o que é tradicional sabendo como o fazer chegar mais longe e a mais pessoas.
Interessa agora perceber como surgiu o vinho de talha e ficamos a saber que foram os romanos que, há mais de dois mil anos atrás, o trouxeram para esta região da Vidigueira e Vila de Frades, um património que não era seu mas da Arménia. Nas Ruínas de São Cucufate, onde existiu em tempos uma enorme vila romana, descobriram-se vestígios arqueológicos, ainda há bem pouco tempo, que revelam pele de uvas da casta Antão Vaz, aquela que predomina nesta região, bem como grainhas e pedaços de talha. Isso veio confirmar o que já se sabia por aqui: que esta é a capital do vinho de talha. E por isso mesmo a candidatura de Vila de Frades para que esta região seja reconhecida pela UNESCO como capital do vinho de talha já foi entregue e, a ser aceite, trará ainda uma maior visibilidade a todo o território.
No concelho de Vidigueira e, mais concretamente, em Vila de Frades, há pequenos produtores de vinho de talha por todo o lado, havendo, neste momento, 16 adegas, o que demonstra o quanto esta tradição está enraizada.
Para dar um novo impulso ao negócio de fabrico de vinho de talha do pai, Ruben decide então apostar no engarrafamento, para ir de encontro às gerações mais jovens que gostam de visitar, provar mas também de comprar e levar consigo os vinhos experimentados. E assim nasce a Cella Vinaria Antiqua, ou Adega de Vinho Histórica, que acabou por ser mais do que uma simples adega, produzindo atualmente 18 mil garrafas por ano, para se transformar também num espaço museológico. As vinhas de seis hectares, plantadas desde 2016, estão paredes-meias com as famosas ruínas de São Cucufate, as mais antigas da Península Ibérica, e aqui se encontram uva branca e uva tinta, com 11 variedades diferentes, porque o vinho de talha não se faz apenas de uma casta.
Ruben Honrado compra assim um edifício ao lado do Restaurante País das Uvas. A ideia era renovar o espaço para o abrir e inserir as máquinas de engarrafamento. Mas a história trocou-lhe as voltas e, quando as paredes do imóvel começaram a ser descascadas, o tijolo emergiu, um elemento diferente do que é o habitual na construção alentejana, e depois de uma visita aos registos municipais, verificou-se que se tratava de um edificado dos anos de 1800, talvez mesmo anterior. O cuidado foi redobrado e, à medida que as paredes se iam descascando, surgiram outros elementos curiosos, como os arcos com características romanas, que hoje estão iluminados ou o pavimento original. Tudo apontava para que naquele espaço tivesse, noutros tempos, existido uma adega: o chão inclinado, o poço com água para limpeza, os frigidários (pequenos canais no solo para transportar água e arrefecer o espaço)… Ora estas descobertas fizeram com que Ruben Honrado alterasse os planos iniciais para não perder o património encontrado e assim surgiu o projeto da adega-museu, cuja missão é passar a história do vinho de talha e da sua importância na vida das comunidades locais.
A adega funciona tal como funcionaria há dois mil anos atrás, produzindo um vinho totalmente artesanal, com recurso a pessoas. É isso mesmo que é possível confirmar num pequeno vídeo a que assistimos e que demonstra a autenticidade de todo este processo, sem recurso a tecnologias modernas que acelerem a produção. E recorre-se às gentes da terra, conhecedoras da tradição, para que esta não morra. É verdade que nos tempos que correm é já muito difícil encontrar quem queira trabalhar o vinho desta forma, pois é um trabalho muito físico e duro. Mas na Cella Vinaria Antiqua ainda se mantêm viva esta tradição, e é isso que acaba por encantar os turistas que por aqui passam.
Não faltam planos para o futuro, para que o negócio se possa desenvolver mais e noutras vertentes. Ruben diz-nos que o próximo projeto será um Wine Garden, ou seja, criar um espaço na vinha dedicado às provas de vinho, que hoje se fazem exclusivamente na adega, e tendo as ruínas de São Cucufate como pano de fundo.
Também em desenvolvimento estão dois projetos de alojamento, um deles em Vidigueira, no centro da vila, com oito suites. O segundo, que está nas mãos do irmão de Ruben, prevê mais oito suites mas vocacionadas para o agroturismo.
E fecha-se um círculo onde a tradição e a modernidade conseguiram encontrar uma forma de se juntar e trazer o melhor que o Alentejo tem para dar.
Informações sobre programas de enoturismo: [email protected]
Conheça mais aqui: https://www.honrado.pt