Congresso AHP: Empresários turísticos colocam em causa meta da Estratégia para o Turismo 2027

Manuel Proença, presidente do Grupo Hoti Hotéis, e José Thetónio, CEO do Pestana Hotel Group, concordam que será muito difícil atingir os 27 mil milhões de euros de receitas, em 2027, o cenário mais otimista da Estratégia de Turismo para Portugal, apresentada por este Governo, em 2017. O não avanço da solução do novo aeroporto de Lisboa é o motivo apresentando.

Durante o 32º Congresso Nacional da Hotelaria e Turismo, que decorre em Albufeira, “O turismo tem futuro” serviu como mote para que Manuel Proença, presidente do Grupo Hoti Hotéis, José Thetónio, CEO do Pestana Hotel Group, Jorge Rebelo de Almeida, presidente da Vila Galé, e Luís Araújo, presidente do Turismo de Portugal, abordassem o contexto passado, atual e futuro do turismo nacional.

Para Luís Araújo, presidente do Turismo de Portugal, “o grande sucesso da sobrevivência de Portugal, no setor turístico, é precisamente o facto de estarmos muito alinhados relativamente ao que queremos para o futuro e como queremos lá chegar”. Considera o responsável que “seguimos a estratégia apresentada em 2017, tendo sido este o segundo grande gancho do sucesso de Portugal, que foi ajustado claramente a nível de mercados, de comunicação, segmentação; mas a estratégia define claramente onde nós queremos chegar”. O orador indica que “queremos chegar a 2027 com critérios de sustentabilidade fortíssimos, onde queremos ser um dos destinos mais sustentáveis do mundo, mas queremos chegar com um volume de receitas de mais de 27 mil milhões de euros, de forma consistente”. Relembra, neste contexto, que “triplicámos o volume de receitas em 10 anos. Aumentámos as receitas em 60%, em cinco anos, de 2015 a 2019. Nós contabilizamos receitas. Este é o crescimento que queremos e faz-se em todo o território. Faz-se com a consciência de que conseguimos conquistar mercados cada vez mais longínquos. Tendo muito peso a conectividade aérea.”

Mas Manuel Proença, presidente do Grupo Hoti Hotéis, não encara com otimismo a perspetiva de se atingir tal receita em 2027. Considera o hoteleiro que “a fasquia dos 27 mil milhões de euros para 2027 é exagerada. Porque só há duas maneiras? Ou aumentamos o preço ou trazemos mais turistas”. Para Manuel Proença, “temos alguma margem para aumentar o preço, mas não é assim tão grande”. Por outro lado, o orador considera que “não me agrada muito o turismo de massas, ou seja, intensificarmos de forma exagerada a carga turística nacional”. De qualquer forma, acredita que “também não me parece que isso vá ser conseguido. Vamos crescer seguramente, temos as nossas vantagens competitivas, o que nos dá alguma tranquilidade, mas há que ter algum cuidado na gestão da oferta turística”.

Para Manuel Proença, “mesmo com a TAP (recuperada) se a questão do Aeroporto não se resolve não poderemos considerar que iremos atingir as metas turísticas para o turismo até 2027”. Para isso, “é preciso urgentemente resolver esta questão”, considera.

Analisando o contexto pandémico, o presidente da Hoti Hotéis considera que “tivemos um acidente, agora é preciso curar as ferida, voltar à retoma e encontrar a dinâmica que tínhamos em 2019”. Adianta o empresário que “a clientela interna voltou, voltámos a admitir pessoal, não aquele que gostaríamos de ter contratado”. Este foi um dos temas salientado ao longo de todo o Congresso Nacional da Hotelaria e Turismo, a falta de recursos humanos. De acordo com Manuel Proença, “precisamos de pessoas para trabalhar e não há. Há trabalho para fazer neste sentido. Sem pessoas para trabalhar nós não poderemos evoluir. Estamos com uma grande vontade de crescer, temos dentro do grupo uma série de projetos para avançar, não vamos desistir de nenhum deles, sou de facto daqueles que acredita que o nosso turismo terá sempre um grande futuro. Há que ter alguma paciência, lutar e persistir”.

O empresário também destaca que, no horizonte da evolução do turismo nacional é necessário ter em conta vetores como a digitalização, pois esta trará no futuro “algum automatismo e menor necessidade de determinada mão-de-obra”.

Para Jorge Rebelo de Almeida, presidente do Grupo Vila Galé, o turismo é, foi e será um motor de desenvolvimento do país. “Se outros setores, que tanto criticam o nosso, dessem corda nos sapatos para atingirem o nosso nível, o nosso país estava ótimo. Este nosso setor tem uma característica, que é termos plena consciência de que temos limites. Não pode ser excessivo. Temos muito espaço para crescer ainda, mas de uma forma ordenada, cuidada e sustentável. Mas temos consciência que se crescermos excessivamente perdemos toda a graça como destino turístico, o que acontece em várias circunstância em alguns países da Europa. Por isso, temos de ter essa preocupação”, considera.

Para o hoteleiro, “a pandemia no nosso caso foi violenta, foi pesada. Temos de continuar a fazer coisas, com coragem e determinação, mas com cautela porque a situação sanitária ainda não está resolvida na Europa e no mundo”.

Jorge Rebelo de Almeida também reconhece que “este setor teve um apoio relevante nesta ocasião, a estabilidade que hoje temos deve-se muito a uma intervenção oportuna do Governo, sobretudo a uma disponibilidade para ouvir as empresas e estabelecer um regime de parceria para sobrevivermos a esta crise. Só nos faltava mesmo o aumento da gasolina, dos preços e falta de mão-de-obra, esta crise política em que mais uma vez chegamos à conclusão que temos que ser nós a dar corda nos sapatos para resolvermos os nossos problemas. Temos de continuar a fazer coisas”.

Por seu lado, José Thetónio indica que, no contexto pandémico, o Grupo Pestana adotou uma estratégia de sobrevivência, “que consistiu primeiro em meter as mãos nos bolsos para que saísse o menos dinheiro possível e reservar a liquidez das organizações. Isso foi fundamental para conseguir passar 18 meses de saldos negativos de caixa”. Acrescenta o orador que “felizmente tínhamos produtos positivos e encontrámos um setor financeiro que não estava degradado, que permitiu às empresas, a quem avaliou muito bem o risco, fazer um apoio”. Uma segunda fase implicou “ cuidar dos feridos”. Relembra o hoteleiro que ”nas nossas organizações, que são de capital intensivo, temos muitas pessoas, e estas viveram momentos de incerteza muito grandes. O Grupo Pestana acabava de abrir o 100.º hotel em Nova Iorque, a 16 de março, fechámos o primeiro hotel por não termos clientes. A 31 de março tínhamos todos os hotéis fechados”. Seguiu-se a preparação da retoma. Indica José Theotónio que “pensávamos que viria um pouco mais cedo. No início de junho deste ano começa a recuperação. Tínhamos a empresa preparada para isso, através de grupos de trabalho, que preparavam os novos standards, os novos modos de captar clientes”.

Salienta ainda o orador que “em Portugal houve apoios à manutenção dos postos de trabalho, mas temos alguns hotéis lá fora em que os apoios dados foram muito superiores ao que aconteceu em Portugal. As empresas que têm as suas bases lá fora no pós-pandemia estão muito menos degradadas ao nível de tesouraria do que nós e agora temos de competir com estas”.

Relativamente à meta da Estratégia para o Turismo 2027, que prevê que atinjamos os 27 mil milhões de receitas, o responsável também considera que essa realidade não parece ser atingível. “Para se chegar aos 27 mil milhões de euros de receita em 2027 (e com as estruturas aeroportuárias atuais) os turistas demorarão duas/ três horas para chegar de avião a Lisboa, da Europa, e estarão mais duas/três horas à porta do Aeroporto de Lisboa? E no Algarve o mesmo?”.

Luís Araújo, presidente do Turismo de Portugal, finalizou esta temática indicando que é a favor do novo aeroporto de Lisboa, este “é necessário, é essencial, mas uma coisa não impede a outra. E acho que 27 mil milhões de euros de receitas em 2027 é muito bom, mas deveríamos querer mais se tivéssemos o aeroporto e essa é que deve ser a discussão de todos. Queremos mais”.