Das startups ao novo perfil de consumidor: que transformação?

No setor do turismo, as “startups” têm ajudado a redefinir o perfil convencional de consumidor. Mais ativo, autónomo e exigente com os serviços que adquire, o novo turista procura cada vez mais experiências diferenciadoras, onde estão também implícitas preocupações de cariz social e ambiental.

Numa era marcada pela transformação digital, este novo consumidor carateriza-se pela fácil adaptação às múltiplas plataformas tecnológicas. Neste cenário, destacam-se os chamados early adopters – utilizadores dispostos a utilizar as mais recentes novidades do mundo tecnológico – algumas em processo embrionário. Na perspetiva de André Dias, cofundador da Snapcity, estamos perante um “perfil cada vez mais digital e mais autónomo, capaz de tomar as suas decisões, sem precisar da ajuda de terceiros”.

Mas, nesta reflexão, há também que desmistificar a ideia de gap geracional no uso destas ferramentas, sugere Tiago Araújo, fundador da HiJiffy: “Tipicamente, quando falamos neste tipo de cliente só pensamos nas pessoas mais novas; não pensamos nas pessoas mais velhas que também se adaptam”. Na mesma linha de pensamento, Raquel Fernandes, fundadora da My Portugal For All, corrobora a premissa. Ao dirigirem o seu produto a um público sénior, perceberam que este tem vindo a aumentar a sua literacia digital. “Têm tempo para explorar, poder de compra para adquirir smartphones e computadores, e, portanto, estão despertos para as novas tecnologias”, afirma.

Sustentabilidade e responsabilidade social
Por outro lado, para além do interesse tecnológico, o novo turista revela novas motivações no momento de planear viagens ou de escolher experiências. Das novas tendências destacam-se as preocupações com a sustentabilidade e o meio ambiente. “Sentimos no nosso dia a dia que as pessoas se preocupam cada vez mais com as questões ambientais e sociais”, refere Hugo Teixeira Francisco, diretor comercial da Green Stay.

Da mesma opinião, Rita Marques, cofundadora da Impactrip, realça que essa preocupação deve ser mais explorada pelas empresas na área do turismo. No caso da Portugal 4all Senses está implícita uma componente de responsabilidade social, que, desta forma, vai ao encontro do turista que mesmo possuindo algum tipo de “incapacidade tem vontade de viajar”, explica Daniela Duarte, uma das fundadoras da startup.

Num contexto de responsabilidade social, Rita Duarte, outra das fundadoras da Portugal 4all Senses, considera ainda que os governos de cada país devem ter especial atenção com o público portador de algum tipo de incapacidade motora. A seu ver, é importante que existam mais apoios e incentivos do Estado para que estas pessoas possam ganhar alguma autonomia. “Quanto mais cedo um país despertar para a importância da integração de indivíduos com deficiências na sociedade, mais depressa se encontram pessoas que procuram oportunidades de lazer e de viagens”, sublinha.

“Turista – camaleão”
A oferta turística depara-se, hoje, com um perfil de cliente cada vez mais abrangente e difícil de categorizar. Esta realidade tem feito com que o setor do turismo se segmente, abrindo novas oportunidades de negócio.

Do turista que procura a genuinidade nos produtos locais àquele que quer estar em contacto com a natureza, através de atividades ao ar livre. Nesta nova realidade não há restrições de idade, mas há escolhas cada vez mais exigentes. Veja-se o caso da City Guru, em que os clientes procuram visitar “locais alternativos”, para fugirem “dos tours massificados”, frisou João Moedas, CEO da startup.

Para Catherine de Freitas, diretora de comunicação e relações públicas da Upstream, encontramos hoje um conceito que designa de “turista-camaleão”. Isto é, alguém que “assume perfis distintos em função do momento, da motivação ou da atividade que a impele a viajar”. A título de exemplo, Estevão Anacleto, CEO e fundador da Campónio, fala-nos de um “viajante de experiências” que não quer apenas visitar locais e monumentos de referência. Pelo contrário, os clientes habituais desta startup querem “vivenciar e viver como locais”.

Um novo paradigma emergente
Apesar de muitas startups desenvolverem produtos que se destinam diretamente ao público final, existe também a perspetiva B2B (business to business) onde muitas empresas mais tradicionais, recorrem aos serviços disponibilizados por estes jovens empreendedores, como é o caso da TravelStore; Vila Galé, Pestana ou Consolidador.com, entre muitas outras.

Miguel Quintas, CEO do Consolidador. com e fundador da Parcela Já defende que as startups tem ajudado a compreender o novo perfil do turista, através de um processo de “mapeamento” tendo por base “padrões de compra” e “identificação dos seus interesses”.

Ao trazerem soluções inovadoras para o mercado, as startups ajudam a dinamizar o setor, ao mesmo tempo que obrigam os players convencionais a estar na senda dos novos tempos. Frédéric Frére, presidente da Travelstore, destaca por isso o papel inovador das startups. “Para ter qualquer hipótese de sucesso, uma startup é obrigada a colocar o cliente no centro de tudo”, constata. De um modo geral, “o que elas fazem é simplificar a vida do turista e melhorar a sua experiência de viagem ou evento”, sustenta.

Seja do lado do consumidor, como do lado das empresas, a adaptação das pessoas à nova realidade é obrigatória, defende Tiago Araújo, fundador da HiJiffy. “Sou radical. Acho que quem não se adaptar vai ter problemas graves, porque vamos começar a pedir respostas mais rápidas”, pontifica.

Num tempo de efemeridade e do instantâneo, as startups vieram por um lado responder aos novos desafios, com soluções marcadamente inovadoras. Do lado do consumidor, se é certo que este se molda cada vez mais às novas tecnologias, por outro cresce agora um padrão de procura de experiências, onde questões ambientais ou sociais não estão esquecidas. Mais uma vez, as startups podem ser uma boa janela para o enquadramento deste público cada vez mais autónomo e capacitado.

Esta é a última parte da Reportagem “Quando a inovação se alia à autenticidade portuguesa!” publicada na Edição 308 da Ambitur.