Flores by Ambitur: Descobrir a natureza numa “ilha de água”
No centro do Atlântico, há um paraíso, onde a natureza se encontra no seu estado mais puro. Intocável. Um manto verde sem fim entrecortado pelo barulho das cascatas ou das ondas a bater nos rochedos. E, lá pelo meio, os animais que andam livremente pelas estradas feitas pela mão humana.
É descobrir lagoas e ribeiras. É ouvir as vozes de um passado sempre presente nos saberes milenares das gentes que se refletem na gastronomia ou no cuidado com a natureza.
É ir, ver e sentir.
Escrever sobre os três dias que passamos na ilha das Flores é uma tarefa complicada. Pode ser mesmo algo redutor, até porque esta é uma ilha com uma aura quase mágica. Mas aceitamos o desafio: a Ambitur foi à descoberta deste tesouro natural e viemos com muitas histórias (e estórias!) para contar.
Descobrir horizontes. Esse foi o nosso espírito quando partimos do Aeroporto de Lisboa em direção a um tesouro escondido a bordo de um avião da SATA Air Lines.
O destino era a ilha das Flores, no Grupo Ocidental do arquipélago dos Açores, com perto de 4 mil habitantes no centro do Atlântico, a meio caminho entre a costa portuguesa e a norte-americana.
Desde o primeiro momento que ouvimos que se tratava de um paraíso por explorar. Foi bem mais do que isso.
O programa esteve a cargo da Experience OC, uma empresa local de animação turística que, através do guia turístico Francisco Pimentel, nos mostrou alguns dos segredos mais bem guardados, desde a visita às Sete Lagoas ou ao Morro Alto (com os seus mais de 900 metros de altitude) a conhecer os Miradouros e Ribeiras que fazem das Flores uma ilha tão autêntica e natural.
“Senti que havia uma necessidade no mercado”, começa por afirmar Armando Rodrigues, CEO da Experience OC. Nascido e criado na ilha, o empresário olhou para o mercado florense como uma oportunidade de mostrar as potencialidades daquele paraíso, até porque “o que havia era muito disperso”. O primeiro passo foi o de agrupar e de disponibilizar a informação de uma forma simples e rápida: “O objetivo foi ter um site em que fosse possível reservar todas as atividades a realizar, o alojamento, o carro de aluguer, etc.”. Hoje, a empresa faz a gestão completa das viagens daqueles que procuram a ilha das Flores e a vizinha ilha do Corvo: “Damos todas as atividades possíveis de serem feitas em ambas as ilhas”, explica, acrescentando que a Experience OC tem “guias próprios e certificados que saem com as pessoas para fazer os tours e trilhos”.
“A ilha da água”
E o que é que é possível encontrar na ilha? Dizer que se deve ir e ver com os próprios olhos seria um “lugar comum”, mas neste caso é algo que se aplica. Sempre que olhamos para algum sítio, encontramos uma coisa diferente com uma beleza natural que não foi afetada pelo Homem: “É impressionante numa ilha tão pequena ter lugares tão bonitos”, diz orgulhoso Armando Rodrigues.
É uma magia que se sente, até porque nos sentimos transportados para um lugar à parte. O som da água é uma constante: faz parte da paisagem sonora e visual do nosso percurso de descoberta pela ilha. O CEO da Experience OC diz mesmo que esta é “a ilha da água”. E há boas razões para considerar isso. Funda, Branca, Seca, Comprida, Rasa, Lomba e Negra. Cruzámo-nos com as Sete Lagoas e com o Poço da Ribeira do Ferreiro. Vimos a Cascata do Poço do Bacalhau e fizemos canyoning na Ribeira do Cascalho com a Ocidental Adventures.
“É a natureza no estado mais puro”, destaca Armando Rodrigues.
Estórias da(s) gente(s)
Por entre montes e vales, os habitantes habituam-se àquela ilha, criando estórias, memórias e saberes com anos.
Somos levados a Lajedo, uma freguesia de Lajes das Flores com pouco mais de 100 habitantes, para conhecer quem vive naquele lugar mágico e quem cria história com as suas próprias mãos.
José Agostinho é um lajedense que constrói instrumentos musicais. “Não aprendi com ninguém: fui sempre aperfeiçoando”, diz orgulhoso. Aos 12 anos, fez o seu primeiro instrumento: uma viola elétrica. “Não a vejo há 40 anos”. Quando fez o serviço militar “na Escola Militar em Paço de Arcos”, os colegas ofereceram-lhe um violão. “Mas era um violão com alguma qualidade”, lembra. No entanto, o estudo para construir instrumentos começou quando, em Lisboa, compra um violão de uma “marca conceituada: queria perceber as diferenças entre um e outro”. No início da década de 2000, recomeçou a fazer instrumentos, por entre as várias profissões que teve. “Quando vim para as Flores, dediquei-me a tempo inteiro”, algo que se mantém até hoje, demorando cerca de um mês a produzir um instrumento.
Das mãos, também sai sabor. Neste caso, sabor do queijo artesanal. Somos encaminhados para a freguesia da Fajãzinha, em Lajes das Flores, onde Francisco Henriques nos abre a porta da Queijaria “Pico Redondo”, que dirige com a esposa Ilda Henriques. Com procura que extravasa as fronteiras da ilha, o queijo curado que produzem “tem muita procura: exportamos para restaurantes, mercearias e para a ilha de São Miguel”, afirma. O proprietário acrescentou que o queijo chegou a ser vendido no continente, na zona de Lisboa. Mas a pandemia trocou as voltas: “Deixamos de exportar”. Atualmente, a produção é mais “reduzida”, devido ao período de inverno em que se regista um consumo menor, ao contrário do verão, onde a queijaria aumenta a produção.
Uma aldeia que honra o passado olhando o futuro
Da história da ilha, faz ainda parte a Aldeia da Cuada, em Fajã Grande. Nos anos 60 do século XX, o “sonho americano” emergiu e a população emigrou, deixando o local ao completo abandono. Aos poucos, a aldeia foi sendo reconstruída pelas mãos de Teotónia e Carlos Silva: não queriam que a ligação com o passado se perdesse e, por isso mantiveram as casas em pedra e traça de construção original. Hoje, a Cuada continua a ser gerida de forma familiar: a filha Carlota Silva e o seu marido Sílvio Gonçalves mantém as 21 casas da aldeia, sendo que a última estará operacional já em 2023.
“A ideia de reconstruir surgiu há 35 anos, mas sem grandes planos”, recorda Carlota Silva, destacando que o objetivo inicial era, apenas, comprar uma casa para “passar os fins de semana”, até porque, na altura, “nem se falava em turismo”. Após terem alojado um casal alemão que procurava casa na Ilha das Flores, os pais de Carlota foram desafiados para apostar num negócio turístico que passava por reconstruir a Cuada: “Esse casal, que iria ficar uns dias, acabou por ficar 13 meses”, lembra, destacando que esse foi o impulso que Teotónia e Carlos precisavam. “Os meus pais decidiram ir para a reforma e dedicarem-se a 100% ao projeto”. Mas os apoios eram inexistentes, sendo necessário recorreram à banca: “A partir daí, começaram a comprar casas anualmente. Trabalhavam no verão para se dedicaram à compra no inverno”, lembra. O processo só foi concluído este ano, 35 anos depois, com a aquisição da última casa. “Temos um total de 21 casas”, reforça.
A procura, essa, é sempre muito alta, sendo que o principal mercado emissor é o alemão. No entanto, o objetivo não é replicar uma aldeia ou continuar a aumentar o número de casas disponíveis: “Iríamos ter sempre a mesma procura”, considera. A opção é trazer a maior comodidade possível ao empreendimento, respondendo às exigências atuais do mercado: “Estamos a iniciar um projeto que passa por transformar uma ruína num spa com piscina”, exemplifica.
A ilha das Flores não é apenas uma das nove ilhas dos Açores: é uma ilha em que a natureza e a vida humana vivem em harmonia. Disseram-nos que era um paraíso por explorar. E, de facto, não fomos ao engano.
A não perder na Ilha das Flores:
- Zona Sul e Oeste:
- Poço da Ribeira do Ferreiro
- Poço do Bacalhau
- Miradouro do Portal
- Rocha dos Bordões
- Filão dos Frades
- Aldeia da Cuada
- Fajã Grande
- Miradouro Craveiro Lopes
- Zona Norte e Este:
- Baia da Alagoa
- Miradouro de Ponta Delgada
- Farol do Albarnaz
- Museu da Fábrica da Baleia (Santa Cruz)
- Miradouro do Ilhéu Furado
- Miradouro do Pico da Casinha
As nossas sugestões gastronómicas:
- O Moreão, localizado em Santa Cruz das Flores, distingue-se pela qualidade do peixe fresco.
- O Fora D’Horas, também localizado em Santa Cruz das Flores, é o local ideal para um almoço ao sabor dos produtos mais típicos da região, sendo a carne o grande prato de eleição.
- O Chill, localizado na Fajã Grande, oferece uma diversidade de pratos regionais e tradicionais da Ilha. Desde as lapas, a tábua de queijos e a charcutaria, até à vitela ou ao entrecosto, são muitas as escolhas para quem opta por produtos típicos.
Por Cristiana Macedo e Fotos de Raquel Wise, na Ilha das Flores, nos Açores.