Adolfo Mesquita Nunes, advogado e ex-secretário de Estado do Turismo, esteve esta semana no painel “Caminhos para o Futuro do Turismo Interno”, em conjunto com Ana Jacinto, secretária geral da AHRESP, e Pedro Costa Ferreira, presidente da APAVT, no 9º Fórum de Turismo Interno – Vê Portugal. O orador não tem dúvidas de que “é possível trabalhar muito mais para estruturar o produto e experiências, e pôr o turismo a crescer”, acreditando que “o Governo está com a cabeça no sítio certo para fazer as mudanças estruturais de que precisa e impulsionar o turismo interno”.
“perante o responsável máximo pelo crescimento da nossa economia, sem o qual nós não estaríamos a crescer, há muita coisa errada na forma como o setor do turismo se posiciona do ponto de vista político, quase sempre à defesa, quando devia ser num sentido afirmativo”.
Recordando os indicadores recentes de crescimento da economia portuguesa, divulgados pela Comissão Europeia – que subiram de 1% para 2,4% – o ex-governante fez questão de lembrar que há um responsável por esta revisão: o turismo. Mas recordou que “não há setor mais vilipendiado do ponto de vista político e mediático do que o turismo”. Embora seja, segundo o orador, o setor que mais emprego gera, que foi a solução para muitas pessoas que ficaram sem emprego e oportunidades há 10 anos, e que gerou uma reconciliação com os territórios permitindo que estes se desenvolvessem e encontrassem novas vocações e valências, dando espaço à criatividade e ao empreendedorismo, a verdade é que “perante o responsável máximo pelo crescimento da nossa economia, sem o qual nós não estaríamos a crescer, há muita coisa errada na forma como o setor do turismo se posiciona do ponto de vista político, quase sempre à defesa, quando devia ser num sentido afirmativo”. Para Adolfo Mesquita Nunes, é um erro apontar-se o dedo ao turismo e dizer-se, politicamente, que temos uma monocultura do turismo. “Nós não temos uma monocultura do turismo; as outras atividades económicas é que não estão tão fortes”, critica. E vai mais longe, defendendo que “se tivessem sido seguidas políticas, como foram para o turismo, nas outras atividades económicas, provavelmente também elas estariam a crescer tanto”. No fundo, o orador acredita que o grande problema é “não olhar para o turismo como aquilo que ele é: o motor da economia nacional”.
“Não é possível trazer pessoas para o setor do turismo quando dizemos a todos que este não é um setor para se vir trabalhar, ou que não é um setor importante da nossa economia; e esta mensagem política passa”.
Focando-se na questão dos recursos humanos, Adolfo Mesquita Nunes é perentório: “Não é possível trazer pessoas para o setor do turismo quando dizemos a todos que este não é um setor para se vir trabalhar, ou que não é um setor importante da nossa economia; e esta mensagem política passa”. Portanto, a solução deverá passar por “requalificar o setor do turismo do ponto de vista do discurso e das políticas”.
Por outro lado, a questão salarial é importante mas a verdade, diz o orador, “num aumento de salário o Estado fica com metade”. O que significa que um empresário que queira aumentar, premiando alguém, o ganho desse trabalhador é “incomparavelmente menor do que o dispêndio desse empresário”. E por isso critica: “Como pode depois o Estado vir criticar que os salários não estão a crescer o que deviam?” Adolfo Mesquita Nunes defende pois a alteração da política fiscal e de contribuições, sob pena de não permitirmos que os empresários que podem e querem aumentar os seus trabalhadores o façam porque a proporção não justifica.
“Não é uma questão de coragem, mas as decisões são analisadas, vilipendiadas no imediato, e portanto não decidir ganha tempo, conforto e cumplicidade, e decidir é quase sempre um gesto mais arriscado”.
A falta de decisão no que diz respeito ao novo aeroporto de Lisboa ou à questão de ferrovia foi outro dos temas em cima da mesa neste debate. E o advogado começa por lembrar que “a política é a vertigem da decisão e quem não gosta de decidir devir ir para outra função”. Mas admite que hoje é cada vez mais difícil decidir. “Não é uma questão de coragem, mas as decisões são analisadas, vilipendiadas no imediato, e portanto não decidir ganha tempo, conforto e cumplicidade, e decidir é quase sempre um gesto mais arriscado”. Mas não hesita em afirmar: “É preferível decidir mal, porque a decisão pode ser revertida, do que não decidir, pois o tempo perdido já não se reverte”. O facto de haver um impasse a respeito destes dois exemplos de mobilidade e transportes, tão importantes para a estruturação de produto e experiências turísticas, significa, segundo o orador, que se está a falhar. “O mais difícil é termos o território, e isso temos”. Mas hoje é difícil “estruturá-lo de maneira a que se transforme em algo que pode ser fruído”, pois é necessário convocar muitos players diferentes. Agora, Adolfo Mesquita Nunes acredita que “se o território não tiver vida própria, então mais difícil se torna estruturar um produto turístico”. Defende que “é preciso dar espaço ao setor privado, para que crie, inove e possa contribuir”, acreditando que “era preferível que a atuação autárquica se centrasse em ser pivô da estruturação do produto e não na promoção, uma matéria que deve ficar nas regiões e no Turismo de Portugal mas que, muitas vezes, é muito mais sexy promover do que perder tempo a estruturar algo”.
Questionado sobre os montantes que vão chegar a Portugal, no âmbito do PRR, o ex-secretário de Estado do Turismo diz que “é preciso gastar bem” e que “essa monitorização não está a ser feita”. Por um lado, explica, o grosso está a ser dirigido para o setor público, admitindo que há uma parte pública que necessita de dinheiro, pois é preciso requalificar a administração pública, dotá-la de meios, inteligência e tecnologia. “Mas o setor do turismo é privado e só crescer apesar do Estado” por isso, aponta, “é preciso que o dinheiro chegue rapidamente às empresas que apresentem projetos inovadores, capacitadores e de qualificação”.
Por Inês Gromicho