#FuturoTAP: “Salvar a TAP é um desígnio nacional”

Ambitur.pt está a ouvir os Conselheiros Ambitur acerca do futuro da TAP, procurando perceber se ou Governo deve ou não intervir na situação da transportadora aérea, até onde pode ou deve ir essa intervenção e qual será o timing mais indicado para o fazer.

Manuel Proença, presidente do Grupo Hoti Hotéis, partilha connosco a sua perspetiva.

“A TAP é uma empresa inserida num conjunto de empresas nacionais com grande importância estratégica para Portugal. Uma parte do nosso país é insular, temos uma grande colónia de emigrantes espalhados pela Europa, África e Américas, tudo destinos servidos pela TAP. No momento em que teve inicio a tragédia humana do Covid-19, a TAP tinha atingido um recorde absoluto de passageiros transportados, ultrapassando a barreira dos 17 milhões. Em 10 anos, a companhia aérea quase duplicou o seu movimento. Embora o movimento crescente das “low cost carriers” nos últimos anos seja indubitavelmente marcante, o movimento global de passageiros nos nossos aeroportos, conta com uma importante fatia assegurada pela transportadora aérea nacional, com forte impacto no nosso turismo.

Era já claro que, embora sempre atingindo novos recordes, o ritmo de crescimento dos fluxos turísticos europeus vinha decrescendo, com causas identificadas, e delas resultando a falência de mais de 30 companhias aéreas europeias nos últimos anos.

Neste cenário, a TAP procurou novos mercados, que lhe permitiram estar menos dependente dos seus fluxos de tráfego natural, posicionando nova capacidade de oferta na América do Norte e no Brasil, com a abertura de novas rotas e ainda aumentando o número de voos para outras rotas, onde já operava com sucesso. A decisão veio indubitavelmente dinamizar o turismo em Portugal, com novo tráfego, de novas origens, muito importante também para atenuar a nossa sazonalidade.

Esta estratégia de crescimento, teve por detrás um aumento considerável do número de aviões e a renovação de toda a frota, já antiquada, o que implicou um investimento da companhia área superior a 400 milhões de euros e consequente endividamento. Foi neste cenário de forte crescimento que a TAP, de repente, viu tudo ruir e se vê agora a enfrentar a maior crise financeira de sempre.

Mas esta situação inédita com a qual a TAP, o país e o mundo se defrontam, não eram previsíveis. À beira de uma recessão global difícil de evitar, toda a aviação travou a fundo, colocando em terra quase todas as frotas – e neste momento, só sobrevive com menos danos, quem assumiu riscos controlados, ou quem está protegido por acionistas com grande capital disponível para assumir riscos acrescidos. Não é o caso da TAP.

Em Portugal, no contexto da economia nacional, a TAP pode ser um caso “too big to fail”, mas essa terá que ser também a visão de quem olha a partir de Bruxelas. Em face de um longo historial de políticas bem preparadas pelo governo português para apoiar o crescimento do turismo, será necessário e faz sentido intervir na TAP, a questão que se levanta é como fazê-lo. Para um cenário de recuperação rápida da cadeia de valor do turismo nacional, a TAP é central, é estratégica – mas só se tiver o centro de decisão em Portugal – ou, pelo menos, garantindo que os seus acionistas, sejam obrigados a enfocar-se nesse desígnio.

Ora, os investidores privados certamente não vão ter disponibilidade para apoiar a TAP nos montantes de capital que vai precisar. A dimensão do problema, exigirá certamente um reforço dos capitais próprios, moratórias de “leasings”, e financiamentos com garantia do Estado. Qualquer que seja a decisão que venha a ser tomada pelo Governo, quanto ao capital necessário – privado, publico, ou misto – a decisão terá sempre um caracter de urgência. E, independentemente do modelo de gestão que for adoptado – o actual tem cumprido – será vital para a capacidade da companhia aérea retomar as operações, em condições mínimas de viabilidade, que garantam a estabilidade do serviço prestado.

Por isso, defendemos que o Estado deve “assegurar a preservação do valor da nossa transportadora aérea nacional e salvaguardar a sua posição estratégica” como, aliás, declarou recentemente o Governo, através do nosso ministro da Economia. Idêntica é a atuação noutros países, como acaba de ser anunciado pela Lufthansa e Air France/KLM. Por outro lado, acreditamos que a União Europeia não deixará de considerar ajudas e apoios financeiros, para viabilizar as suas companhias aéreas.

Tal como os aeroportos nacionais, a TAP é, em todo este período, central para garantir os mínimos num momento de forte retração do transporte aéreo, pese embora seja evidente que falamos de serviço público e que este não tem que ser suportado inteiramente pela TAP, sem apoios financeiros a mínimos de mobilidade por parte do Estado.

Assim que, as medidas de contenção forem sendo aliviadas, no atual período de “quarentena” do transporte aéreo, a TAP será estratégica no esforço de reconstrução da cadeia de valor do turismo nacional – também profundamente atingido – e, nessa altura, terá que dispor dos recursos necessários e de medidas concretas de apoio que a apoiem, para voltar a reconstruir a sua base, desde logo, começando pelos tradicionais grandes emissores do nosso turismo e da nossa emigração. Nesse momento, o Governo terá que tomar uma decisão, com a maior urgência, esperando que o “timing” não seja tarde demais, nem a solução seja a mais radical – a insolvência – antes pela via da compensação à companhia aérea nacional, por manter rotas de base de viabilidade evidente, e as necessárias à coesão nacional – como a Madeira e os Açores – e, assim, permitir que o mercado entretanto se reconstrua aos poucos, e com ele a reconstrução da nossa companhia aérea. Salvar a TAP é um desígnio nacional”.