José Santos, o presidente da Entidade Regional do Turismo do Alentejo, desde 19 de Julho de 2023, nasceu e cresceu no Algarve, mas a universidade de Évora levou-o à região que o fez abraçar grande parte da vida profissionalmente, mas também pessoalmente. Hoje cabe-lhe dirigir o organismo que pauta e ritma as pulsações do coração do turismo da região mas, acima de tudo, do organismo que tem a primeira responsabilidade de tornar real o seu verdadeiro potencial. Publicamos, nesta primeira parte da entrevista, uma visão mais pessoal de quem é o timoneiro do Turismo do Alentejo, que não esconde que esta “é uma região que é preciso conhecer, é preciso conhecer devagar. É uma região dura, uma região difícil. Nós conhecemos, às vezes, a parte mais glamorosa do turismo, a parte mais visível do turismo”. Ao nível de ação, José Santos destaca que “a minha formação é uma formação técnica, e isso permite-me resolver, às vezes, problemas de uma forma muito rápida, muito direta, isso agiliza muito as decisões e as conversas que eu tenho com o nosso corpo técnico”. Esta é a nova dinâmica do Turismo do Alentejo, retratada aqui na primeira pessoa, neste em que a região é o destino do mês na Ambitur.pt.
Onde nasceu, onde passou a infância e como correu o seu percurso escolar/académico?
Bem, eu não sou alentejano, nasci no Algarve, em Olhão, e a minha infância e adolescência foram passadas no Algarve, o que, obviamente, me marcou muito. No Algarve, ganhamos uma sensibilidade para o turismo desde muito novos, porque temos sempre alguém na família ou que trabalha numa agência de viagens ou numa receção de hotel, ou é assistente de direção ou é diretor de hotel, ou tem uma atividade ligada ao turismo balnear no verão, e, portanto, muito precocemente ouvi falar inglês, muito precocemente fui ao aeroporto de Faro ver os aviões aterrar, era, aliás, o grande passatempo da família, dos meus primos, da minha irmã e dos meus pais, ir ao sábado ao aeroporto, quando tinha seis, sete, oito, nove anos. Depois acabei por me licenciar em Sociologia em Évora.
Estive no Algarve até aos meus 18 anos. Tive uma banda rock, uma adolescência muito animada e muito dinâmica no Algarve, até que um dia, chegou a hora de estudar e vim para a Évora.
Curiosamente vim para a Évora estudar e acabei por fazer a minha tese de licenciatura na área do planeamento regional do turismo, porque eram, de facto, duas áreas que eu gostava muito, planeamento regional e turismo. Depois, a primeira experiência profissional acabou por ser na área social, curiosamente, numa área em que o meu pai sempre trabalhou, na Segurança Social. Coordenei um projeto no Algarve, durante quase um ano, em 1996.
Curiosamente vim para a Évora estudar e acabei por fazer a minha tese de licenciatura na área do planeamento regional do turismo, porque eram, de facto, duas áreas que eu gostava muito, planeamento regional e turismo.
Como entrou a política na sua vida?
Curiosamente, a política entrou muito cedo, porque eu sempre gostei muito de política. Recordo que tinha 10, 11 anos, e via os debates políticos, moderados pela Margarida Marante, que era uma referência, para mim, em muito tenra idade, e ganhei uma consciência política muito cedo. Lembro-me que, com o meu melhor amigo, nós tínhamos, por hábito, ir ouvir todos os comícios de todos os partidos. Isso com 10, 11, 12 anos, pois tínhamos sempre um professor que era cabeça de lista. Na altura as pessoas eram mais da área da APU, do PS ou do PSD.
Desde muito cedo, ganhei uma simpatia muito forte, uma grande referência na minha infância, mais do que na adolescência, que foi o Francisco Sá Carneiro, e recordo-me perfeitamente, é dos dias mais marcantes da minha infância, o meu pai, para razões institucionais estava a chegar de Lisboa, e eu estava no cimo das escadas, na nossa casa, no primeiro andar, a chorar, porque tinha acabado de ouvir a notícia na televisão de que o Francisco Sá Carneiro tinha falecido, eu tinha 10, 11 anos.
São memórias. A política entrou na minha vida de uma forma muito natural. Não que na minha casa se falasse muito de política, porque não se falava, mas eu ganhei, de facto, muita sensibilidade às questões políticas, eu acho que em parte pela Margarida Marante, e pelo Sá Carneiro, ou seja, pelo jornalismo e pela política em si, e só me tornei militante de um partido político muito, muito tarde, quando eu percebi que esse partido político, do qual eu sou militante, militante bastante discreto, diga-se, percebi que esse partido político ia passar muito tempo na oposição, e, portanto, entrei no partido nessa altura, e tive, curiosamente, numa altura muito difícil do partido, o PSD, numa altura em que o partido viveu uma situação muito, muito difícil, foi nessa altura que a minha militância foi mais ativa, organizei uma academia de formação para o poder local, várias iniciativas e várias sessões muito ligadas ao turismo, à reforma do Estado, trouxe gente muito interessante a Évora. Hoje não tenho atividade política, em razão das funções que exerço, mas continuo a ouvir e a gostar bastante da política.
A política entrou na minha vida de uma forma muito natural. Não que na minha casa se falasse muito de política, porque não se falava, mas eu ganhei, de facto, muita sensibilidade às questões políticas,
Como o seu percurso profissional se cose com a atividade turística?
Sou quadro superior do Ministério da Economia desde 1996, trabalho há quase 30 anos no turismo, sempre no turismo e sempre no Estado. Vim na altura para as antigas regiões de turismo, para a antiga região de turismo de Évora, à qual eu concorri, e, felizmente, fiquei, na altura, nesse concurso público em primeiro lugar. Foi uma surpresa para mim.
Recordo-me que na análise curricular houve candidatos que tiveram muito melhor nota do que eu, porque havia excelentes candidatos da área, nomeadamente os primeiros licenciados do curso de Gestão e Planeamento de Turismo de Aveiro, que é um excelente curso. Eu, na entrevista, acabei por compensar e acabei por ficar em primeiro, porque conhecia bem o Alentejo, tinha estudado cá, e, portanto, na entrevista consegui sair-me bem e fiquei, até hoje, são 30 anos.
O que o Alentejo tem que o fez dedicar a sua carreira ao turismo desta região?
O Alentejo, não sendo a região onde eu nasci, é, de facto, uma região que nos preenche muito.
É uma região que é preciso conhecer, é preciso conhecer devagar. É uma região dura, uma região difícil. Nós conhecemos, às vezes, a parte mais glamorosa do turismo, a parte mais visível do turismo.
A minha mãe, quando eu larguei a Segurança Social e os estudos sobre a pobreza e vim para o turismo, disse, e continua a dizer, que eu deixei de trabalhar com os pobres para ir trabalhar com os ricos. É uma simplificação. Mas eu conheci o Alentejo, curiosamente, primeiro pelas pessoas, pelos territórios, pelas dificuldades das pessoas.
Aprendi a conhecer a gastronomia do Alentejo como uma gastronomia de resistência, uma gastronomia que se fez da dificuldade, da dificuldade fez-se uma gastronomia maravilhosa. E é uma região que nós aprendemos a conhecer. Eu creio que ainda não conheço tão bem o Alentejo quanto desejaria hoje e viajo muito pelo Alentejo, conheço muitos lugares do Alentejo, mas é uma região que nos preenche.
Eu digo que nestes 30 anos não houve um único dia em que eu tenha dito para mim próprio que não gostei de estar no Alentejo. Seja em Évora, seja em Portalegre, seja em Beja, seja no seu litoral, é uma região que nos preenche imenso e que, do ponto de vista turístico, não tenho dúvidas em dizer que seja uma região, enfim, obviamente que tem uma preponderância pequena face ao que é o todo nacional e que não chegará a 6% do stock de camas turísticas do país, mas é claramente a região com o maior potencial turístico de Portugal. E acho que é aquela região que sintetiza muito bem o que é e o que pode ser ainda o Portugal como um grande destino turístico.
Eu digo que nestes 30 anos não houve um único dia em que eu tenha dito para mim próprio que não gostei de estar no Alentejo. Seja em Évora, seja em Portalegre, seja em Beja, seja no seu litoral, é uma região que nos preenche imenso e que, do ponto de vista turístico,
Como é um dia na vida do Presidente do Turismo do Alentejo, desde o pequeno-almoço até à hora de se desligar o telemóvel?
São sempre dias muito compridos, eu normalmente durmo muito pouco, durmo quatro horas por noite, em média, normalmente tento sempre, em cada semana, ter um dia de escritório, gosto de estar no escritório, gosto de planear as atividades com as nossas equipas técnicas, preciso de pensar. A minha formação é uma formação técnica, e isso permite-me resolver, às vezes, problemas de uma forma muito rápida, muito direta, isso agiliza muito as decisões e as conversas que eu tenho com o nosso corpo técnico, porque são pessoas que eu conheço há 20 anos, em alguns casos muitos deles, e, portanto, conseguimos decidir muito rapidamente, gosto de fazer briefings com as equipas, às vezes tenho pena de não estar mais tempo com as nossas equipas.
Claro que quando ando na estrada falo muito com as pessoas, há dias em que eu falo com 20 e tal colaboradores e não estou a exagerar. Mas o meu dia normal é fora do escritório, por vezes já estou na rua muito cedo, o carro é um local de trabalho, onde fazemos pagamentos, assinamos requisições, assinamos contratos, fazemos muitos telefonemas, lemos documentos, preparamos intervenções, verificamos textos, contratos, e nos dias mais preenchidos, onde esse trabalho não se consegue fazer, em regra, depois, quando chego de casa, seja às 21H00 ou às 22H00, os meus dias de trabalho têm sempre 12, 14 horas de trabalho, às vezes a noite é uma noite que me leva até muito tarde a trabalhar, e fundamentalmente responder aos e-mails, que é esse fardo (risos) que nós temos, às vezes posso ter que responder numa noite, agora também com as funções que exerço na Agência Regional de Promoção Turística, às vezes tenho cinco a seis dezenas de e-mails a tentar responder sempre de uma forma assertiva, cuidadosa. Cada resposta sei que tem uma consequência, seja num destinatário externo ou num cliente externo ou num funcionário, que eu tenho que dar uma orientação, e portanto são sempre dias muito preenchidos, que nos confortam muito. Este trabalho tem um lado que nos preenche muito, porque temos sempre a noção que estamos a trabalhar para desenvolver o território, para ajudar as pessoas, para ajudar os empresários, para trazer mais riqueza, mais negócio para a nossa região. Às vezes os dias são muito duros, sempre também, infelizmente, prejudicando a família, porque é inevitável. Tentar compensar depois esse lado nem sempre é fácil, existe também uma grande compreensão que tenho, nomeadamente da minha mulher, com uma filha pequena, o que também não ajuda, mas pronto, é uma função, eu sabia ao que vinha, não é nada novo para mim, e tentamos sempre estar à altura da responsabilidade e desempenhar da melhor forma a nossa função.
Este trabalho tem um lado que nos preenche muito, porque temos sempre a noção que estamos a trabalhar para desenvolver o território, para ajudar as pessoas, para ajudar os empresários, para trazer mais riqueza, mais negócio para a nossa região.
Qual foi o momento mais desafiante que viveu neste cargo?
Cada manhã é um desafio, porque a quantidade de temas que nós temos para resolver corresponde a uma atividade muito variada dentro da Entidade Regional de Turismo. Neste momento estamos a fechar com o PRR o financiamento para montar o centro de atendimento ao turista em Évora, para a Capital Europeia da Cultura de 2027, assim como estamos a coordenar um grande programa de valorização do produto do enoturismo, e estivemos na sexta-feira a comemorar a Cidade Europeia do Vinho do Baixo Alentejo, ou estamos a preparar as nossas campanhas promocionais para o mercado nacional e Espanha ou tivemos um grande desafio este ano que é termos sido, mais de 10 anos depois, Destino Nacional Convidado da BTL e agora também com o desafio da promoção internacional.
O dia mais desafiante foi o dia em que tomei posse, 19 de julho de 2023, em que senti que estava de facto a iniciar uma nova fase desta minha longa ligação ao turismo do Alentejo. Percebi claramente que, independentemente de todo o esforço, empenho e dedicação que nos últimos anos eu tinha dado, esta atividade estava a passar para um patamar de ainda maior esforço, de ainda maior empenho e de ainda maiores responsabilidades.
Por Pedro Chenrim