Da responsabilidade dos empresários e seus investimentos na atração de mão-de-obra e de população para a região, de uma postura de promoção mais proativa ao nível dos mercados internacionais, este terceiro bloco de entrevista com José Santos, presidente da Entidade Regional do Turismo do Alentejo, aborda ainda a necessidade da melhoria e otimização do aeroporto de Lisboa nos próximos anos, pois “nós sabemos que hoje estamos a perder todos os dias passageiros que não conseguem aterrar e muitos destes passageiros viriam para o Alentejo”.
José Santos recebeu a ambitur.pt na sede da Entidade em Évora, para uma conversa que visou dar a conhecer o seu percurso pessoal e profissional ((I) “O Alentejo é uma região que é preciso conhecer, é preciso conhecer devagar”) e abordou o desenvolvimento desenvolvimento do turismo na região e a alguns dos seus desafios ((II) Alentejo: “Temos uma oferta que está muito ancorada numa imagem de qualidade, numa imagem premium”).
O turismo pode ter um papel de atração de uma geração mais nova para a região ou até mesmo essa obrigação? Como já começa a ser visto em alguns dos empreendimentos da região, como a Quinta do Paral, entre outros…
Eu acho que pode. Refiro o projeto da Quinta do Paral em que de facto a maior parte do staff, muitos desses jovens com formação hoteleira, estavam a trabalhar no Algarve e em vez de andarem a subir 2 ou 3 andares no hotel, vieram com pessoas para a terra deles e associaram-se a um projeto no qual eles se reveem. Um projeto de comunidade, um projeto de território, um projeto ligado à terra, ligado à sua cultura. O Alentejo é especialmente convidativo e convoca empresários, sejam alentejanos ou sejam empresários que venham de fora. As pessoas percebem que a filosofia dos projetos que se enquadram na região. Mas o Alentejo também acolhe, nós hoje temos em muitas unidades do Alentejo os melhores colaboradores que são imigrantes e que já estão cá perfeitamente estabilizados. Mas sim, o turismo é uma atividade que pode contribuir para o regresso de muitos jovens à região. Porque muitos jovens saem do Alentejo porque não veem oportunidades, não veem o futuro na sua vida profissional. Ora, se o jovem vir uma oportunidade e o futuro da sua vida profissional, ele regressa. Agora tem que perceber que tem que ter uma carreira, tem que perceber que tem condições para criar uma família, tem que ter habitação. Portanto, esse é o grande desafio que nós temos. O turismo no Alentejo tem essa capacidade de convocar as pessoas, de convocar aqueles que saíram e podem regressar, de convocar aqueles que vieram passar férias ao Alentejo e quererão ficar cá a trabalhar, e muitos migrantes também que hoje olham para o Alentejo como uma região na qual eles podem ficar, chamar as suas famílias e ficar cá a trabalhar de uma forma digna, séria e consequente.
O Alentejo tem essa responsabilidade e eu felizmente vejo todos os dias empresários, criativos, dinâmicos a criarem projetos empresariais com essa capacidade. Espero que esse processo possa densificar, consolidar e possamos cada vez ter mais responsabilidade. No último censo, o Alentejo continua a perder população e é verdade que não é o turismo sozinho que vai resolver todos esses problemas, mas pode dar um contributo para tentar mitigar esse processo.
Já falou na Agência Regional duas ou três vezes, também já referiu que no turismo nem tudo é um dado adquirido, mas no turismo está tudo interligado. Aqui coloco-lhe uma questão ao nível internacional, no âmbito da Agência Regional de Promoção Turística do Alentejo, que tem competências promocionais neste campo, que também preside. É possível acelerar o reconhecimento internacional da região? De que forma? Com mais investimento?
Diria que quando nós estamos nas dimensões financeiras e administrativas, eu e os meus colegas, como sabe, quer no Norte, Centro e Algarve, os presidentes das Entidades Regionais de Turismo também são presidentes das Agências, temos que aplicar o princípio da segregação de funções. Quando estamos a falar de turismo, da estratégia, só há um turismo do Alentejo.
E sim, aliás, nós estamos muito empenhados nisso. De facto o Alentejo vale sistematicamente 32, 33, 34%. As dormidas de turistas estrangeiros valem sistematicamente essa proporção. Nós não conseguimos sair daqui. Mas temos que sair. Claro que também, só à medida que a oferta cresce e que conseguimos ter propostas de alojamento mais consistentes, com maior qualidade, em maior número, para que possamos ter mais turismo. Não podemos ter turismo no Alentejo por cinco meses. Temos que ter turismo de sete meses, de nove meses, enfim, no limite de 12 meses. Mas só com mais oferta, em mais território, nós conseguimos captar mais nicho no mercado. Por exemplo, há 20 anos Évora tinha turismo durante três ou quatro meses. Hoje Évora tem praticamente turismo durante nove ou 10 meses. Mas Évora não é todo o Alentejo.
Estamos muito empenhados no aumento do reconhecimento internacional do Alentejo. Por isso é que candidatamos o Baixa Alentejo à Cidade Europeia Vinho. Porque depois, nalgumas sub-regiões, esse nível do reconhecimento internacional é mais baixo. No Baixa Alentejo, as dormidas de turistas estrangeiros andam à volta dos 20, 23%, 25%, depende dos anos. A Capital Europeia da Cultura em 2027 também vai ser uma oportunidade muito significativa para promover internacionalmente o Alentejo.
Estou sempre a dizer, aliás, tive essa recetividade e esse acolhimento por parte do secretário de Estado do Turismo, quando eu disse que o Alentejo era a única região do país que não tinha um jogo do campeonato no mundo de futebol. Teremos, felizmente, no Algarve, no Centro, em Lisboa e no Norte, mas não temos no Alentejo. Precisamos de sermos mais proativos, mais agressivos para que o Alentejo possa ser mais conhecido nos mercados internacionais.
Precisamos do ponto de vista da promoção internacional lançar uma grande campanha que mostre aos mercados internacionais este novo Alentejo. O tal Alentejo premium, o tal Alentejo inspiracional, o tal Alentejo que tem uma identidade autêntica, mas que tem produtos turísticos mais diversificados. São ambições que nós temos para este mandato, para estes três anos de mandato da Entidade Regional do Turismo.
Queremos mais eventos internacionais, uma grande campanha de afirmação internacional, uma revolução na comunicação digital, em regra os destinos regionais não comunicam bem do ponto de vista digital, No Alentejo vamos fazer um esforço grande para comunicar melhor porque temos este objetivo de facto para o Alentejo: de ser um destino internacionalmente mais conhecido.
Claro que o mercado interno vai continuar a crescer. Temos 10% de quota do mercado interno. O mercado interno é mais ou menos 23 milhões de dormidas para o Alentejo. O Porto e o Norte têm 20%. Nós ainda temos margem para crescer no mercado interno.
Mas onde vamos crescer mais percentualmente e onde vamos conseguir ter mais turistas para preencher os quartos novos que vão aparecer, temos claramente que olhar para os mercados internacionais, temos uma estratégia mais consistente, mais aguerrida e são muito esses turistas internacionais que vão pagar estes grandes investimentos que felizmente agora começam a sair do papel e a ir para o terreno.
Traz-lhe preocupação o constante adiar da questão do novo aeroporto de Lisboa, tendo em conta que estamos a falar de mercado internacional?
Sim, claro que sim. Ainda que nós venhamos de um aeroporto em Beja e que no ano passado já recebeu 30 charters não regulares e mais de 600 movimentos entre aviação executiva e táxis, o aeroporto começa a ser uma ferramenta interessante muito para o turismo residencial na zona da comporta, essencialmente.
Começa-se a olhar para o aeroporto de Beja como uma infraestrutura que a médio prazo pode ser importante. Ela está ali. Eu represento o Turismo Alentejo no Conselho Consultivo do Aeroporto, que inclui uma reunião anual, e propusemos muito recentemente propostas ao CEO da ANA que esteve presente e temos um desafio de melhorar a qualidade aeroportuária daquele aeroporto porque há muitos turistas estrangeiros que chegam ao aeroporto de Beja e precisam ser bem recebidos e vamos trabalhar nisso com a ANA.
Mas claro, como eu costumo dizer, o nosso aeroporto internacional é o aeroporto General Humberto Delgado.
Estamos aqui num trade off muito complexo porque por um lado nós temos já o Estado português e a ANA a avançar no projeto do novo aeroporto e por outro lado como é que a atual infraestrutura vai ter obras de ampliação para que se calhar 2/3 anos antes do novo aeroporto entrar em funções podermos aumentar a capacidade de receção de turistas, pois nós sabemos que hoje estamos a perder todos os dias passageiros que não conseguem aterrar e muitos destes passageiros viriam para o Alentejo. Desejaria que o aeroporto de Lisboa até ao aeroporto de Alcochete melhorasse ou otimizasse a sua capacidade operacional, pudesse receber mais voos para que pudéssemos ter mais turistas em Portugal e certamente desses turistas alguns viriam para o Alentejo. Mas tenho a noção que esse investimento por parte da ANA é complexo por questões ambientais, por questões de cronograma de obra, arriscaremos a ter essas obras feitas provavelmente quase em cima do novo aeroporto da conclusão da obra do novo aeroporto.