Um dos principais momentos da GEA Web Conference 2020, ontem, foi o painel debate sobre “As mudanças previsíveis na cadeia de valor na era pós-covid: desde o comportamento no consumidor até ao produto. Como adaptarmo-nos?”, no qual participou Pedro Costa Ferreira, presidente da Associação Portuguesa de Agências e Viagens e Turismo (APAVT).
Este ato de sobrevivência e necessidade de tesouraria é um desafio do setor
“As alterações são muito poucas e as consequências são muitas”, afirma Pedro Costa Ferreira, num período de “sobrevivência” para as agências de viagens que será “martirizante até ao final de 2021”. Para si, sobrevivência é sinónimo de tesouraria e “há quem não se tenha lembrado que as exigências de tesouraria vão ser maiores ao longo de 2021”.
Ao longo do próximo ano as agências enfrentam os “reembolsos” e, se tudo correr bem, irão “iniciar uma retoma”. No entanto, ao reiniciar atividade “uma parte do meu negócio serão vales”, dívida das agências aos seus clientes, e o presidente da APAVT relembra que “uma parte dos reembolsos dos fornecedores já foram recebidos por nós e gastos em custos diretos necessários para não falirmos”. Assim, a retoma trará troca ou reembolso de vales e traduzir-se-á num “momento de grande dificuldade de tesouraria” e de “financiamento mais difícil por causa dos balanços completamente destruídos”.
Pedro Costa Ferreira considera, então, que “este ato de sobrevivência e necessidade de tesouraria não é apenas um desafio empresarial mas enquanto setor”, no sentido em que “se muitos ou uma significativa parte de nós não conseguir sobreviver e reembolsar os seus clientes, por melhores que aqueles que ficarem no mercado sejam, o setor fica incomodado com uma ideia de falta de credibilidade”. Assim, defende que “daqui ninguém sai vivo sozinho, temos de sair vivos acompanhados”.
Mais risco, menos crédito e maiores dificuldades de financiamento
Acerca das mudanças na cadeia de valor, o presidente da APAVT argumenta que “não vai haver um novo normal” mas antes um “acelerar de tendências” sem grandes consequências a nível da oferta, algumas ao nível do consumidor e grandes consequências ao nível do modelo de negócio:
“Não acho que haja um comportamento pós-covid” por parte do consumidor, reflete o responsável, ainda que possa existir uma maior “preocupação por parte do turista relativamente ao nível de suporte de saúde dos destinos turísticos” e, dessa perspetiva, “alguns destinos turísticos poderão ter que afetar alguns recursos das suas receitas turísticas à colocação de alguma resposta de saúde mais convincente”, defende.
Pedro Costa Ferreira adianta que pode também “haver algum trade off entre mais networking e presença física e menor custo e maior dimensão” visto que “estudos recentes indicam que é possível termos convenções híbridas com muito mais gente e custos com poupanças entre 50 e 70%”. Outras tendências se acentuarão como a autenticidade, sustentabilidade, o slow tourism e o comércio justo mas isso “não são novos comportamentos”.
Pelo contrário, haverá uma “enorme consequência” ao nível do modelo de negócio e no ambiente macroeconómico das agências de viagens pós-pandemia: “Mais risco, o quadro segurador neste momento dá-nos uma visão muito menos aconchegante do risco relacionado com as viagens organizadas; menos crédito dos nossos fornecedores aliado a maiores dificuldades de financiamento”. Surgirá ainda uma “maior proximidade do consumidor face ao digital” fruto de maior “literacia digital” de todas as gerações.
Este cenário “afasta completamente modelos de baixa margem e/ou assentes em crédito” que eram já modelos “antigos mas viáveis desde que bem geridos”, assegura o presidente da APAVT. Tal exige “criação de valor” porque “ninguém consegue aumentar a margem ou vender sem crédito se não o fizer”, seja por criatividade, inovação, diferenciação ou focos, e há que “transmitir essa criação de valor”. Em suma, no futuro próximo, “temos uma urgência e uma importância, a sobrevivência e a criação de valor”, respetivamente.