“Nunca houve uma perceção tão grande do valor de Fátima para o turismo”

No ano em que todas as atenções estão viradas para Fátima, Ambitur esteve à conversa com Alexandre Marto Pereira, administrador do Fátima Hotels Group e vice-presidente da ACISO, que procurou explicar de que forma a região está a viver este período. Nascido com a hotelaria nos genes, o gestor hoteleiro defende que “Portugal é Futebol, Fado e Fátima” não hesitando em pedir a todos que reconheçam Fátima como algo que faz parte do código genético do País.

O que significa o turismo para a atividade económica da região?
Fátima está sistematicamente no TOP5 e TOP10 dos municípios com mais camas, mais hotéis e os maiores rácios do país em número de camas por 1000 habitantes. Fátima depende completamente do turismo. Se acontecer algo grave ao turismo religioso, ou a Fátima, isso significa que há milhares de pessoas que ficam desempregadas. Isto é particularmente mais sério porque estes empresários de hotelaria são quase todos familiares. É uma economia muito saudável. São PMEs e microempresas que geram os seus empregos, geram riqueza para as famílias que as operam e conseguiram constituir um cluster turístico extremamente importante. É por essa razão que é possível as unidades hoteleiras manterem uma viabilidade económica com preços tão baixos; espero obviamente que venham a ser corrigidos. É apesar de tudo fácil encontrar pessoas com alguma formação ou experiência na área hoteleira. Existe uma Escola Profissional de Hotelaria em Fátima que é quase autossustentável. Em Fátima, todas as pessoas têm uma sensibilidade muito grande em relação ao turismo.

No próximo ano temos tudo para Fátima se afirmar externa e internamente?
Pelo menos do ponto de vista político, com esta Secretaria de Estado nunca houve uma perceção tão grande do valor de Fátima para o turismo nacional. Esta Secretária de Estado já nos fez sentir que considera Fátima um ativo forte para o turismo. Da mesma maneira que o fado foi finalmente aceite em Portugal como fazendo parte do seu corpo genético, penso que o mesmo acontecerá com Fátima. Portugal é Futebol, Fado e Fátima. Não vale a pena negar aquilo que está na nossa natureza.

Quais os desafios e oportunidades que se colocam aos hoteleiros da região?
Há uma nova geração em Fátima. O nosso exemplo, de uma empresa conjunta, só é possível porque há uma geração que já viu o mundo, tem noção de que a escala é necessária, tem formação e, portanto, tem presente conceitos de gestão que implicam este tipo de decisões. Essa alteração geracional é a grande oportunidade para Fátima. Isso alinhado com o facto de haver uma alteração da postura política e das entidades nacionais para com Fátima. E há duas coisas extremamente interessantes: a primeira é uma alteração do paradigma da população católica mundial. Há 50 anos a maior parte da população católica mundial estava na Europa, hoje está principalmente em países da América Latina e Ásia. E é nesse sentido que estamos a fazer esforços para ter a promoção do destino na Ásia e na América. A Coreia, por exemplo, é já o 5º país no ranking mundial de pessoas que se inscrevem no Santuário como peregrinos, a par de países como o Brasil, EUA ou Filipinas. As pessoas reconhecem Fátima automaticamente, agora é preciso desenvolver ou apresentar as autoestradas para o fazerem e fazer um esforço para que os empresários possam apresentar-se num mundo tão grande. Mais de metade do tráfego que passa por Fátima passa por DMCs que não são portugueses, são espanhóis, exatamente porque muitos DMCs portugueses não têm escala. Os espanhóis estão a vender o nosso destino, o que faz com que uma parte substancial do valor não fique em Portugal, mas em Espanha.

Os hotéis da região estão estruturados para o consumidor atual?
Tem havido uma alteração do perfil do cliente. Estamos a ter um cliente cada vez mais elitista, de estratos sociais mais elevados e cada vez mais internacional. E tem havido uma alteração muito forte na hotelaria de Fátima para este novo perfil. Há cada vez mais unidades de quatro estrelas e a oferta de alojamento local hoje é residual. Mesmo os hoteleiros de três estrelas têm feito um esforço de requalificação enorme. Esse é o primeiro foco da hotelaria: prepararem-se para este novo tipo de catolicismo.

O turismo de saúde poderá complementar a oferta de Fátima?
O turismo de saúde faz todo o sentido mas não há nenhuma estrutura de saúde. Haveria margem para outras duas coisas: uma é a utilização de Fátima para realização de convenções mas era necessário um equipamento. Fátima tem a hotelaria e não tem um centro de congressos. Na verdade, existe um centro pastoral que pertence ao Santuário de Fátima, que não pode realizar qualquer evento que não tenha uma natureza religiosa por razões fiscais. Julgo que seria muito pertinente fazer uma exceção ao caso. Porque existe uma estrutura que custou milhões de euros ao Santuário de Fátima, que a ser replicada custaria milhões de euros ao contribuinte português.

Olhando para o trajeto que levou à criação do Fátima Hotels Group, foi fácil juntar estas empresas?
Foi lento, porque envolve diálogo e, acima de tudo, foi necessário apresentar resultados. Todos os anos conseguimos resultados fortíssimos, todas as unidades venderam muito mais quando aderiram à marca e todas perceberam que têm uma visibilidade muito maior. Mesmo que a marca tenha uma natureza muito intrusiva. O sistema informático de cada unidade hoteleira é partilhado por todos, é um sistema muito transparente. Não somos um agente de viagens, somos uma central de reservas hoteleira, e como tal, o que fazemos é dar uma resposta mais rápida que o próprio hoteleiro. Por outro lado, mantemos sempre a escolha do hotel do lado do cliente, o que é a chave da confiança.

O que é a ACISO e qual a sua participação?
Sou atualmente vice-presidente da ACISO – Associação Empresarial Ourém-Fátima, que tem vindo a impor-se e tem conseguido um diálogo com os empresários, com o Turismo de Portugal, com a ARPT, com a própria Secretaria de Estado do Turismo, sempre com muita humildade mas também com muito know how.
De longe penso que o evento mais importante é o workshop de turismo religioso, porque não é mais um seminário. O nosso evento é muito focado naquilo que nós devemos fazer: o apoio aos empresários, naquele espírito de mostrar às pessoas onde estão as autoestradas. O que vamos fazer é um dia inteiro de reuniões B2B, pré-marcadas, com o apoio do Instituto Politécnico de Leiria. Sabemos que vão ser mais de 5 mil reuniões, com hosted buyers que virão de mais de 30 países (já temos cerca de 45 confirmados, vamos ultrapassar os 100, como no ano passado) e que vêm especificamente para comprar, de uma forma muito visível.
Além disso, é com muita satisfação que teremos o apoio, mais uma vez, das ARPTs que, na nossa opinião, podem ancorar uma parte do seu turismo em Fátima e no turismo religioso. Este ano vamos ter o apoio do Centro, em primeira linha, tanto da ARPT como da RT, é a nossa região; e também mais uma vez a parceria com o Alentejo, o Porto e Norte, os Açores e, pela primeira vez, com Lisboa.
Este ano, pela primeira vez, vamos fazer ações em todo o mundo, principalmente nos mercados novos. Tivemos a perceção clara de que não podemos entrar em concorrência institucional com outras entidades. Quando o Turismo de Portugal ou a ARPT já estão presentes, ou mesmo quando os próprios empresários portugueses já estão presentes, não vale a pena ir a esse mercado fazer promoção. Não devemos duplicar esforços. Por essa razão é que vamos a eventos como a Expo Católica no México ou no Brasil, ou à Coreia, ou às Filipinas.

Esta é a 1ª Parte da Grande Entrevista publicada na Edição 297 da Ambitur.