“O sonho dos próximos 10 anos é a marca Martinhal nas grandes cidades”

Chitra Stern, administradora do Grupo Martinhal Family Hotels & Resorts, está em Portugal, com o marido, Roman Stern, desde 2001. A empresária recebeu a Ambitur no Martinhal Lisbon Cascais Family Resort Hotel, na Quinta da Marinha, e recordou os primeiros tempos no nosso país, quando decidiu investir em Sagres. Hoje a marca conta com quatro unidades, e a quinta a abrir em 2020/21, no Parque das Nações, e aponta agora a mira às grandes cidades mundiais, como Nova Iorque e Londres.

Já se sente portuguesa?
Eu sou Indiana de origem, nasci em Singapura, tenho passaporte britânico, sou suíça por casamento e adquiri a nacionalidade também, sou portuguesa pois vivo cá há 17 anos e foi aqui que fiz o maior negócio da minha vida. Sou tudo isto e um pouco de cada. Hoje em dia, a identidade é algo complexo. Eu olho assim para mim.

Quando chegou a Portugal, houve certamente muita curiosidade dos hoteleiros portugueses em saberem quem era…
Sim, claro… Ninguém nos conhecia. Até porque não somos ninguém até provarmos alguma coisa. No início, todos olharam para nós como os “malucos suíços que estão a fazer um projeto longe de tudo” (risos)… Começámos o nosso negócio numa fase muito complicada para Portugal. Em 2008 começámos a construção e abrimos em 2010. Foram anos muito complicados. Fizemos um projeto em Sagres, longe de tudo; se conseguimos fazê-lo em Sagres, conseguimos fazê-lo em qualquer lugar (risos)…Não foi fácil, não havia massa crítica. Este híbrido de imobiliário e hotelaria também foi difícil para muitas pessoas perceberem. Também inovámos, tivemos de ser inovadores a nível de financiamento, de investimento, de conceito… A diferenciação foi muito importante. Mas quando conseguimos fazer um produto de sucesso, os primeiros a compreenderam foram os bancos, e por isso conseguimos falar acerca de outros ativos. Na hotelaria, conhecemos a cadeia Memmo, pois eles chegaram a Sagres em 2007 e abriram antes de nós. Tivemos sempre uma boa relação, ficámos juntos numa associação de promoção de Sagres como destino de alta qualidade. Quando nos tornámos um sucesso, todos reconheceram o investimento naquela região subdesenvolvida. Foi um contributo para o desenvolvimento de tudo à nossa volta. Foi um grande exemplo do potencial do turismo para desenvolver uma região. Em Portugal, quando sabem que vamos fazer um bom produto, com qualidade, somos bem-vindos.

O Martinhal é o principal negócio da família?
Hoje é o principal negócio. Mas estamos a diversificar. Somos sócios num negócio para fazer uma escola internacional e já temos um operador internacional para fazer a gestão da escola. Quando nos mudámos do Algarve para Lisboa teríamos gostado de viver no Parque das Nações, mas faltava uma escola internacional para os meus quatro filhos. Daí termos ido viver para o Estoril. Este é um desafio para muitas famílias que querem mudar para Portugal.

Neste momento, faço parte da comissão executiva do Portugal In, formado pelo Governo, desde 2017, e o objetivo é atrair mais investimento direto estrangeiro para Portugal, especialmente por causa do Brexit. E para isso temos que ter uma escola internacional. Falámos com o presidente Fernando Medina mas, por coincidência, a Cushman & Wakefield mostrou-nos a Universidade Independente, que na altura não seria para outro investimento mas que era perfeita para a escola. A universidade estava fechada desde 2007. E é uma mais-valia reabilitar um espaço já existente. Trouxemos à volta de 10 grupos para verem o nosso projeto, e um deles foi para nós o sócio perfeito.

Olhando para trás, esperava que o projeto se tornasse no que é hoje? Qual o momento mais desafiante?
Os anos mais complicados foram entre 2007 e 2012. Também pessoalmente tinha filhos pequenos, vivíamos em Lagos e depois Sagres, e tínhamos de vir para Lisboa três a quatro vezes por semana, para avançarmos com o nosso projeto, durante a pior crise económica do mundo desde 1929. Também foi complicado construir uma equipa de raiz, não foi fácil encontrar pessoal. E depois implementar a visão… Em 2013 já conseguimos fazer crescer o negócio. E depois há outra vertente, a dos vistos gold, que começou no final de 2012/início de 2013. Conseguimos concretizar vendas junto de chineses e sul-africanos; fiz 12 sessões via Skype com uma professora chinesa para melhorar o Chinês, porque eu aprendi Chinês, e vendemos casas contra todas as probabilidades para estes dois mercados. Tivemos muitos desafios.

O que é que o grupo pretende daqui a 10 anos?
Somos um grupo pequeno. Não posso competir com a Vila Galé, o Pestana, o PortoBay… São grupos grandes na hotelaria. Mas também não acredito que vamos ter dezenas de hotéis da nossa marca em Portugal. Além disso, somos empresários que sempre pensámos que temos de construir um negócio para eventualmente vender. Os portugueses não gostam de falar nisto. Mas a verdade é que os meus filhos têm que encontrar a paixão deles.

Por isso, penso que a nossa próxima etapa tem que ser fora de Portugal, como franchise ou com outros sócios. Uma construção da marca Martinhal nas cidades. Temos que ter coragem no franchise, pois temos que acertar na qualidade. O sonho dos próximos 10 anos é a marca Martinhal nas grandes cidades que as famílias gostam de visitar, como Nova Iorque, que tem um grande potencial para Martinhal, ou Londres. Os millennials querem viajar com crianças. E nós queremos apoiar as famílias que estão a visitar cidades, com quartos intercomunicantes, um ambiente relaxado…

O projeto do Parque das Nações é para estar concluído quando?
Em 2020/21. É um hotel multigeracional.

No Congresso da AHP disse que devíamos premiar cada Indiano que chegasse a Portugal; e falou dos aeroportos… Que desafios temos hoje em Lisboa e no Algarve?
O desafio é para todo o país. Um destino “trendy” não o é para sempre. Por isso, como mantemos esta tendência, ou os elementos que nos fazem excelentes? Eu sou britânica, e estou muito triste com o Brexit, não acho que seja o futuro para o Reino Unido, nem para a Europa. E também vai afetar o turismo. É pois uma boa altura para pensar em outros mercados. Este processo já começou em 2013/14, com contratos de relações públicas e marketing com os EUA, Brasil, China, Índia… Temos que enfrentar estes problemas. Se queremos negócio e turismo da Índia, o desafio começa lá. Temos que copiar a França e a Suíça, que conseguiram uma enorme eficiência na emissão de vistos. Por que não nós? Nunca podemos ficar com a ideia de que já temos o suficiente. Temos sempre que estar preparados para ver qual o próximo passo. Porque na Europa temos uma população a envelhecer, e o futuro de jovens, famílias e classe média, está na Índia e na China. Eu sei que o Turismo de Portugal está a fazer um bom trabalho para divulgar estes mercados. Neste momento está um pouco complicada a questão dos vistos. Há muitos Indianos que vão para França e depois juntam Portugal num programa de cerca de três dias, porque o visto francês é mais fácil. Não estaremos a perder negócio? E Portugal está na moda, por isso vamos captar este negócio, não vamos perder negócio.

Em termos do Algarve, também temos negócio com a China, Índia, Brasil, claro. Nunca digo que seja impossível atrair Brasileiros para o Algarve, porque eles estão a apreciar as praias limpas, o ar limpo, a gastronomia. E há a questão da diversificação de ligações aéreas para Faro. Falei disso no Congresso da AHP: por que não voos dos EUA para Faro? Para o resto do mundo, a distância entre Faro e Lisboa não é nada… só para nós. Por isso, vamos fazer algo. Podem chegar pelo Algarve e sair pelo Porto, por exemplo. Para os Indianos esta distância não é nada; os Brasileiros também têm estradas péssimas, por isso também não é nada. Estão prontos para explorar o país, de norte a sul. Gastam só uma semana e querem ver tudo, este é um mercado que temos de desenvolver. Se querem só dois dias, vamos dar-lhes dois dias. Até agora as ligações aéreas de Faro foram mais para a Europa. Mas também valemos muito noutros destinos.