Opinião: “Adeus 2022, olá 2023”

Por João Fernandes, presidente do Turismo do Algarve*

A encerrar mais um ciclo anual de atividade, é tempo de perspetivarmos o que nos reserva 2023. Uma análise que implica, necessariamente, um olhar retrospetivo ao ano que agora termina.

O desempenho alcançado em 2022 pelo Algarve superou as melhores expectativas, as nossas e mesmo as de organizações internacionais como a ETC (European Travel Commission) e a WTTC (World Travel and Tourism Council). Depois de dois anos fortemente penalizadores, marcados pela pandemia, e de um ano de crescimento abrupto da inflação, registámos o melhor resultado de sempre em proveitos. De acordo com dados do INE, até outubro os proveitos em empreendimentos turísticos foram 15% superiores ao período homólogo de 2019. Também no golfe, um dos produtos turísticos mais relevantes para o Algarve, registámos um crescimento de 4% do número de voltas e de 10% nos green fees, face a 2019. Especialmente relevante este aumento da receita, que permitiu atenuar o enorme impacto dos dois últimos anos e fazer face ao significativo aumento de custos de produção.

Alcançámos em 2022 o que esperávamos apenas atingir em 2023, 2024 ou mesmo 2025. Um resultado extraordinário, com origem em fatores que dificilmente se repetirão nos próximos anos. Beneficiámos de anormalmente elevados níveis de poupança das famílias, do adiamento das reservas do período pandémico, do consumo de revolta, da reticência dos europeus nas viagens de longa distância. Recuperámos capacidade aérea mais rapidamente que a concorrência na Europa. Do lado da oferta, perante um cenário especialmente adverso, de salientar a resiliência das empresas, a eficácia das ajudas do Estado e a capacidade do destino Algarve em reforçar a sua notoriedade internacional, associada à qualidade da oferta e a uma imagem de segurança (Melhor Destino de Praia do Mundo 2021 – World Travel Awards e Melhor Destino de Golfe do Mundo 2020 – IAGTO).

Se nas receitas superámos 2019, ao nível da procura ficou ainda aquém. Os números de hóspedes britânicos e alemães, os nossos principais emissores externos, apresentaram ainda uma variação negativa de 9,2% e 14,1%, respetivamente (dados acumulados janeiro a outubro, Travel BI). Este desempenho menos conseguido do lado da procura externa acabou por ser menos penalizador do que seria de esperar, na medida em que nos permitiu ajustar a capacidade oferecida à limitação sentida no recrutamento de recursos humanos.

Depois de um ano excecional, 2023 traz consigo desafios. São vários os sinais adversos à procura, que nos fazem perspetivar o próximo ano com prudência e com foco redobrado na promoção. Estamos atentos ao impacto que a inflação vai ter neste setor (no consumidor, nas empresas e nos trabalhadores) e temos acompanhado a evolução da situação económica dos nossos principais mercados e recolhido o feedback dos operadores turísticos internacionais.

Por contraponto a elevadas poupanças nas famílias, temos agora forte redução do poder de compra devido à inflação e às taxas de juro. Em vez de consumo de revolta, assistimos agora à contenção dos gastos em lazer, face a perspetivas de retração económica nos nossos principais mercados emissores. É assim expectável que os turistas europeus, responsáveis por mais de 90% das dormidas na hotelaria da região, viajem menos vezes para fora do seu país, com estadias mais curtas e gastos mais controlados.

Para o próximo ano, o Reino Unido antecipa uma recessão económica e os indicadores de confiança do consumidor são os mais baixos de sempre. É esperada uma inflação na ordem dos 7,4% e a carga tributária chegará a 37,1% do PIB, a mais alta desde a 2.ª Guerra Mundial. Na Alemanha, apesar da economia estar a ter um desempenho melhor do que o previsto na reta final do ano, a contração do PIB continua a ser o cenário mais provável para 2023. Um cenário ao qual acresce uma inflação semelhante à do RU, que anulará o efeito dos anunciados aumentos de rendimentos. No mercado nacional, há ainda que considerar o impacto dos aumentos do crédito à habitação, responsável importante por parte dos encargos dos portugueses.

A juntar a esta conjuntura económica, que se repete um pouco por toda a Europa, as anunciadas greves em companhias aéreas e estruturas aeroportuárias ou em empresas de transportes rodoviários são fenómenos a que temos de estar especialmente atentos e preparados para agir, encontrando soluções flexíveis alternativas em cada momento.

Mas encontramos também oportunidades a explorar no horizonte. Novos países emissores emergem, fruto da diversificação de mercados e de motivações de visita à região em que temos vindo a apostar. Entre 2014-2019 registámos um aumento de 73% das dormidas de turistas de origens distintas dos 5 principais países de procura no Algarve. É o caso americano, a crescer este ano de forma muito expressiva (+34,9% dormidas do que em 2019) e com uma vantagem cambial acrescida em relação ao euro. O mesmo esperamos que aconteça no próximo ano com o Canadá e com o Brasil. Vemos ainda um potencial de oportunidade nos mercados francófonos – França, Bélgica, Luxemburgo e Suíça –, que têm manifestado um interesse crescente pelo Algarve nos últimos tempos.

Perante o crescimento dos preços praticados em alguns destinos do Sul da Europa e a instabilidade no Norte de África e Médio Oriente, acreditamos que será determinante uma perceção de melhor escolha value for money e de destino seguro.

O custo mais elevado das viagens de longa distância poderá concentrar a procura por parte de turistas europeus nos destinos do Sul da Europa. O preço da energia poderá gerar o crescimento das long stays de reformados, remote workers ou digital nomads. Temos campanhas em curso para atrair estes públicos e um leque de ligações para o Aeroporto Internacional de Faro neste inverno IATA superior ao que alguma vez tivemos. Este é também um sinal de confiança no destino por parte das companhias aéreas e dos operadores turísticos internacionais.

2023 será, certamente, um ano exigente e de muita expectativa. Certezas são poucas, mas há razões para um otimismo cauteloso.

*Artigo publicado na edição 343 da Ambitur.