Opinião: “Ciclo de vida”

Por Miguel Quintas

Li num artigo recente que, aqui na nossa vizinha Espanha, de todas as empresas do setor turístico nascidas na época de crise de 2009 a 2014, quase 60% morreram. Uma vez que estamos em plena época de congresso da APAVT cujo foco versa esta publicação que tem em mãos, adianto que o mesmo índice para operadores, centrais de reservas e agências de viagens foi de 55%.

O artigo suscitou-me distintas emoções, não pelo número específico de percentagem de empresas do sector que desapareceram mas precisamente pelo facto de mais de 40% delas terem nascido e sobrevivido em plena época de crise (que por sinal ainda se mantém por cá, em Portugal). No caso das agências de viagens, quase 45% delas ainda por aí andam. A morte é um sinal de fim de ciclo. Mas é um sinal também de renascimento. No caso das agências de viagens, é um sinal de constante sobrevivência, adaptação e, porque não, sucesso. De facto, se olharmos para as cifras espanholas, o número de agências ainda conseguiu aumentar mais quase 8% naquele mesmo período.

Já antes do início da crise em 2009, o fim das agências de viagens era anunciado por conferencistas, gurus da economia, investidores, gestores e visionários. E inexoravelmente todas as opiniões eram suportadas em estudos, mapas, rácios, tendências e até empirismos económicos e sociais. Não posso questionar a validade de cada uma das opiniões, até porque na sua grande maioria são/eram até muito robustas. Mas cabe-me comentar os factos. As agências de viagens continuam a evoluir. Com extrema dificuldade, é certo, mas evoluem. Seja em dimensão, seja em tecnologia, seja em serviço, seja em controlo de custos ou em criatividade na execução de produtos. Elas adaptam-se. Têm-se adaptado e continuam a fazê-lo diariamente procurando os modelos de negócio que realmente sobreviverão no futuro. O facto de encontrarmos quem ainda queira empreender neste negócio e consegue vingar demonstra uma força (ou necessidade, é certo) única.

Recordo-me que não há muito anos, os pais desejavam e orgulhavam-se que os seus filhos fossem trabalhar na função pública. Passados alguns anos, os pais passaram a desejar que os seus filhos trabalhassem em grandes multinacionais de prestígio. Nos dias de hoje, os pais orgulham-se mais da coragem e capacidade empreendedora dos filhos ao lançar novas empresas e ideias. Nas agências de viagens o percurso não tem sido diferente. Acredito que este espírito empreendedor e de evolução é o melhor e maior incentivo para o desenvolvimento das agências de viagens, do seu setor difícil e consequentemente, do próprio país.