Por João Silva Santos, Head of BlueShift Talent | BlueShift
É cada vez mais frequente ver o conceito de rotatividade, classificado como uma das problemáticas centrais, na Gestão de Capital Humano da atualidade. Tal é a frequência e banalidade do tema, que muitos interlocutores com quem discuto o mesmo, o abordam com uma postura de resignação total, como se de um flagelo inevitável ou intransponível se tratasse. Lembro-me, há alguns anos, de ser precisamente o cenário inverso. Muitos de nós, que tinham como missão gerir Recursos Humanos de empresas, ansiavam por ter no final do mês ou trimestre, alguma taxa positiva de rotatividade, que comprovasse a existência de um certo nível de “oxigenação” das equipas de então, na sua maioria caracterizadas pelas elevadíssimas médias de anos de serviço.
Hoje, o cenário não podia ser mais oposto. Volta-se a premiar a longevidade de colaboradores, visto ser uma característica cada vez mais escassa, principalmente para a faixa de profissionais em início de carreira, que por definição teria a missão de renovar com “sangue novo” as equipas que gerimos.
No âmbito da Gestão de Recursos Humanos, é óptimo contar com diversos barómetros, que nos resumem anualmente, de forma eficaz, as tendências que devemos ter em conta quando o tema é o Capital Humano. Curiosamente, a interessante análise levada a cabo pela Deloitte em 2019 Global Human Capital Trends, enumera como principais tendências da gestão de Recursos Humanos a observar em 2019, algumas que a meu ver já deviam estar no topo das preocupações estratégicas dos líderes das nossas organizações, há algum tempo. Temáticas como a “Gig Economy”, cuja relevância já motivou a própria União Europeia a desafiar os Estados Membros a incorporarem nos seus quadros de legislação laboral, mudanças que permitam processar de forma efetiva esta realidade emergente, comparável segundo alguns especialistas a uma “Nova Revolução Industrial”. Adicionalmente, assiste-se à entrada no mercado de trabalho da “Geração Z”, que interpreta o paradigma laboral de forma completamente diferente das gerações anteriores, requerendo um nível de autonomia e flexibilidade inédito para muitos sectores.
Podia enumerar diversos outros factores com os quais nos cruzamos actualmente e que estão a redesenhar por completo a forma de estar dos profissionais nas empresas. Contudo, apenas os dois que anteriormente referi, são já suficientes para alertar para o facto da “escassez de mão-de-obra” — apontada recorrentemente como origem da dificuldade de atrair e reter equipas — estar longe de ser a principal causa dos níveis insustentáveis de rotatividade.
Certas organizações, exemplos de boa visão estratégica, têm proativamente empenhado esforços de reinvenção, ao refrescar os seus paradigmas culturais e de interacção com o Capital Humano. Sim, estão a reinterpretar de A a Z a forma de gerir o seu talento. Sim, estão a reconfigurar a forma como atraem, comunicam, recompensam e até como se vinculam aos profissionais das gerações emergentes. Tal como elas, acredito profundamente que o flagelo da rotatividade organizacional se deve sobretudo a uma perigosa postura de reactividade, onde apenas se remedeiam as graves consequências de não se assumir que o paradigma de gestão de ontem, não é claramente o de hoje e muito menos o de amanhã.