Seminário CTP: Portugal não soube investir e é dos “países mais endividados do planeta”

A Confederação do Turismo de Portugal (CTP) promoveu, na passada sexta-feira, um Seminário sobre “Economia Portuguesa e Orçamento de Estado 2020 (OE2020)”. Sob o tema “Este é o OE que a economia portuguesa e o turismo precisam?”, a sessão contou com a presença do docente José César das Neves, da Universidade Católica, e do fiscalista Jaime Esteves, da consultora PwC.

“Difícil, histórico, milagroso, paradoxal e adequado”: assim começa por descrever João César das Neves o OE2020, afirmando que o panorama mundial atual é de “grande transformação económica e social”, conduzindo a “enormes transformações políticas”. Em Portugal, o responsável refere que “vivemos uma pequena transposição”. Enumerando vários pontos positivos, como o facto de se manter o “mesmo quadro político de há 30 anos”, além da economia estar a “crescer há 22 trimestres consecutivos”, o “segundo período mais longo de crescimento nos últimos 40 anos” desde que existem dados trimestrais, e o desemprego ter descido “11.4 pontos percentuais”, o docente esclareceu que é uma “ilusão” dizer que a economia “está boa. Quando comparamos a economia com o ´buraco` (crise financeira), estamos bem”. Mas, quando se compara o “crescimento antes do ´buraco`, de facto, isto não está a ser grande coisa”, acrescenta César das Neves. Nesta ótica, o docente da Católica destaca os “choques” previstos para o próximo ano. “Temos superpotências ditatoriais, uma grande incerteza na Europa e os crescimentos são fracos”, exemplifica, declarando que “estamos no estranho mundo das taxas de juro que é um problema”. 

Relativamente ao “excedente orçamental”, César das Neves chama ao OE de “milagroso” e “histórico”, pois é a primeira vez que se atinge tal marco “nesta democracia”. Já sobre os impostos, o docente considera essa questão uma falácia pois, para ele, não existem muitos impostos:   “temos é poucos (contribuintes) a pagar”, sucinta. O investigador acrescenta que o cenário é similar com a despesa pública. “Se virmos em percentagem do produto a despesa é enorme, mas se virmos por pessoa é muito baixa”, pormenoriza. César das Neves não tem dúvidas de que o “único problema” do OE é o “crescimento da economia”. Questionando o facto de o OE se adequar ao país, o docente aponta que Portugal “não tem capital. Investiu com dinheiro que não era nosso e em coisas más que não deram rentabilidade”, reiterando que “somos dos países mais endividados do planeta”. Nas questões da banca, o responsável refere que o “crédito às empresas está cair sistematicamente”, salientando que, nos “novos empréstimos”, os bancos fazem “dinheiro para o imobiliário e para o consumo. Do pouco investimento que há nas empresas é feito pelos próprios empresários”. 

Um orçamento que “estimula o crescimento mas quando cresce tributa mais”

Numa mesma visão, Jaimes Esteves sublinha que “não existe capital” e a banca está a “investir no imobiliário. Esperemos que o imobiliário dê conta porque de outra forma, teremos um problema como no passado”. Para o fiscalista, “o capital, o imobiliário e a emigração” é o que deve servir de base das “críticas” ao OE. Sobre o mesmo, Jaime Esteves afirma que “deve ser aplaudido. Pela primeira vez no pós-geringonça que não temos um orçamento negociável: ele foi aprovado!”, diz.

Além do “excedente”, o OE é “louvado” pela “estabilidade fiscal”, afirma o consultor, mas, em termos de medidas fiscais, o esta “não era esta a sustentabilidade que se pedia”, até porque é uma “estabilidade fiscal mas de maré alta”. De acordo com o fiscalista da PwC, estas opções não são positivas: “Quando há um aumento brutal de impostos, dizer que vamos ter estabilidade é tornar estável aquilo que é excecional e temporário”. Questionando a “coerência” de uma política fiscal que incentiva o “crescimento das empresas” e que, depois, “se tiver lucros elevados”, a taxa vai aumentando de “25 para 29 ou 30%”, Jaime Esteves afirma que o resultado será o “aumento da derrama estadual. Estamos a querer incentivar para crescer para depois fustigar”.  Nesta linha, o responsável considera tratar-se de um orçamento que “estimula o crescimento mas, quando cresce, tributa mais”, acrescentando ser um orçamento que “olha para quem pode pagar”, estando o “imobiliário” numa altura com “políticas a propósito do arrendamento que não favorecem e que, em matéria de política fiscal, ainda mais”.