É o “homem do leme” da MSC Cruises em Portugal desde a abertura do escritório da multinacional no nosso país, em 2010. E neste período de sete anos tem levado a companhia “a bom porto” e acredita sem hesitar que o mercado nacional poderá crescer mais no setor dos cruzeiros do que se perspetiva. Eduardo Cabrita, cujo percurso profissional esteve desde sempre ligado ao mar, contou à Ambitur por onde começou e a sua vontade de fazer crescer a companhia de cruzeiros a partir de Portugal.
Qual o seu percurso profissional?
A minha família vive toda praticamente em Sines. Quando acabei a minha licenciatura, em Lisboa, onde tirei uma licenciatura em Marketing e outra em Publicidade, retorno a Sines e pensei em aproveitar os meses de verão ali e depois voltar a Lisboa para procurar emprego. Voltei a Sines e, exatamente no mesmo dia, perguntam se ando à procura de emprego. E fiquei oito anos em Sines a trabalhar com navios, na Sicampos. Na altura era uma equipa de cinco pessoas e precisavam de alguém que falasse com os armadores diretamente com o intuito de abastecermos os navios que paravam em Sines. Tive aqui uma grande oportunidade de começar a trabalhar e aqui fiquei durante sete/oito anos. Durante este período passámos de cinco para 18 colaboradores. A minha função foi pegar na parte comercial da empresa; passados dois anos recrutei duas pessoas para esta área e dediquei-me então à área de Marketing e contacto com os armadores.
Nos últimos três anos da minha permanência nesta empresa começámos a sentir uma grande pressão de fornecedores, que estavam essencialmente localizados na Alemanha e Holanda, e que conseguiam fornecer os navios em Portugal com melhores condições que nós. Nessa altura entendemos que teríamos que diversificar o negócio. Olhámos para o mercado dos navios e tentamos perceber por onde poderíamos “furar”, sendo que o caminho encontrado foi precisamente o dos navios de cruzeiros, que estavam a começar a surgir. Como sentimos que não havia ninguém especializado nesta área contratámos duas pessoas e começámos a fornecer o Paquete Funchal, entre outros, sendo que quando acabo por sair da empresa esta área já representava cerca de 35% da faturação.
Nessa altura o Dr. Potamianos, o dono da Classic International Cruises, liga-me, indicando que gostaria de falar comigo porque a empresa iria ter em 2015 um navio de cruzeiros, e pretendia uma reforma completa do Departamento de Publicidade interno e externo, e desenvolver outras áreas. O core business da empresa na altura era alugar navios a outras companhias mas queria começar a trabalhar cruzeiros próprios com saída de Lisboa. Tivemos várias reuniões e, em janeiro de 2005, volto para Lisboa e integro a Classic International Cruises (CIC), onde estive até 2009. Este foi mais um período de “escola” para mim, já mais dentro da atividade turística.
Relativamente à MSC há um facto curioso. Todos os sábados compro o Expresso, mas nesse fim-de-semana não comprei, só terça-feira, e então vejo um anúncio, que não estava identificado, apesar de indicar que era de cruzeiros, e que incidia no meu perfil. Este foi um processo que demorou seis meses. Portugal era o único país na Europa em que faltava abrir um escritório próprio da companhia, tendo a empresa como core business a Europa. Abrimos então as portas em janeiro de 2010.
Como foi assumir a liderança de uma multinacional em Portugal?
Dois anos antes de integrar a MSC fiz um MBA já a pensar em atingir outras perspetivas. Quando fiz a entrevista com a MSC foi com Leonardo Massa que, na altura tinha a responsabilidade do mercado de Portugal, Espanha e Itália. Apesar de ter 34 anos sentia-me suficientemente maduro para assumir a liderança do projeto. Sabia também que não estava como “um peixe na água”, porque uma coisa é estar dentro do departamento de uma empresa e ter essa responsabilidade, outra coisa é assumir essa e outras responsabilidades.
Mesmo com as pessoas todas que fomos contratando o bom senso e o grande espírito de equipa que existe faz com que as coisas aconteçam. Esse é o nosso grande segredo: a inteligência emocional da equipa que faz com que os projetos aconteçam.
Mas sim o desafio foi enorme, especialmente nos primeiros dois anos em que tudo era novo e tudo era rápido, por uma razão simples: arrancamos em 2010 e no espaço de dois/três anos nasceram mais três/quatro navios.
Que momentos é que recordaria deste anos na MSC?
Um primeiro momento que me recordo foi voltar de avião de Genebra, onde assinei o contrato com a empresa, aterrar em Lisboa com o contrato na mão e pensar: agora sou só eu, e de imediato priorizar os passos seguintes – escritório, pessoas, sendo que tudo tem de estar pronto no espaço de um mês e meio com a brochura cá fora. Estaria entre 3 e 4 de novembro, e a 15 de dezembro a brochura estava pronta e impressa, toda traduzida, com cinco pessoas a trabalhar. Esse foi o mês mais intenso que alguma vez vivi na minha vida profissional. Foi trabalhar 14 a 16 horas por dia, verificar sítios, fazer contratos com as agências, tudo ao mesmo tempo.
Outro grande momento foi quando atingimos a liderança de mercado em Portugal. Quando arrancamos em 2010 e fazemos o primeiro roadshow e a primeira Bolsa de Turismo de Lisboa olhavam para a MSC como algo novo que apareceu no mercado e que até eram simpáticos. Em 2014 atingimos, pela primeira vez, a liderança e aí sentimos realmente que os últimos três/quatro anos tinham sido muito intensos, mas que toda a equipa estava supersatisfeita.
A sensação que tenho é que cada vitória que exista devemos celebrar durante 10 segundos e partir imediatamente para o próximo desafio. A sensação que tenho é que tenho uma ponte atrás de mim que está sempre a cair e ando a correr para que eu não caia com a ponte. É uma coisa que está cá dentro. Enquanto isso acontecer acho que é ótimo, enquanto eu não perca a embalagem. Obviamente que isto não se faz sozinho.
Quem é Eduardo Cabrita?
Eu não ligo aos signos mas há uns dias estava alguém a dizer que vejo sempre a vida como um filme, como um Sagitário. Realmente pensei que isso era verdade. Não posso dizer que não sou uma pessoa ambiciosa; sou uma pessoa otimista por natureza, sou amigo do meu amigo. A sensação que tenho sempre é que levo para trás praticamente todas as questões positivas e não negativas. Sinto sempre a minha vida profissional ou pessoal como uma viagem.
É viciado em trabalho?
Já fui mais do que sou. Hoje em dia consigo fazer, penso eu, mais ou menos bem a distinção e o balizamento de estar a usufruir de períodos de lazer. Mesmo ao fim-de-semana, em que a tentação é grande em ir espreitar no telemóvel o que se passa, tento-me retrair um bocado, sabendo que se há algum assunto que não tenha ficado, é mais forte do que eu… (risos) Mas isso também está relacionado com a empresa em Portugal ter tomado uma dimensão suficiente em que as pessoas estão nos lugares certos em determinados departamentos e já não dependem essencialmente de uma opinião que eu precise de dar, só em situações limites. Também sei, por outro lado, que tudo o que me toca são os problemas, mas isso faz parte das responsabilidades.
Como é o seu dia-a-dia na empresa?
Os primeiros dois/três anos foram uma loucura em viagens. Hoje as tecnologias ajudam, as “conference calls” permitem reuniões com vários países ao mesmo tempo, aligeirando os custos também. Por outro lado, isso também nos dá a perspetiva de que podemos atuar muito mais facilmente no mercado. Perdemos o gozo de poder viajar e de um contacto diferente, mas no essencial cada vez que é necessário fazer reuniões presenciais fazemo-las.
Dentro de Portugal viajo o suficiente, sendo que o departamento comercial é que está com esta tarefa. Se bem que costumamos dizer: “se os nossos hotéis estivessem em terra paradinhos, isto era tudo eventualmente muito mais fácil”. Mas como todos os dias estão a andar, as coisas não são assim tão lineares.
Quando chego ao escritório cumprimento toda a gente, percebo de imediato, porque já todos estamos alinhados, se alguma coisa está pendente de resolução, pois se o há tem de ser resolvido naquele momento. Procuro estes detalhes. Depois começo a verificar emails e procuro mais ou menos dar uma olhadela pelas notícias do turismo. A minha parte da manhã passa por não tomar decisões estratégicas, resolver o que ficou pendente do dia anterior para controlar os processos, e resolver urgências, seja em que departamento for, para tentarmos que a parte da tarde seja estratégica, para pensar nos próximos dois/quatro meses, onde podemos atuar a determinados níveis.
Os cruzeiros são hoje uma paixão?
Sempre pensei que gostaria de trabalhar com o mar. O facto é que até agora tem sido uma constante. Acho que os cruzeiros acabam por ser uma grande paixão. Estamos hoje a viver dentro de um setor que está numa efusiva evolução. As coisas evoluíram num espaço de 10 anos de uma forma abismal. É isso que faz com que este gozo exista. É um mundo que está em completa mutação e que é de pessoas para pessoas. Porque o passageiro está no centro e estão um inúmero conjunto de pessoas a ajudá-lo a ter um conjunto de experiências. Tenho sorte por poder fazer aquilo de que gosto dentro do setor onde estou, principalmente porque tem uma ligação ao mar.
Qual o seu navio preferido?
Fiquei deslumbrado com o Meraviglia. É óbvio que, desde que estou na MSC, cada navio que nasceu é sempre um deslumbramento porque é um navio com novas características, mais bem pensado. Relativamente a este último navio há um novo patamar, especialmente pelo espaço que existe dentro do navio. Sabemos à partida que os portos não vão crescer em comprimento. Sendo assim os navios para crescerem de alguma forma ou será em altura, o que é difícil por causa das pontes, ou em largura, que é o que está a acontecer. O resultado disto é que todo o espaço, especialmente a parte central do navio, não nos indica que estamos dentro de um navio, e é esse o gozo que dá.
Esta é a 2ª Parte da Grande Entrevista publicada na Edição 306 da Ambitur.