#SmartandGreenTourism: “A parte difícil é a mudança de mentalidade, olhar o que fazemos e começar de novo com uma nova perspetiva”

Luís Araújo, presidente do Turismo de Portugal e moderador do painel; Sofia Santos, CEO da Systemic; Roberta Medina; e Luís Neves, CEO da GeSI.

A Ambitur, em colaboração com a Fundação AIP, realizou a Conferência “Smart and Green Tourism” no âmbito da BTL. Roberta Medina, vice-presidente do Rock in Rio, foi uma das oradoras do primeiro painel, dedicado ao tema “Como deve o turismo caminhar na busca de uma maior sustentabilidade”, e falou da sua experiência à frente deste festival. E recorda que o tema da sustentabilidade na história do Rock in Rio começou olhando para três pilares – económico, social e ambiental, sendo que o ambiente foi o último a ter sido considerado, já em 2006.

“Tudo começa com uma decisão pessoal e aí, pessoalmente, começa-se a influenciar a empresa”, lembra Roberta Medina. Hoje são já 15 anos em que o Rock in Rio é neutro em carbono, um caminho que não teve volta e que passou por uma série de decisões não financeiras. E os desafios foram grandes, admite a empresária, até porque na altura não existiam, no mercado, soluções para o evento ser mais sustentável. Mas não tem dúvidas de que “a parte difícil é a mudança de mentalidade, olhar o que fazemos e começar de novo com uma nova perspetiva”.

A verdade é que o Rock in Rio é, desde 2013, um evento certificado pela ISO 20121 – Eventos Sustentáveis, sendo “o primeiro grande evento de música no mundo a ser certificado”, sublinha a oradora, que esclarece que desde então a evolução tem sido enorme a nível das tomadas de decisão, não só do lado ambiental, mas também social e económico. “Quando partimos para a ISO já tínhamos uma série de iniciativas e alguma maturidade de ações”, explica, acrescentando que “a partir do momento que nos comprometemos com a ISO, enquanto organização, ninguém mais pôde ficar de fora da conversa. A ISO é um processo burocrático mais foi essencial para começarmos a dar saltos mais importantes em relação aos resultados”.

[blockquote style=”1″]”a partir do momento que nos comprometemos com a ISO, enquanto organização, ninguém mais pôde ficar de fora da conversa. A ISO é um processo burocrático mais foi essencial para começarmos a dar saltos mais importantes em relação aos resultados”[/blockquote]

Hoje, diz Roberta Medina “vivemos uma exigência que vem de fora para dentro, um momento absolutamente delicioso no qual as empresas já não podem fugir”. Isto porque, prossegue a vice-presidente do Rock in Rio, “chega um momento em que vemos a equipa a exigir da empresa, o cliente a exigir da empresa, e aí não precisamos mais de fazer força para contar uma história”.

Mas oradora faz questão de evocar que na altura em que o Rock in Rio quis fazer a diferença não havia uma cadeia produtiva organizada, o que dificultou todo o processo e o investimento financeiro. “Em Portugal, isso é ainda mais notório, ninguém fala com ninguém, cada um defende o seu, é uma visão limitada e absolutamente redutora”. É que se houver um trabalho em rede tudo fica mais simples.

[blockquote style=”1″]”Temos tentado influenciar o mercado, e penso que temos conseguido, mostrando que a marca fica mais forte, e o consumidor reconhece”[/blockquote]

Roberta Medina dá o exemplo de algumas iniciativas que tem levado a cabo no Rock in Rio e informa que está prestes a lançar, em conjunto com a cidade de Lisboa e a cidade do Rio de Janeiro, uma cartilha para eventos sustentáveis, “partilhando a nossa experiência”. “Temos tentado influenciar o mercado, e penso que temos conseguido, mostrando que a marca fica mais forte, e o consumidor reconhece”, diz, recordando o relatório de ESG que acabam de fazer com a Deloitte no Brasil, por exemplo, e lembrando que, no final do ano passado, o Rock in Rio tornou públicas as metas para 2030.

Roberta Medina acredita que “onde sentimos que o Rock in Rio faz mais a diferença, falando do mercado português, é através dos patrocinadores”. E garante que foi uma “grande diferença” que o Rock in Rio provocou no mercado ao trazer um modelo de negócio que potencializa marcas de consumo e aproxima a relação das grandes marcas de consumo com o consumidor final. “E através dos patrocinadores essa mudança tem chegado na cadeia produtiva como um todo e na indústria”, assegura a oradora.

Quanto ao trabalho em rede, neste setor a dificuldade é idêntica a outros, admite a empresária. Mas a verdade é que, em janeiro de 2020, foi feito um grande movimento nesse sentido, inédito na indústria, de anunciar uma iniciativa entre todos os grandes festivais do país, convidando o público a tomar iniciativas pela sustentabilidade no seu dia-a-dia. “Era uma campanha coletiva”, diz Roberta Medina, que não hesita em afirmar que “há trabalho a ser feito em cadeia”.

A importância do trabalho em rede

Também Sofia Santos, CEO da Systemic, e outra das oradoras deste painel liderado por Luís Araújo, presidente do Turismo de Portugal, reconhece que “trabalhando em rede se conseguem fazer mais coisas e mais rapidamente”. E a verdade é que há países em que isso é mais fácil de fazer. Em Portugal “é de facto muito difícil”. Para a gestora, “faz muito mais sentido empresas concorrentes a dada altura juntarem-se para perceber como é que se consegue fazer tudo em simultâneo, e às vezes são mudanças setoriais que têm de ser feitas, mas se fizerem todos ao mesmo tempo custa muito menos e o mercado reage de uma forma muito melhor”.

[blockquote style=”1″]”qualquer empresa que tenha os temas da sustentabilidade em cima da mesa para ser coerente tem de ter critérios de sustentabilidade quando estão selecionados fornecedores”[/blockquote]

No que diz respeito aos fornecedores, por exemplo, “qualquer empresa que tenha os temas da sustentabilidade em cima da mesa para ser coerente tem de ter critérios de sustentabilidade quando estão selecionados fornecedores”. É importante que as empresas do mesmo setor se juntem e ajudem os fornecedores a avançarem com aquilo que precisam de fazer para conseguir responder aos critérios, porque aí “toda a gente ganha, incluindo as grandes empresas, porque conseguem responder às exigências e conseguem ter a sua cadeira de valor”.

Sofia Santos indica que há cerca de quatro semanas saiu uma nova proposta diretiva dedicado ao tema da “corporate sustainability due dilligence”, que vem sugerir que as grandes empresas devem ajudar as PME a caminhar neste sentido. “Aquilo que deveria ser uma ação natural das empresas, porque as empresas são feitas de pessoas, está a ser transformado em diretiva, ao ponto de se colocar na diretiva que se está a trazer aqui o conceito de duty of care dos administradores, ou seja, que os administradores devem ter o dever de cuidar dos stakeholders para incluir os temas dos direitos humanos e ambientais ao longo da sua cadeira de valor e, como consequência, devem ajudar as PME a também caminharem neste sentido”, esclarece a oradora.

E recorda que já empresas a fazerem este trabalho, como o setor da pasta e papel pois está muito dependente da madeira florestal sustentável, cofinanciando mesmo os seus fornecedores para conseguirem ter a madeira certificada do ponto de vista da sustentabilidade.

Luís Neves, CEO da GeSI, também orador neste painel da Conferência Smart and Green Tourism, lembra que o setor das telecomunicações já tem uma ferramenta nesse sentido há 20 anos – Electronic Tool for Accountable Supply Chains (E-TASC). “Foi a primeira indústria a desenvolver isto, trabalhamos em rede, temos mais de 20 mil fábricas auditadas de acordo com essa ferramenta”, esclarece. Criticando que a Comissão Europeia veio “com 20 anos de atraso”, o gestor garante que se “trabalharmos em rede, reduzimos os custos para termos melhores resultados”.

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