As novas adegas de Portugal

Há quem diga que o vinho melhora com a idade mas isso nem sempre é verdade. E o mesmo pode aplicar-se às adegas onde o vinho é produzido. Num país de longa tradição vinícola, onde a reputação dos vinhos é inquestionável e que, segundo a associação ViniPortugal, ocupa a 12ª posição enquanto produtor de vinho a nível mundial, a realidade dos locais onde o vinho é armazenado em garrafas, barris ou barricas alterou-se. Se anteriormente era comum encontrarmos caves escuras que não despertavam qualquer interesse visual, hoje Portugal conta já com inúmeras adegas que são, por si próprias, razões mais do que suficientes para atrair visitantes e turistas. Ambitur dá-lhe a conhecer algumas das mais modernas adegas nacionais, do norte ao sul do país, levando-o por um roteiro enoturístico pelas melhores regiões vinícolas do país.

Nuno Bicó
Nuno Bicó

Começamos pelo Alentejo, uma das maiores regiões de produção de vinho em Portugal, região quente e seca de planícies extensas apenas interrompidas por pequenos montes. E é na Vidigueira, distrito de Beja, na Herdade do Moinho Branco, que se situa a Adega da Ribafreixo Wines, um projeto que nasceu em 2007 e que assistiu à inauguração da nova adega no Verão de 2012. “A ideia inicial sempre foi ter um espaço onde pudéssemos ser auto-suficientes em todas as áreas aliadas ao vinho mas também ter uma adega que pudesse ter uma forte componente Enoturística”, explica Nuno Bicó, diretor de Operações da empresa. E com sucesso, já que em 2015 obteve a distinção de Melhor Enoturismo do Alentejo.

Adega Ribafreixo WinesEntre as extensas vinhas da Ribafreixo Wines, no ponto mais alto da herdade, a adega não deixa ninguém indiferente, com as suas linhas contemporâneas, área ampla e iluminada. São quatro mil m2 equipados com as mais avançadas tecnologias e metodologias para a produção e embalagem de vinhos, destacando-se as barricas de carvalho, as cubas de inox, as prensas especializadas de vácuo, a linha de engarrafamento, o laboratório, a linha de rotulagem ou as câmaras frigoríficas, entre outras. A adega tem pois capacidade para produzir mais de 1.000,000 garrafas e tem, neste momento, quatro gamas de vinho – Pato Frio, Gáudio, Barrancôa e Connections. A construção bioclimática, o reaproveitamento de energia, da luz natural e da força da gravidade em várias operações asseguram ainda a sustentabilidade energética desta moderna adega, que produz brancos, tintos e rosés.
A funcionar todos os dias úteis das 9h às 18h, a adega está disponível para ser visitada de 2ª feira a domingo, com marcação prévia. Além de aprender mais acerca dos vinhos aqui produzidos, pode degustar “uma excelente refeição com vinhos de topo e pode ainda levar para casa, a preços convidativos, os seus vinhos preferidos”, sugere Nuno Bicó.

Rita Nabeiro
Rita Nabeiro

Uma referência arquitetónica
Também no Alentejo, em Campo Maior, numa área de 350 ha de montado de azinho, galerias ribeirinhas e campos agrícolas, podemos visitar a Adega Mayor, já uma referência arquitetónica a nível mundial, tendo sido a primeira adega de autor a ser pensada e construída em Portugal, sublinha Rita Nabeiro, diretora-geral. E explica que esta foi uma obra idealizada pelo avô, Rui Nabeiro, e desenhada pelo arquiteto Álvaro Siza Vieira que se inspirou logo na primeira visita ao terreno. Inaugurada em 2007, com cerca de 100 ha de vinhas plantadas na Herdade das Argamassas e na Herdade da Godinha, a sua proximidade à serra de São Mamede, os solos graníticos e o clima temperado contribuem para o caráter único dos vinhos que aqui nascem.

A ideia foi manter a identidade da terra e das gentes da região, consolidando uma personalidade com fortes traços de contemporaneidade e atualidade. O projeto da adega baseia-se num retângulo de 40×120 metros, um volume horizontal caiado a branco, assente na cavidade existente e ergue-se em muros de nove metros de altura. São dois pisos, sendo que o último está reservado a uma vertente mais social e pública do vinho, com a sala de provas que se abre para um terraço panorâmico com relvado e um espelho de água central encabeçado por um painel esculpido em mármore onde as silhuetas de uma chávena de café, de um copo de vinho e de uma garrafa se sobrepõem.

Adega MayorA aposta passa por castas portuguesas tradicionais, de onde se destacam Touriga Nacional, Trincadeira, Castelão, Antão Vaz, Arinto e Verdelho. “Há também outras castas que elegemos para integrarem a personalidade dos vinhos da Adega Mayor, pela sua excelente adaptação à região, como é o caso das castas Syrah, Alicante Bouschet e Petit Verdot, consideradas castas quase portuguesas. É deste equilíbrio que resultam vinhos frescos, bem estruturados e elegantes”, acrescenta Rita Nabeiro.

A adega pode ser visitada de segunda a sexta-feira, das 9h às 18h, e aos sábados a partir das 10h. O visitante pode experimentar as provas de vinho comentadas, participar das vindimas, passeios pedestres, piqueniques no campo, passeios de balão, entre outros. “Tudo é pensado ao pormenor para proporcionar aos visitantes uma experiência ‘mayor’ no Alentejo”, frisa Rita Nabeiro. O que valeu à Adega Mayor a distinção de Melhor Enoturismo, em 2014, pelo Turismo do Alentejo.

Luís Louro
Luís Louro

Linhas simples e modernas
Em Estremoz surgiu, em 2006, a Adega do Monte Branco, um projeto do produtor e enólogo Luís Louro que resulta da vontade de produzir vinhos modernos e de qualidade a partir de castas maioritariamente portuguesas. O edifício, da autoria de Tomás Ramos e Bruno Clark da ARC Arquitetos, aposta numa linha arquitetónica simples mas moderna. De um antigo armazém em chapas de zinco nasce então esta adega, com a componente de vinificação, escritórios, cave e turismo, numa disposição em forma de “L”.

A Adega do Monte Branco, que produz vinhos brancos, tintos e rosés das marcas Alento e Monte Branco, funciona das 8h às 17h e está aberta a visitas, provas de vinhos com produtos regionais e, em breve, refeições com marcação, para grupos de seis a 16 pessoas.

 

Pedro Rocim
Pedro Rocim

Ainda no Alentejo, entre a Vidigueira e Cuba, encontramos a Herdade do Rocim, cujo projeto arquitetónico é de Carlos Vitorino. Com cerca de 120 ha, entre os quais 70 de vinha – 53 ha de castas tintas e 17 ha de castas brancas – e 10 de olival, esta herdade, adquirida em 2000 pela Movicortes SA, alia a produção de vinho à qualidade estética da sua arquitetura e funciona como elemento promocional para a requalificação da região, explica Pedro Ribeiro, diretor geral. Aqui encontramos castas como Aragonez, Trincadeira, Syrah, Touriga Nacional e Alicante Bouschet nos tintos e Antão Vaz, Arinto, Verdelho e Alvarinho nos brancos. As vinhas da Herdade do Rocim estão atualmente em processo de reconversão para viticultura biológica.

Bernardo Alves
Bernardo Alves

Grupo Riberalves investe em Torres Vedras
Na Região de Vinhos de Lisboa, mais precisamente em Torres Vedras, o Grupo Riberalves investiu cerca de cinco milhões de euros numa nova área de negócio: a produção de vinhos e o enoturismo. A AdegaMãe abriu portas em 2011, sendo a concretização de um sonho de uma família muito ligada à terra e à região, explica Bernardo Alves, diretor geral. Aqui não só se produzem “vinhos de excelência, vinhos originais e genuínos representativos das condições únicas existentes na região, muito marcada por uma extraordinária influência do clima atlântico, como se ambiciona poder partilhar esses vinhos com as pessoas”, indica o responsável. E neste ponto a arquitetura da adega, com assinatura de Pedro Mateus, é decisiva, tendo sido desenhada para proporcionar uma verdadeira experiencia de enoturismo e acolher as melhores e mais modernas práticas produtivas. O arquiteto inspirou-se na paisagem circundante e assim nasceu a AdegaMãe, como uma forma pura, um prisma retangular encaixado na encosta, “uma espécie de moldura gigante que permite um olhar privilegiado para as vinhas e a natureza circundante”, detalha Bernardo Alves. No fundo, a adega funciona como um miradouro mas cumpre o objetivo de ser uma infra-estrutura otimizada para a produção de 1,5 milhões de litros de vinho por ano., contando com a marca Dory como a principal gama de vinhos comercializados, além de vinhos varietais e da marca Pinta Negra.

AdegaMãe
AdegaMãe

O nome AdegaMãe é uma homenagem da família Alves à sua matriarca, Manuela Alves, e o conceito de “mãe” foi escolhido por ser um espaço de nascimento e criação, no qual se pretende potenciar as melhores uvas e fazer nascer os vinhos mais genuínos. E os resultados estão à vista, tendo sido considerada, em 2015, como Empresa do Ano no setor. A AdegaMãe está aberta todos os dias, a partir das 9h até às 18h, e aqui pode efetuar visitas com prova de vinhos ou mesmo desfrutar de uma refeição (brunch, lanche ou almoço/jantar) onde os vinhos são harmonizados com o bacalhau Riberalves.

 

João Ferreira, Francisco Ferreira e Francisco Olazábal
João Ferreira, Francisco Ferreira e Francisco Olazábal

Adegas do Norte
De Lisboa passamos para Norte do país onde encontramos, no Peso da Régua, a Quinta do Vallado, que conta com uma nova adega desde finais de 2009, em substituição da antiga, que datava dos anos 90. Num projeto de arquitetura liderado pelo arquiteto portuense Francisco Vieira de Campos, do Atelier Menos é Mais, nasce uma adega vanguardista que procura traduzir o carácter contemporâneo do Novo Douro, resume João Ferreira Álvares Ribeiro, CEO da empresa. O objetivo era incorporar a mais avançada tecnologia numa construção moderna, “fazendo deste projecto um dos locais de visita obrigatória no Douro”, sublinha o responsável. Para garantir uma maior qualidade dos vinhos, minimizando o impacto da deslocação sobre as uvas, o processo desencadeia-se essencialmente por gravidade. “A concepção de uma adega que funciona por gravidade obriga ao entendimento de todo o sistema produtivo e a um grande rigor, disciplina e restrição na implantação das cotas dos edifícios”, recorda João Ribeiro.

Quinta do Vallado
Quinta do Vallado

A pedra de xisto marca o exterior do edifício, que se destaca pela forma paralelepipédica, de ângulos apertados. No interior é o betão que reina, com um acabamento bujardado. A entrada faz-se por uma ampla sala de provas, com luz natural, onde está também a loja. O circuito da visita, disponível todos os dias às 11h30 e às 15h, percorre primeiro o exterior, onde os visitantes podem ver de perto uma parcela de vinhos plantada com algumas das castas mais representativas do Douro e da Quinta do Vallado. O percurso reencontra-se com o edifício na zona da receção das uvas, continuando pelo interior da adega. Depois de uma passagem pelos lagares graníticos onde se realiza a tradicional pisa a pé, a visita prossegue para a cave de barricas semi-subterrânea, com capacidade para mil barricas, e termina com uma prova de cinco vinhos. Recorde-se que a Quinta do Vallado produz hoje uma gama de mais de 20 vinhos, entre brancos, rosés, tintos e Vinhos do Porto.

Equipa da Adega Gran Cruz
Equipa da Adega Gran Cruz

Também a Norte, no concelho de Alijó, o arquiteto Alexandre Burmester, do gabinete A. Burmester Arquitetos Associados, projetou a Adega Gran Cruz, provavelmente a mais recente adega do país. Aqui as opções de desenho e de construção, para além de responderem a elevadas exigências técnicas de vinificação e de estágio de vinhos do Douro e do Porto, não deixaram de ter em conta os aspetos de integração paisagística, consentâneos com a excelência dos vinhos da região. Este é um exemplo de recuperação de uma área paisagisticamente degradada, lembra Jorge Dias, diretor-geral do Grupo Gran Cruz, e dá continuidade à natureza do lugar. Aproveitando um acidente do terreno, criaram-se diferentes níveis que permitem recorrer à gravidade em diversos processos e vinificar nas melhores condições a produção de cerca de um milhar de viticultores. Trata-se de uma adega futurista cuja imagem acaba por ser o elemento diferenciador inicial que mais marca mas o responsável garante que, após uma visita, “é a tecnicidade e racionalidade dos processos utilizados que a arquitetura soube integrar no edifício e este na paisagem” que ficam na memória.
O grande objetivo desta nova adega do Grupo Gran Cruz é a produção de “volumes significativos de vinhos do Porto e do Douro, nas melhores condições possíveis, recorrendo às melhores tecnologias disponíveis no mercado internacional, e melhor controlar todas as etapas do processo produtivo, de forma a garantir o aprovisionamento dos vinhos, em novos patamares de excelência, necessários à consolidação das suas marcas Cruz, Dalva, Presidential e Quinta de Ventozelo nos mercados”, explica Jorge Dias. Na verdade são duas adegas, uma para produzir cerca de 63.000 hectolitros de vinhos do Porto e do Douro, e outra, mais pequena, para produzir as categorias especiais daqueles vinhos, com capacidade para 6.000 hectolitros.

Esta reportagem pode ser lida na íntegra na Edição 293 da Ambitur.