O Alentejo é o destino do mês de junho na Ambitur.pt. Num roteiro de cinco dias pela região do baixo, norte e centro deste vasto território, pudemos conhecer melhor as histórias e “estórias” de projetos, imóveis, centros interpretativos, lugares de “culto” aos vinhos e à boa gastronomia alentejanos, sempre contadas pelos próprios, por quem ali vive e melhor do que ninguém sabe do que está a falar.

As Portas da Serra de São Mamede fazem parte de um plano de cogestão que inclui os quatro municípios que integram a área protegida do seu Parque: Portalegre, Marvão, Castelo de Vide e Arronches. Fomos até ao Centro Interpretativo da Quinta da Saúde, em Portalegre, entreabrir uma das portas, e demos com um lagarto-de-água, um corso, uma gineta, um texugo, mas não só. Descobrimos ainda através da Rota das Cascatas, o Pego do Inferno ou o Monte Sete. Há toda uma biodiversidade específica para conhecer neste cruzamento morfológico, onde os climas e os territórios se descontinuam, trazendo até si uma flora e fauna de diferentes habitats.
O Centro Interpretativo da Quinta da Saúde, em Portalegre, quer ser uma das Portas de Entrada no Parque Natural da Serra de São Mamede, com o objetivo de direcionar os visitantes para um melhor conhecimento da biodiversidade existente no parque. Este é um espaço recentemente remodelado pela autarquia e encontra-se inserido na própria serra. Dos quatro concelhos que fazem parte do Parque Natural cada um escolheu a abordagem com que mais se identificava, Marvão com a água, Castelo de Vide o património, Arronches a arqueologia e Portalegre a terra e a água. Cada um avançará também com a sua própria porta, que visa dar aos visitantes informação e circuitos sobre a melhor forma de conhecerem a fauna, flora ou outros elementos característicos deste Parque Natural que abrange 56 mil hectares.
Mas o que se encontra nesta porta de entrada do Centro Interpretativo da Quinta da Saúde? “Para este espaço, propriamente dito, houve a preocupação de ter materiais digitais e também material fotográfico e audiovisual, portanto, temos sons captados no nosso parque, fotografias com fauna, flora e paisagens – todas tiradas por um fotógrafo da especialidade -, para abrir o apetite aos visitantes”, indica-nos a Vereadora da Cultura da Câmara Municipal de Portalegre, Laura Galão.
Este centro está dividido em dois pequenos espaços e visam interpretar a fauna, flora, paisagem e geomorfologia da área protegida, num sítio onde também é um centro interpretativo do complexo turístico da Quinta da Saúde. Ou seja, uma fusão entre a valência turística com a patrimonial, nomeadamente cultural e natural. Destaca a arquiteta Ana Santos, Câmara Municipal de Portalegre, que “é muito importante para nós, enquanto município, a humanização do território. Porque o parque não pode ser o tipo das Berlengas, que é uma reserva integral completamente ausente em termos de humanização, de revivência, mesmo da oportunidade de negócio, mas respeitando na íntegra tudo quanto é valor, valor existente. Por isso é que temos, por um lado, os produtores que tiram partido da fruta, do mel, de tudo e mais alguma coisa que existe disponível na área protegida e, por outro lado, temos um espaço expositivo e interativo, sobretudo quanto é natureza, ou pelo menos em termos de importância, com uma exposição do portalegrense, que é o autor dos vídeos e das fotografias que vocês vão ver aqui nesta sala”. E é esse conjunto, no fundo, de valores que a autarquia quer aqui transmitir, através deste espaço que tem servido também para a educação ambiental para as escolas. Este parque está, desde 2020, sob uma comissão de cogestão, que integra não só os municípios, como o ICNF, Quercus e o Instituto Politécnico de Portalegre, “com parceiros externos que contribuem e que podem dar contributos para a valorização e promoção do parque, que é aquilo que todos pretendemos. Portanto, é desta, no fundo, é desta junção de vários atores no território que nós vamos construindo e caminhando e fazendo, mais uma vez, valorizar o nosso património natural”, acrescenta Ana Santos.
Contextualiza Laura Galão, que neste projeto, uma candidatura ao Fundo Ambiental, “aproveitámos também para melhorar acessibilidades a geossítios e a zonas de interesse, portanto, melhorámos a acessibilidade a três cascatas, criámos parques de merendas, criámos sinalética interpretativa e de orientação, aproveitamos aquilo que nos foi possível para valorizar o parque. No fundo, nós temos uma grande consciência, tanto da importância que é a preservação de tudo o que é a biodiversidade do parque e o ICNF trabalha em parceria connosco, mas, por outro lado, também temos noção daquilo que é o potencial turístico que o parque nos pode oferecer em termos de território”.
Grande Rota das Cascatas
O município de Portalegre é aquele que tem maior representatividade dentro do Parque Natural da Serra de São Mamede. Neste contexto, tendo escolhido uma abordagem de terra e água, resolveu valorizar as cascatas e com esse mote criou a porta do parque. “Esta é a nossa porta do parque, aproveitamos este edifício, criámos também aqui uma zona de promoção de produtos regionais, portanto, é um espaço que vai estar aberto para desenvolvimento económico, está aberto aos nossos produtores, a toda a comunidade que queira vir aqui fazer exposição de produtos que de alguma forma estejam relacionados com o parque da Serra de São Mamede”, destaca a Vereadora. Questionada se esta fase do projeto está concluída, a responsável olha já para o futuro: “Muito mais para fazer. Posso lhe dizer que nós temos cerca de 10 a 12 percursos no concelho de Portalegre. Os percursos pedestres, a maior parte deles, se calhar 80%, são em território de parque. E, portanto, há muito ainda a fazer”.
Este projeto, que envolveu a porta do parque e a valorização das acessibilidades às cascatas, incidiu sobre uma rota que é a Grande Rota das Cascatas, que tem 32 quilómetros. O projeto envolveu um mirante e passadiços de acesso a diversos locais. “Tivemos a preocupação de as infraestruturas que colocámos serem o menos intrusivas possíveis e com a menor visibilidade. Só mesmo para podermos usufruir da paisagem. Não quisemos fazer quilómetros de passadiços, quisemos fazer o mínimo possível para mostrar a natureza, mas para permitir a acessibilidade que antes não tinha. Todas estas cascatas que nós aqui vemos, a maior parte delas não conseguimos aceder totalmente pelos meios que existiam. E agora sim, temos contadores de visitantes, temos tido agradáveis surpresas com o número de visitantes na grande rota, mas obviamente este projeto terá de ter continuidade e teremos que encontrar outros meios também de financiamento para lhe dar seguimento. Mas esta questão aqui, eu acho que é importante que seja, no fundo, conjugarmos a proteção da natureza em que o ICNF, no fundo, é aqui a grande força deste projeto, deste propósito”, complementa a Vereadora.
Para além da parte lúdica, a arquiteta Ana Santos explica porque a Grande Rota das Cascatas pode ter outros interesses? Morfologiamente falamos de uma área geográfica que envolve a continuidade e término do “território da Beira”, atlântico, e a outra parte, do sul, a planície: “Numa só Grande Rota com 32 quilómetros, nós conseguimos ver os habitats que existem na «Beira», a nível da flora, dos maciços arbóreos, repostivos e herbáceos.Com a valorização que os municípios estão a querer dar ao parque, julgo que temos aqui motivos de crescimento sustentável para os apoiadores do parque. Mas, por outro lado, na outra parte do sul da Grande Rota, temos um Alentejo característico de planície, de montado, da agropecuária. Há uma fusão num só percurso, dando-lhes as matérias”. Este é pois o mote da exposição anteriormente referida, que está exposta no Centro Interpretativo da Quinta da Saúde, que é dedicada então principalmente à água e terra, com imagens das cascatas da Grande Rota, mas também dos habitats, ribeirinhos, mas também da fauna. Curtos vídeos promocionais, mostram além da parte cultural um conjunto de vistas de uma pequena planície. Depois, para a zona Norte, destaca-se a cascata Monte Sete, que é Beira pura e dura, não o Alentejo típico; territórios acidentados, com vales muito apertados e com vegetação que também não é típica do Alentejo.
Luís Grilo, Chefe da Divisão de Áreas Classificadas do ICNF, indica-nos que “a biodiversidade é dada (na Serra de São Mamede) porque nós aqui a oeste somos o principal, somos os primeiros, digamos, a primeira serra a apanhar a humidade. Portanto, temos clima atlântico, depois temos o clima mediterrâneo, de todo o Alentejo é óbvio, e depois ainda temos uma influência de toda esta zona de Espanha, que é o clima continental. Depois temos aqui neste sítio o ponto mais alto a sul do Tejo, de 1.025 metros”. Portanto, temos aqui um conjunto de situações que acaba por proporcionar vistas de azinheiras e sobreiros, zonas com outras espécies, incluindo castanheiros, amieiros, que normalmente têm água permanente, os carvalhos, que só existem pela humidade ainda bastante interessante, e depois a existência dos granitos e os xistos. “Não quer dizer que não existam outras coisas, mas tudo isto leva a que tenhamos anfíbios em que esta zona é o limite deles vindos do norte, mas que chegam até aqui pela altitude, e temos espécies tipicamente do sul, mas que chegam até aqui, porque também têm condições para estarem aqui. Temos aqui um microclima em termos não só vegetação, e obviamente se a vegetação é diferente, a fauna vai ser distinta, portanto temos aqui um bocadinho de tudo”, acrescenta.
Em termos de geologia o responsável também valoriza este território, até para aulas de geologia dos geossítios. Não só o mais emblemático é o Castelo de Vide na sua falha geológica, mas todas as cristas quartzíticas que têm um alinhamento que já vêm da Beira Baixa e que seguem para Espanha.
Em termos de fauna nesta região podem ver-se principalmente animais que gostam de água, anfíbios como o lagarto-de-água ou o sapo-parteiro. Ao nível de mamíferos o gato bravo, se houver alguma sorte, pois é uma raridade e muito esquivo, para além do corso, gineta, texugo ou saca rabos. Existe nesta região também uma das maiores colónias da Europa, sobretudo em época de reprodução de algumas espécies de morcegos. “É um sítio que está praticamente fechado, é dentro de uma propriedade, está vedada, não é visitável, nem convém a ser visitada. Muito menos nesta altura, que é uma altura de reprodução. Nós de volta em volta vamos lá para confirmar as espécies, confirmar o tamanho da população, se há grandes oscilações. Temos uma equipe a nível nacional que faz isso, que faz essa monitorização”, indica Luís Grilo.
A Grande Rota das Cascatas envolve variados percursos a acessíveis de viatura, bicicleta, moto, entre outros. Há local onde deixar a viatura, fazendo-se parte do caminho a pé, sem ser excessivo. Entre as cascatas a visitar destacamos a do Pego do Inferno, Cabroeira e de Monte Sete. Os percursos estão todos registados, sinalizados e documentados, quer digitalmente, quer em versão papel, havendo também um contrato de manutenção dos percursos homologado, estando certificados.
Refira-se também que um dos projetos futuros da região incidirá sobre a observação noturna. Revela a vereadora que esteve na reunião de direção da Associação dos Municípios da Serra de São Mamede onde se abordou um projeto novo de observação noturna, dark sky. “Nós vamos aderir a esse projeto e pensamos que sem beliscar absolutamente nada para aquilo que é a biodiversidade do parque e o seu estado natural podemos ter aqui uma outra oferta turística também muito interessante, que é o astro-turismo. Temos pouco ruído em termos de iluminação pública. Temos zonas muito boas na Serra. E, portanto, temos muitos projetos que, se conseguirmos dar seguimento, podem aqui dar-nos um grande incremento. A dinamização do parque, neste ponto de vista, obviamente, turístico. Sim, claro. Sempre respeitando a natureza, porque essa é uma premissa que nunca podemos deixar de ter em conta”.





















































