A Ambitur.pt tem estado ao lado do setor da Hotelaria em Portugal, seguindo tendências, anunciando novidades, acompanhando mudanças. Hoje trazemos-lhe mais uma rubrica, desta feita procurando a visão das mulheres que escolheram o mundo dos hotéis para o seu percurso profissional. Como é ser mulher nesta indústria? É o que procuramos saber com “Hotelaria no Feminino”. Falamos hoje com Catarina Biscaia, marketing manager no Viceroy at Ombria Algarve, que considera que a presença feminina em cargos de liderança deve ser encarada como uma oportunidade para os modelos de liderança serem repensados.
É difícil ser mulher na hotelaria em Portugal nos dias de hoje? Observa alguma evolução desde o seu primeiro emprego no setor?
O meu primeiro emprego no setor hoteleiro foi em 2018, portanto é relativamente recente e sinto que acompanha a tendência geral da última década, de colocar mais mulheres em posições de liderança. Não considero que seja difícil ser mulher na hotelaria, contudo entendo que possa ser mais desafiante para uma mulher abraçar desafios com horários rotativos e alargados – que são muitas vezes exigidos neste setor – se for mãe ou pretender sê-lo.
Quando começou a trabalhar no setor hoteleiro e onde?
O meu primeiro trabalho na hotelaria foi por volta dos 20 anos, como piscineira, num resort no Algarve. Durante a minha licenciatura trabalhei todos os verões em hotelaria, passando por diversos departamentos operacionais como piscina, kids club, rececionista de ginásio e de concessão de praia. Hoje, olhando para trás, vejo que essas experiências acabaram por me dar uma base sólida e uma visão abrangente da operação hoteleira, o que valorizo e sinto ser um grande suporte, especialmente numa função de liderança.
O que a motivou a trabalhar na hotelaria?
Nessa altura, foi uma forma fácil e divertida de ir juntando dinheiro durante o verão. Hotelaria não era o meu principal foco, no entanto, depois da minha primeira experiência laboral na minha área de formação (multimédia e marketing) surgiu a oportunidade de o fazer na indústria hoteleira. Abracei esse projeto e envolvi-me. É um setor muito interessante, há sempre coisas novas por desenvolver, histórias para contar
e dá a possibilidade de interagir com muitas pessoas e culturas diferentes.
Qual a sua função no hotel em que trabalha? Desde quando ocupa esse cargo? E como é o seu dia a dia?
Atualmente exerço a função de Head of Marketing no Viceroy at Ombria Algarve, onde comecei em janeiro do ano corrente. Tem sido um desafio muito bom, primeiro porque é um produto novo e muito diferente do habitual produto hoteleiro no algarve. Segundo, porque sendo uma novidade, dá-nos margem para estudar bem a resposta do nosso público-alvo e agir rapidamente, ser criativos e ajustar estratégias, moldando-nos também àquilo que o mercado procura. Contruir algo de raiz, como estamos a fazer, é incrivelmente enriquecedor a nível profissional.
Alguma vez sentiu, ao longo da sua carreira, mais dificuldade em aceder a determinado cargo/função por ser mulher? Considera que ser mulher é um fator que dificulta o crescimento profissional?
Pessoalmente, nunca senti dificuldade por ser mulher. No entanto, como referi, acredito ser mais desafiante para mulheres que também são mães ou querem sê-lo. Ainda existe uma cultura profissional que dá mais espaço ao crescimento a quem se mostra mais disponível e a normalidade é que sejam as mulheres a ausentar-se mais vezes do trabalho quando há uma criança, o que pode prejudicar esse crescimento. É uma questão estrutural e muitas vezes subtil, mas que tem um impacto real.
Na sua opinião, há um equilíbrio ou desequilíbrio no número de mulheres versus homens que trabalham no setor? De que forma isso se verifica-nos cargos exercidos, nos salários oferecidos? E por que razão considera que é assim?
Nas empresas em que trabalhei até hoje noto um equilíbrio e noto essa evolução no paradigma nacional, em vários setores. No entanto, sei que de forma geral ainda há uma tendência do género masculino em cargos de chefias altas – diretores e administradores principalmente. Talvez aconteça porque ainda seguimos padrões e
modelos antigos nas estruturas corporativas, mas há cada vez mais mulheres com perfis e competências para ocupar esses lugares. É nosso dever como sociedade garantir que o acesso a essas oportunidades chega a todos.
No seu hotel quem está em maioria – mulheres ou homens? E na equipa onde trabalha?
Na minha equipa a maioria são mulheres. Somos quatro mulheres e dois homens, mas sendo um departamento de Sales & Marketing, parece-me natural. Há um interesse maior por parte das mulheres na área da comunicação, organização de eventos e grupos. Aliás, notei essa preferência já em contexto académico – sempre tive mais raparigas como colegas de turma durante a licenciatura e mestrado.
No seu caso pessoal, gosta mais de trabalhar com equipas de mulheres, só de homens ou mistas?
Não tenho preferência e até acho que não é o género que define a competência de um indivíduo. Se analisarmos biologicamente, diria que as mulheres têm uma maior tendência para ver as coisas de uma forma mais sensível enquanto os homens são mais racionais e com foco na ação imediata. Acredito que é o equilíbrio desses dois
lados que nos leva ao sucesso. Mas novamente, é da experiência pessoal de cada profissional e no conjunto de todos que conseguimos chegar a resultados, independentemente do género.
É fácil conjugar a sua vida pessoal/familiar com a vida profissional? Sente uma maior pressão em atingir este equilíbrio pelo facto de ser mulher?
Nesta fase da minha vida ainda não sinto essa pressão, talvez por ainda não ser mãe. Atualmente dedico muito do meu tempo ao trabalho, porque gosto realmente de fazê-lo, mas continuo a ter tempo para a minha vida pessoal e o meu ambiente profissional dá-me essa flexibilidade, permitindo ajustar-me. Gosto de acreditar que, quando for mãe, terei a mesma sorte de estar integrada num ambiente profissional que me apoia e
que me permita viver esse momento com tranquilidade, sem sentir que possa prejudicar a minha carreira. E esta deveria ser a regra para qualquer profissional. Acho que a posição dos pais (e homens no geral) também tem muito peso nesta mudança: é preciso que exista uma maior troca de papéis no que diz respeito à presença em casa, para que seja equilibrada e não recaia tudo sobre a mulher.
O que pensa que a visão feminina pode trazer de diferenciador e de positivo ao setor hoteleiro?
Acredito que a visão feminina contribui para uma mudança positiva, especialmente neste setor. A hotelaria vai além do serviço, envolve a emoção e as relações que se criam com os hóspedes e as mulheres tendem a trazer uma abordagem mais empática, colaborativa e atenta aos detalhes humanos. Mas considero que o que traz sucesso a uma equipa ou projeto não é o género isoladamente, mas sim o equilíbrio. É quando diferentes visões se encontram, desafiam e complementam que surgem as soluções mais criativas e eficazes. Os homens continuam a ter um papel essencial nesta mudança e, muitas vezes esse papel passa pela sua abertura, saber ouvir e reconhecer o valor dessas diferenças. É aqui que nasce o progresso.
A presença feminina em cargos de liderança não deve ser vista como uma conquista, mas como uma oportunidade para, enquanto sociedade, repensarmos os modelos de liderança que foram, durante muito tempo, exclusivamente masculinos. Ainda há caminho por percorrer, mas acredito que estamos a caminhar na direção certa.






















































