Setor turístico rejeita “carga negativa” de fim de ciclo e admite que já está num novo ciclo

Da parte política e institucional aos empresários, todos rejeitam a “carga negativa” que pode comportar o final de ciclo, mas admitem que o país entrou num novo ciclo onde existem outras oportunidades e têm que ser transpostos novos obstáculos, rumo a uma melhor competitividade das empresas: digitalização em vários patamares das empresas, integração dos subsetores do turismo, melhoria da organização interna das organizações, entre outros.

“Turismo em Portugal: Os desafios do crescimento” foi o mote, no âmbito do 44º Congresso da Associação Portuguesa das Agências de Viagens e Turismo – APAVT, que decorreu nos últimos dias nos Açores, em Ponta Delgada, tendo juntado intervenientes de vários quadrantes (políticos, institucionais e empresariais). Depois de uma introdução feita por Adolfo Mesquita Nunes, ex-secretário de Estado do Turismo, seguiu-se um debate alargado, que demonstra que o setor turístico nacional está alinhado quanto aos passos a trilhar no presente.

O presidente do Turismo de Portugal, Luís Araújo, foi o primeiro a ser convidado a intervir, referindo em primeiro lugar que “sim, estamos em fim de ciclo, porque conseguimos reduzir a sazonalidade para o menor número de sempre: 36% (um número menor que todos os países da bacia do mediterrânico); as companhias aéreas voam para Portugal durante todo o ano, não apenas numa época; e estamos em fim de ciclo quando vemos que o nosso país consegue estar na short list das pessoas que viajam pelo mundo”. No entanto, Luís Araújo não concorda que este fim de ciclo seja considerado de uma forma negativa, pois “o novo ciclo será uma oportunidade para crescer, muitas regiões do país têm de crescer mais, exigindo-se uma concentração concertada entre todos na área digital, para além da promoção e distribuição, na criação do produto, ao nível dos recursos humanos e na perceção do país como um todo”. Para o responsável, “esta é uma oportunidade única em que vamos ter que reinventar muito mais rápido do que fazíamos antes”.

Relativamente ao fim de ciclo do turismo nacional, aquando questionado pelo moderador do painel, Duarte Correia, CEO da W2M, o vice-presidente da AHRESP (Associação da Hotelaria, Restauração e Similares de Portugal, Jorge Loureiro, considerou que “todos os dias temos um desafio para a hotelaria ao nível das tendências e procura do consumidor. Evidente que esta adaptação e trabalho tem de ser feita. A hotelaria está muito atenta e está a trabalhar nesse sentido”.

Por seu lado, o presidente do Turismo do Algarve, João Fernandes, refere que estamos a iniciar “um ciclo de um potencial interessante”. Pois, por exemplo, apesar dos vários condicionantes registados este ano à operação turística no Algarve os números mostram que estamos a crescer face a 2017”.

Luís Araújo, o presidente do Turismo de Portugal, complementou indicando que o aeroporto de Faro cresce neste inverno face ao último 30% a nível de capacidade aérea. Logo, “é sempre possível ver os ciclos pela positiva e/ou negativa, cabe-nos a nós puxar pela autoestima e perceber se há oportunidade fazer algo mais neste crescimento”.

Eduardo Miranda, presidente da ALEP (Associação do Alojamento Local), considera que “estamos a analisar uma indústria que está a alterar rapidamente o seu paradigma mas através de números antigos”. Para o responsável, estamos já num novo ciclo que “está a englobar novos segmentos turísticos, estamos a viver uma época em que o turismo é quantificado de acordo com as expectativas e experiências que o turista tem e atinge”. Eduardo Miranda refere também que “poderemos ainda não estar preparados para esta realidade de uma forma integrada, (no que diz respeito) ao setor privado. Em Portugal olhamos nas nossas avaliações para números básicos que dizem muito pouco”. Exemplifica o interlocutor, “devemos hoje ter um gap entre os números oficiais e a realidade, ao nível do alojamento turístico nacional legal, de cerca de oito milhões de hóspedes e 22 milhões de dormidas que não são contabilizadas. Isto porque a metodologia do INE – Instituto Nacional Estatístico não acompanhou a mudança dos tempos”. Indica o responsável que “quando isto acontece, como posso dizer que estou a crescer ou decrescer?”.

Por outro lado, chama o responsável a atenção que “temos também que perceber que temos uma nova perspetiva de lógica de segmentos de viagem. O habitual cliente de Portugal aumentou o seu número de viagens, segmentando-as: uma vez viaja sozinha, a outra com os filhos e mais tarde com os pais, por exemplo”. Sendo assim Eduardo Miranda considera que “hoje para o mesmo cliente temos que abarcar uma dezena de possibilidades a apresentar para o mesmo destino”.

Destaca ainda o orador que “temos talvez um dos melhores business inteligence do mundo (Turismo de Portugal), recolhendo, agregando e disponibilizando informação ao público, mas depois não estamos a ser capazes de utilizar essa informação ao nível da perceção de tendências”. Por fim, acrescenta o presidente da ALEP: “Este é um novo ciclo. Quem estiver a pensar em fim de ciclo vai morrer.”

Esta visão também é partilhada por João Paiva Mendes, CEO da Boost Portugal: “Não estamos num fim de ciclo, estamos na continuação de um ciclo”. Ou seja, para o empresário o que se assistiu nos últimos anos em Portugal é que é normal, empresas a aparecerem, desenvolverem-se e crescer. Para João Paiva Mendes “chegámos realmente a um patamar em que as taxas de crescimento não irão ser na ordem dos dois dígitos, mas que seria impossível que assim fossem. Há «n» oportunidades fruto do oxigénio que ganhámos, resultado dos dois ou três últimos anos”, agora as empresas têm que se reorganizar, tornar-se mais competitivas, para voltarem ou continuarem a crescer de uma forma mais sustentada. O empresário reforça ainda que “a informatização dentro das organizações é que é o segredo para ganharem vantagem competitiva”. Por outro lado, “o setor tem que se aproximar verticalmente para ganhar competitividade”.

O presidente do Turismo de Portugal, Luís Araújo fez questão de reforçar esta variante. Para o responsável, “o setor turístico nacional não está a conseguir fazer negócio em conjunto. Se não conseguimos fazer negócio em conjunto, por exemplo, que os agentes de viagens vendam alojamento local e animação turística, e que os hotéis vendam animação e outros, não seremos mais competitivos. Não estamos atentos em Portugal às oportunidades e capacidade de vender”, acrescenta o responsável.

No painel também interveio, Marta Sousa Pires, vice-presidente da Associação da Hotelaria de Portugal (AHP), indicando que considera que “estamos no início do ciclo da digitalização, porque estamos muito no início ao nível da parte da digitalização da venda, da promoção, do conhecimento dos nossos clientes, do tratamento do marketing digital de inteligence”. Indica a responsável que no nosso país “isso é transversal à animação turística, à hotelaria, incluindo alojamento local e agentes de viagens”.