Solférias (I): “Tenho orgulho, porque demos a cara sempre nos bons e maus momentos”

Sónia Regateiro

Na primeira entrevista desde o início da pandemia, Nuno Mateus e Sónia Regateiro, respetivamente diretor-geral e Chief Operating Officer da Solférias, abordam os primeiros meses de 2020, quando deflagrou na Europa a Covid-19, as grandes dificuldades que operador teve de enfrentar e o orgulho na equipa. Por outro lado, abordam também a programação para 2022, as novidades de destinos e quais as expectativas existentes para o ano em curso. Ao longo dos próximos dias, Ambitur.pt irá partilhando a entrevista de um dos maiores players da operação turística nacional.

Passaram-se dois anos desde o início da pandemia em Portugal. Como viveram estes momentos?

Nuno Mateus: Começámos a ter as primeiras notícias em dezembro (2019) da China, mas ninguém teve a noção da dimensão do problema. Mesmo em fevereiro (2020) considerávamos que não íamos ter um grande impacto. A verdade é que em janeiro e fevereiro as reservas estavam a correr muito bem, março estava excelente. No início de março começámos a perceber que algo não estava bem e em meados do mês descarrila tudo. Mas mesmo nesta altura considerávamos que em dois/três meses tudo estaria resolvido. Este é o começo de um problema que se arrasta durante dois anos.

Em termos da Solférias uma primeira fase foi a passagem da equipa do escritório para teletrabalho, que nunca havia acontecido de uma forma massificada. Tivemos a sorte de ter uma central tecnológica que nos permitia fazer call center a partir de casa, não nos trazendo grandes dificuldades a este nível.

Um grande problema que surge, também desde o início, foi entender como se teriam que processar os reembolsos. Felizmente foi possível chegar ao “voucher” (vale Covid) que nos permitiu ganhar um ano e dois meses, colocando toda a questão dos reembolsos até 31 de dezembro. No entanto, tivemos que encontrar uma forma de tratar estes processos. No início foi confuso, a partir de maio conseguimos uniformizar processos e, a partir daí, esta situação tornou-se mais fácil.

Outro problema é que não havia destinos para vender. Em 2020 conseguimos faturar tanto como um único mês de 2019, agosto. Isto para se ter a noção do problema. Havia muita expectativa relativamente a 2021, mas a verdade é que o ano começou completamente com o pé esquerdo, porque até maio não vendemos praticamente nada. A partir de junho as coisas mudam, nas operações em que a Solférias esteve envolvida, tanto o Porto Santo como o Cabo Verde correm bem. Mas a verdade é que, mesmo hoje, dos 50/60 destinos que programamos, temos cerca de uma dúzia para vender. Em 2020 tínhamos praticamente Portugal e Maldivas, em 2021 já aumentámos mais seis destinos. Esta é a dificuldade maior que encontrámos para o retomar da nossa atividade. Ou seja, ainda não temos os destinos para vender tendo em conta um operador da nossa dimensão.

Acreditamos que estamos numa nova fase. Há vários países que estão a anunciar reaberturas e interesse em operações a partir de março, principalmente em longas distâncias.

Concluindo, esta foi uma aventura para a qual a Solférias não estava preparada, nenhuma empresa o estava, hoje tenho muito orgulho no que a equipa fez, claro que cometendo alguns erros, mas tenho acima de tudo orgulho, porque demos a cara sempre nos bons e maus momentos.

Sónia Regateiro: No início a Covid-19 foi quase uma bomba atómica para todo o setor do turismo em geral. A Solférias não fugiu à regra, foi efetivamente um grande pesadelo. Tínhamos muitas vendas já em carteira, quando se dá o fecho de fronteiras… Foi um verdadeiro pesadelo lidar com o repatriamento dos passageiros, com o regresso de todos os passageiros que estavam fora de Portugal, nessa altura. Depois, todo o processo de cancelar e de alterar todas as reservas que já tínhamos em carteira para a frente, surgindo a questão dos reembolsos com os fornecedores, seja hoteleiros, companhias aéreas, que foi efetivamente um grande tormento. Havendo alguns processos que ainda hoje não estão solucionados. Nem resolvidos.

A Solférias teve uma equipa à altura. (A entrevistada emocionou-se) Eu emociono-me sempre, quando falo da equipa. No meio da desgraça vimos que somos muito unidos e conseguimos lutar e manter as portas abertas e a empresa a funcionar, com uma grande dedicação de todos.

Tivemos uma preocupação que foi não deixar de comunicar, ao longo de todo o tempo, mesmo em teletrabalho. O cuidado de continuarmos a colocar o produto existente na rua, para venda. A fazer atualização do nosso site, atualizações das redes sociais para o mercado em geral, quando a situação estabilizou. Contámos com a sorte de ter uma empresa tecnologicamente muito bem preparada para que em 24 horas conseguíssemos estar todos a trabalhar em casa, com o call center a funcionar.

Durante este processo logicamente a equipa sofreu reduções, como em todas as empresas do setor. Não efetuámos nenhum despedimento perante os colaboradores, o que se passou foi a redução de staff à medida que os contratos chegavam ao seu término, pois não tínhamos condições para os renovar. Por essa via tivemos alguma redução na equipa.

Fazendo neste momento o balanço, no meio de tanta desgraça, acho que nos comportámos com o mercado de forma exemplar. Porque, tal como o Nuno estava a dizer, nunca deixámos de comunicar, de colocar produto na rua, para que fosse possível as poucas vendas serem efetuadas pelas agências de viagens. Estas com garantias, procurámos reforçar as condições ao nível de seguros que protegessem o cliente e o próprio agente de viagens, de modo a haver uma segurança acrescida na venda, durante este período.

A questão do “voucher” (vale covid) permitiu-nos efetivamente um balão de oxigénio, mas depois deste pesadelo esperamos que venha a bonança. Não foi em 2021, como alguns perspetivaram, apesar da nossa expectativa ter sido mais conservadora, pois sempre pensámos que a retoma seria para 2022 ou 2023.

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