Numa altura de incertezas quanto aos próximos tempos na economia europeia e de como o turismo irá reagir, a Ambitur.pt está a ouvir alguns dos seus Conselheiros no sentido de perceber de que forma perspetivam o momento presente e futuro. Damos a palavra hoje a Frédéric Frère, CEO da Travelstore.
O cenário de juros altos nos próximos anos obriga a um novo paradigma de gestão?
Eu diria que não. A gestão de um negócio significa lidar com variáveis em permanente evolução, obrigando a uma capacidade de adaptação “em tempo real”. O agravamento das taxas de juro é só mais uma variável que certamente nos força a tomar algumas decisões por vezes difíceis mas, de alguma forma, não deixando de ser ‘business as usual’…
em relação a Portugal, sou menos otimista pois receio tensões sociais que poderão refletir-se na economia
Na sua opinião, aproxima-se um cenário de retração económica na Europa?
Não sou tão pessimista e até acho o contrário. Penso que temos estado a sofrer os efeitos da crise sanitária seguida das consequências que sabemos nas cadeias de fornecimento e agravada pela guerra na Ucrânia, pelo que melhores dias deverão seguir estimulando as economias. Isso a nível mais genérico da Europa porque, em relação a Portugal, sou menos otimista pois receio tensões sociais que poderão refletir-se na economia. Os Portugueses que estavam habituados, de alguma forma, a viver com pouco sentem agora muito mais na pele as desigualdades face a quem nos visita, seja para férias, seja para cá viver, com um aumento dos consumos que, por um lado, contribui para os indicadores económicos mas paradoxalmente não se traduz em melhoria do poder de compra dos locais, antes pelo contrário. Existem muitos aspetos “soft” que poderão degradar o panorama sócio-económico do país e isso afetar o mercado interno.
Se, por um lado, há consequências ao nível dos mercados europeus, quais poderão ser as consequências ao nível dos mercados fora da Europa?
O que me aflige é verificar que algumas das grandes economias do mundo são lideradas por regimes autocráticos. Isso em si até poderia ser fator de estabilidade e vigor económico mas receio que seja também cada vez mais um fator de tensões geopolíticas e estarmos a assistir a uma espécie de bipolarização do planeta entre o bloco dos países assentes em valores humanistas e democráticos e o bloco dos regimes autocráticos que tendem a juntar esforços para fazer frente aos restantes, tentando “contaminar” o maior número possível. São estes contextos que me preocupam porque podem seriamente ameaçar a paz no mundo e, consequentemente, o desempenho das economias.
também me preocupam alguns sinais que poderiam inverter o excelente ciclo que temos estado a atravessar
O turismo tem-se mostrado resiliente em períodos de dificuldade económica. Este facto permite encarar com maior normalidade o futuro do turismo nacional no que diz respeito aos mercados externos?
Acho que sim mas também me preocupam alguns sinais que poderiam inverter o excelente ciclo que temos estado a atravessar. O principal sinal é o risco da degradação do rácio “value for money”, isto é, o destino entregar menos valor para maior custo. Portugal tem estado na moda mas se não tivermos muito cuidado, poderia deixar de o estar passando a ser um destino caro onde a experiência do visitante já não é aquela que era há uns anos atrás. Dito isto, não deixo de pensar que continuamos a ser um destino com valências únicas e que se tivermos o cuidados de as preservar, ainda teremos uns bons anos à nossa frente.
Desde que a economia não abrande, julgo que o mercado nacional deverá continuar a ser cada vez mais consumidor da oferta interna
Qual a perspetiva de evolução da procura no mercado interno no próximo ano?
Desde que a economia não abrande, julgo que o mercado nacional deverá continuar a ser cada vez mais consumidor da oferta interna. Infelizmente, em certos casos, ela é já mais cara do que alternativas no estrangeiro mas a proximidade e a qualidade da oferta ainda pesam muito na procura interna.