Trabalhar na hotelaria hoje é muito diferente de há 20 anos atrás, exigindo maior especialização, responsabilização e multidisciplinariedade. Os hotéis portugueses têm feito o seu caminho com vista a integrar-se no conceito de gestão hoteleira moderna e, sem dúvida que o facto de terem superado a inesperada crise de Covid-19, é um bom reflexo do quanto conseguiram adaptar-se a novas realidades. Mas estarão os hotéis e os gestores hoteleiros mais perto da eficiência que se deseja? Foi o que perguntámos a três consultores. Leia agora a 2ª parte deste trabalho.
Temos gestores eficientes?
Para Karina Simões, Head of Hotel Advisory da JLL, “estamos no bom caminho” para que os gestores hoteleiros portugueses sejam sinónimo de eficiência hoteleira, com a gestão hoteleira a caminhar a passos largos para uma maior profissionalização, com abordagens operacionais que acabam por ser mais vantajosas para os proprietários e as marcas gestoras de hotéis, e com impacto significativo nos níveis de satisfação do cliente.
a eficiência hoteleira não depende apenas dos gestores, e sim também da autonomia que lhes é dada, da sua equipa, cultura e ambiente organizacionais, bem como da capacidade de investimento em tecnologia e infraestruturas por parte da empresa
Mas Teresa Moreira, manager da Neoturis, reconhece que não podemos generalizar pois isso não é verdade para todos os gestores hoteleiros, embora haja muitos “altamente qualificados e eficientes”. A consultora da Neoturis admite que o português tem características intrínsecas que favorecem o sucesso nesta área, como a resiliência e a criatividade. Mas contrapõe ao afirmar que a eficiência hoteleira não depende apenas dos gestores, e sim também da autonomia que lhes é dada, da sua equipa, cultura e ambiente organizacionais, bem como da capacidade de investimento em tecnologia e infraestruturas por parte da empresa. “Através de um trabalho dedicado e personalizado para aumentar a eficiência dos gestores, os gotéis podem reduzir stress, adaptar a cultura e preparar o desempenho do negócio para os desafios atuais e futuros”, defende.
Já Filipe Santiago, senior partner da BlueShift, contextualiza as mudanças estruturais que o setor está a viver em Portugal, relacionadas, por um lado, com a necessidade crescente de escala para ser competitivo num mercado global e, por outro, com a escassez crónica de capital que caracteriza a economia nacional. E, como resultado, uma parte considerável dos hotéis portugueses e dos grupos hoteleiros estão a passar para as mãos de grupos internacionais. Estes, muitas vezes, têm “perfis puramente financeiros e perspetivas de valorização temporalmente curtas, colocando uma pressão sem precedentes na melhoria de performance”, aponta o consultor da BlueShift. Consequentemente, as estratégias tornam-se mais exigentes, explica, o que irá impactar todas as áreas funcionais da empresa hoteleira.
Mas, por outro lado, a maior escala operacional que resulta da integração em players com “maior poder de fogo”, assim como o acesso às suas estruturas, competências e tecnologias, “oferece condições sem paralelo para uma gestão mais eficaz e eficiente, potenciando a performance e a criação de valor”, acrescenta o responsável. E finaliza: “Uma oportunidade que os gestores hoteleiros portugueses certamente quererão aproveitar, ainda que exigindo-lhes uma forte adaptação cultural”.
As melhores estratégias para uma melhor eficiência
O senior partner da BlueShift admite que os gestores hoteleiros portugueses têm hoje uma capacidade de otimizar e flexibilizar sem a qual não teriam chegado a 2023, superando a Covid-19. “Há um potencial de criação de valor enorme quando, após uma crise, somos capazes de rearrancar sem perdermos as eficiências entretanto ganhas, passando os crescimentos do ‘topline’ diretamente para o ‘bottom-line’, em vez de criar novas gorduras na organização”, esclarece. Mas lembra, no entanto, que assegurar eficiências é muito mais do que reduzir custos, exigindo-se um trabalho profundo de melhoria de processos em áreas críticas como o revenue management. Por outro lado, tecnologias emergentes, como a Inteligência Artificial, podem também vir a gerar “eficiências massivas” a nível de comercialização, assistência ao cliente ou serviço ao hóspede. Contudo, neste campo, “há que ser realista e deixar que os grandes players tomem a dianteira”, defendendo que a melhor estratégia passa por “ficar atento às soluções que vão sendo disponibilizadas no mercado e avançar num momento em que o caminho esteja mais bem balizado”.
“Há um potencial de criação de valor enorme quando, após uma crise, somos capazes de rearrancar sem perdermos as eficiências entretanto ganhas, passando os crescimentos do ‘topline’ diretamente para o ‘bottom-line’, em vez de criar novas gorduras na organização”
Também Karina Simões vê ainda espaço para melhorias e adoção de práticas que aumentem a eficiência nos hotéis. Além de soluções tecnológicas ‘in room” e de interface com o cliente, lembra que existem outras que ajudam a melhorar a performance do dia-a-dia, “com impacto favorável na melhoria dos níveis de eficiência nas mais variadas dimensões”. Restringindo-se às práticas sustentáveis, a consultora da JLL aponta a importância da utilização mais eficiente de energia recorrendo a fontes renováveis, a racionalização eficiente dos consumos de água, o controlo do ar e ambiente interior através da monitorização de sistemas AVAC, ou ainda o apoio a projetos e iniciativas de suporte à comunidade local.
Teresa Moreira sabe que os hotéis têm melhorado a sua eficiência, adotando tecnologias inovadores e modernizando as suas operações. Mas lembra que ainda muitos enfrentam desafios comuns como os elevados custos operacionais, a falta de competências e formação das equipas, ou o uso inadequado da tecnologia e sistemas obsoletos. Assim, a manager da Neoturis sugere algumas ferramentas para que os hotéis possam tornar-se mais eficientes: a promoção de uma cultura de inovação em todos os níveis da organização; o investimento nas equipas no sentido de melhorar as suas competências e de favorecer o equilíbrio entre vida pessoal e profissional; a adoção de tecnologias de ponta nas mais diversas áreas, desde a análise de dados à business intelligence ou preços dinâmicos; a aplicação dos princípios de gestão Lean, sendo que a agilidade das operações e melhoria contínua, aliada à extinção de ineficiências, otimiza operações e reduz custos, melhorando os resultados; e, por fim, parcerias com outras empresas no sentido de partilhar conhecimento, recurso e experiências. “Novas abordagens podem melhorar a eficiência e a produtividade, e até a criação de novas áreas de negócio”, conclui.
Por Inês Gromicho. Artigo publicado na edição 345 da Ambitur.
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