Por Armando Luís Vieira, PhD, regente da Unidade Curricular de Gestão Hoteleira Universidade de Aveiro, DEGEIT/GOVCOPP
Eis algumas reflexões, no contexto dos desafios do século XXI e num contexto pós-pandémico, em forma de sugestões de ferramentas para a eficiência e eficácia hotelaria:
1 – Acessibilidade
1.1 – Física
É comum dizer-se que os 3 pilares do sucesso da hotelaria são localização, localização, localização. É verdade. Basta imaginarmos o melhor hotel do mundo localizado num sítio de acesso impossível…
No contexto do presente debate, falemos, de modo mais global – e moderno, ou seja, tendo em conta os desafios dos nossos tempos -, em acessibilidade, começando pela vertente física.
Um hotel deve ser fisicamente acessível e pragmaticamente funcional na perspetiva do(a)s hóspedes, quer internamente, por exemplo em termos de arquitetura e logística, incluindo para pessoas com mobilidade limitada ou outro tipo de limitação; quer externamente, por exemplo, boas vias de acesso, infraestruturas públicas, o que também depende de entidades externas à gestão do hotel e vem acentuar a importância de manter e desenvolver boas relações de negócio com parceiros do sistema turístico.
1.2 – Digital
No ecossistema digital em que vivemos, é de relevância incontornável cuidar da componente digital, que é, muitas vezes, a primeira via de contacto com a nossa organização. Aqui vigora o princípio de prometer o que podemos cumprir, ou, por outras palavras, é necessário encontrar um equilíbrio entre captar negócio e uma eficaz gestão de expetativas, tendo em conta a simples equação Q(qualidade percebida)=P(perceções)-E(expetativas). E, já sabemos, se as perceções durante a estada igualarem as expetativas, o(a) hóspede vai ficar satisfeito(a); se forem superiores às expetativas, vai ficar encantado(a), se forem inferiores, via ficar desiludido(a).
1.3 – Preço/Qualidade
Quer queiramos ou não, este rácio estará sempre presente nas decisões tomadas, em hotelaria ou em qualquer setor. Mais uma vez estamos no reino das perceções. Se o(a) potencial cliente percecionar um serviço de qualidade superior, estará com certeza disposto(a) a pagar um preço compatível.
2 – Personalidade
2.1 – De pessoas para pessoas
A hotelaria é, desde o seu berço, na Grécia Antiga, a arte de receber, ou seja, cuidar bem de quem nos visita. É esta a origem etimológica da palavra hospitalidade. É uma atividade de personalidade, de pessoas para pessoas. Os serviços hoteleiros são coproduzidos por fornecedores e consumidores e são predominantemente intangíveis. Ao contrário dos bens físicos, em que, por exemplo, podemos ver se una sapatos são confortáveis antes de os comprarmos, não podemos experimentar uma noite num hotel antes de, efetivamente, estarmos lá hospedados. Por isso, é crucial desenvolver os melhores esforços para atingir algum nível de ‘tangibilização’, nos quais estão incluídas as interações pessoais. O hotel é a nossa casa fora de casa e quem lá trabalha é a nossa família enquanto lá estivermos.
2.2 – Reputação e imagem
Numa indústria planetária, como é a hotelaria, impõe-se uma gestão global nas suas várias vertentes. Todos os pontos abordados neste breve texto contribuirão para estabelecer, reforçar e capitalizar a reputação, ‘marca’, da nossa organização, por exemplo, através de um dos mais poderosos instrumentos de marketing, o passa palavra;
2.3 – Fator diferenciador
Os fatores de diferenciação que decorrem de uma gestão global e eficaz, como, por exemplo, a boa interação pessoal, o equilíbrio qualidade/preço e a boa reputação, constituirão vantagens competitivas que serão capitalizadas rumo ao cumprimento do primeiro objetivo de uma organização com fins lucrativos: a maximização do lucro.
3 – Sustentabilidade
3.1 – Social
Novamente as pessoas. Se quem connosco trabalha, seus familiares, bem como as próprias populações locais, estiverem confortáveis com o que a nossa organização representa, isso reverterá com certeza a nosso favor, numa lógica de círculo virtuoso;
3.2 – Ambiental
A sustentabilidade do planeta, do qual não temos versão B, é, a todos os títulos, essencial. Incluindo para a própria sustentabilidade da organização, ao contribuir para uma melhor perceção por parte do mercado – e, consequentemente, mais negócio potencial.
3.3 – De negócio
Se uma organização com fins lucrativos (para as organizações sem fins lucrativos, a conversa é diferente) cuidar da maximização do lucro, vai conseguir pagar salários, impostos e segurança social, aos fornecedores e outros credores e, querendo (como é desejável), ajudar quem mais precisa e patrocinar iniciativas culturais, desportivas e outras, por exemplo, através de ações de solidariedade, mecenato e patrocínio; e ainda vai poder reinvestir na própria organização, se essa for considerada a melhor decisão por parte de quem gere. O contrário, como referido anteriormente, é, simplesmente, dramático e contraproducente a todos os níveis.
A concluir, algumas sugestões, em jeito de modesta contribuição para quem está no terreno (na indústria e na academia):
i) quem gere e quem forma dará certamente contributos de elevado valor acrescentado se, de vez em quando, se se hospedar no hotel, colocando-se na ‘pele/perceção’ do(a) hóspede e percorrendo, assim, por experiência própria, todos os atos e episódios da prestação do serviço;
ii) Toda a equipa deve estar em sintonia em tudo, deve saber que o seu contributo é tão importante como todos os outros, incluindo quem está no back office, mas que, por vezes, se cruza com hóspedes, que deve cumprimentar sempre (mesmo que não seja recíproco) e não pode atender o telefone com um “‘tou?”, mas sim com “Hotel Afonsino, fala Elsa Marjorie Campos, em que posso ajudar?”
iii) Como em tudo na vida, a atenção ao pormenor é fundamental. Fazer mais com menos (uma definição possível de produtividade) é uma das chaves para conseguir tudo o que foi anteriormente referido. Para dar apenas um exemplo, há formas mais eficazes do que outras de fazer a cama ao arrumar um quarto. O pessoal do housekeeping/ ‘andares’ sabe isso. Basta imaginarmos o que esses gestos repetidos milhares de vezes podem representar em termos de gestão de recursos – e, logo, eficiência e eficácia global.
Neste contexto, é de reconhecer o excelente trabalho que as instituições que formam futuro(a)s trabalhadores da indústria hoteleira têm feito em Portugal, desde as escolas de cariz mais prático e operacional (fundamentais para o saber fazer, por exemplo, na restauração, animação, etc.), às instituições de ensino politécnico e universitário que, complementarmente, também abrangem aspetos mais globais de gestão e planeamento.
*Este artigo foi publicado na edição 344 da Ambitur