A Ambitur.pt está a auscultar as várias associações do país no sentido de que partilhem com os nossos leitores a sua visão, mais de 15 dias depois da declaração do Estado de Emergência.
Ana Jacinto, secretária geral da AHRESP – Associação da Hotelaria, Restauração e Similares de Portugal, responde às nossas questões.
Como caracteriza a AHRESP o estado das empresas vossas associadas?
Perante tudo o que se está a passar atualmente, por força da crise de saúde pública, o cenário que se vive é verdadeiramente dramático. Esta crise desde muito cedo que teve um efeito imediato no setor do Turismo, até mesmo antes de ter repercussões em outros setores da economia. Ainda não se perspetivava a gravidade da situação a que chegámos e já a AHRESP chamava a atenção para as dificuldades que estas empresas sentiam. Obviamente que com o agudizar da situação e as medidas restritivas sobre a atividade económica, que resultaram em quebras acentuadas na faturação, quando não mesmo faturação zero, criou-se este cenário dramático que referi.
E agora já não é uma mera perceção. O mais recente inquérito realizado pela AHRESP junto do canal HORECA e apresentado no passado dia 3 de abril vem confirmar as nossas previsões, sendo as suas conclusões preocupantes. Das cerca de 2000 empresas de Restauração e de Alojamento Turístico que nos responderam, destaca-se que 75% se encontravam encerradas, e 80% estima zero vendas em abril e maio. Outros dados dizem respeito à dificuldade em pagar salários com 1/3 das empresas a referir que não o fez relativamente ao mês de março, e 50% das empresas ia avançar para lay-off, sendo que 70% referiram que não conseguem pagar salários em abril se a Segurança Social não entregar o apoio atempadamente. Um outro dado preocupante refere-se aos financiamentos, com 77% das empresas a não recorrer a eles, com 58% a reconhecer que as linhas de apoio financeiro não são adequadas às necessidades das empresas, e indicam apoios a fundo perdido e isenção de impostos como as únicas soluções capazes de apoiar o tecido empresarial.
Existe alguma previsão de curto prazo relativamente ao futuro da atividade das mesmas?
A evolução desta situação de crise sanitária ainda é desconhecida e até mesmo imprevisível, o que faz com que seja também uma incógnita saber o que se pode perspetivar nos próximos meses, mas o que sabemos é que nesta fase, nesses meses, estamos muito dependentes dos apoios que cheguem às tesourarias destas empresas. Como referi, no inquérito que realizámos, 80% das empresas estimam zero vendas em abril e maio, e desta forma é impossível a sobrevivência porque muitos encargos se mantêm.
O que preocupa mais a associação no atual momento de gestão de crise?
O que nos preocupa é que se prejudiquem estas atividades, que tanto têm contribuído para a economia nacional, de forma irremediável, que determine o encerramento massivo de empresas, com o impacto que isso terá. Se os apoios não chegarem e se não forem adequados e eficazes, e isso passa invariavelmente por injeção de dinheiro a fundo perdido, estas empresas podem não conseguir sobreviver a esta fase, para que mais tarde se possam reerguer, manter a sua atividade e manter os seus postos de trabalho. Os apoios até agora apresentados baseiam-se em moratórias ou créditos que têm de ser pagos, num futuro muito incerto. Nesta fase, dinheiro emprestado acaba por ser um “presente envenenado”.
Têm sido auscultados pelo Governo e participado no desenhar de soluções já aplicadas?
Dada a urgência com que as medidas têm sido implementadas, nem sempre temos sido ouvidos como devíamos, o que tem levado a que sejam estabelecidas regras que mais tarde têm de ser retificadas ou melhor esclarecidas. Mas isso não nos tem impedido de estar em contacto permanente com o Governo, que tem na sua mão as mais de 40 propostas da AHRESP, nas mais diversas áreas, tendo algumas medidas implementadas sido desenhadas tendo em conta essas nossas propostas. Infelizmente nem todas tiveram consagração mas persistiremos na sua defesa.
As atuais soluções precisarão de ser reforçadas, e em que altura?
As soluções disponibilizadas pelo Governo terão de ser, algumas delas repensadas, e outras reforçadas, mas num prazo muito breve. Cada dia que não entra dinheiro na caixa registadora das empresas contribui para o seu sufoco, porque além de não haver receitas, muitos dos seus custos e obrigações mantêm-se.
A AHRESP continuará a defender, entre outras medidas, a urgência de ser implementado um regime de apoio direto às empresas no montante de 1.000€/mês por posto de trabalho e pelo período de três meses, incluindo sócios-gerentes. Nesta situação, as empresas asseguram o pagamento total da taxa social única, assim como da retenção na fonte de IRS de todos os trabalhadores. Esta medida visa criar as condições necessárias para que as empresas consigam sobreviver e garantir a manutenção dos postos de trabalho. Caso isso não aconteça neste importante setor, será toda a economia e toda a sociedade a sofrer.
Também ao nível do financiamento, a Linha de Apoio do Turismo de Portugal deve ser alargada às Pequenas e Médias Empresas e reforçada a sua dotação global. Esta Linha de Crédito tem sido o instrumento de financiamento mais procurado pelas empresas da Atividade Turística, tal como o nosso inquérito também revelou.
Há números de que se possam falar ao nível do emprego destruído até agora, e naquele que poderá ser o curto prazo?
Não detemos quaisquer informações oficiais sobre esta matéria, mas a nossa preocupação é grande. Como sabemos, infelizmente, o fim da crise não se opera por decreto e se as nossas empresas não têm o apoio de que precisam, esse facto terá um óbvio reflexo na manutenção dos postos de trabalho. Não esqueçamos o dado preocupante que o nosso inquérito revelou, e que nos disse que 30% das empresas não conseguiram pagar salários em março, e 50% iam avançar para o lay-off.