Ambitur volta a abordar os seus Conselheiros numa tentativa de perceber qual o atual momento do setor do turismo em Portugal e o que podemos esperar deste ano e de uma retoma iminente. Frédéric Frère, CEO da Travelstore, partilha as suas perspetivas enquanto Conselheiro Ambitur.
2022 e os seus primeiros indicadores permitem indiciar uma retoma turística sustentada para breve? Que espécie de retoma considera que se vai verificar? Quais as condicionantes que poderão acelerar a mesma?
De um modo geral, tanto no fim do ano passado e sem perder de vista que no acumulado as quebras têm sido catastróficas, como no início deste ano, verificámos níveis de atividade superiores aos esperados. A ultima onda da pandemia levava a crer que a atividade seria novamente residual mas a verdade é que foi melhor do que o esperado. Dito isto, há que ter em conta que a intensidade da retoma varia bastante em função do tipo de negócio e segmentos de mercado. A retoma nas viagens de negócio é surpreendentemente melhor do que prevíamos para este ano mas não deixa de estar abaixo da retoma que se verifica nas áreas do eventos e nas viagens de lazer. Estas áreas sim estão a registar um aumento de atividade muito significativo, provavelmente já muito próximo ou mesmo superior a 2019.
[blockquote style=”1″]A retoma nas viagens de negócio é surpreendentemente melhor do que prevíamos para este ano mas não deixa de estar abaixo da retoma que se verifica nas áreas do eventos e nas viagens de lazer. Estas áreas sim estão a registar um aumento de atividade muito significativo, provavelmente já muito próximo ou mesmo superior a 2019.[/blockquote]
Obviamente somos agora novamente confrontados com uma nova preocupação, a da triste e lamentável guerra, consequência da invasão da Ucrânia desencadeada pela Rússia, ou melhor, pelo senhor Putin, porque custa-me acreditar que a população Russa, por mais “desinformada” que esteja, apoie tal iniciativa arcaica e humanamente dramática. De momento, os efeitos desta guerra ainda não se fazem muito sentir a nível da atividade de turismo, viagens e eventos, com a exceção dos fluxos realizados com os países diretamente envolvidos no conflito e alguns países limítrofes. Mas devemos manter as antenas em alerta porque esta guerra, para alem de se poder degradar do ponto de vista militar, poderá também ter efeitos bastante negativos nas economias, em boa parte consequência do aumento brutal do custo das matérias-primas e da onda de choque que este fator terá em toda a produção de bens e serviços.
É claro que, para Portugal, toda esta conjuntura poderá beneficiar a indústria do turismo no curto prazo porque já estamos a verificar desvios da procura de países próximos da zona de conflito para Portugal, ou seja, poderemos estar a assistir ao fenómeno verificado durante a crise do Magreb… Mas, como disse, isso é uma perspetiva oportunista de curto prazo porque, no longo prazo, estou convencido de que o prolongamento da guerra acabará por nos prejudicar a todos.
[blockquote style=”1″]A indústria dos eventos tem à sua frente um futuro brilhante motivado pelo contexto pós pandemia do “revenge consuming” mas também pela evolução dos formatos de trabalho que levam as empresas a ter que organizar muito mais eventos para reunir presencialmente os seus colaboradores.[/blockquote]
Mas se, por sorte, e sobretudo por bom senso das autoridades Russas, a guerra terminar, então diria que estou globalmente bastante otimista. A indústria dos eventos tem à sua frente um futuro brilhante motivado pelo contexto pós pandemia do “revenge consuming” mas também pela evolução dos formatos de trabalho que levam as empresas a ter que organizar muito mais eventos para reunir presencialmente os seus colaboradores. O mesmo fenómeno do “revenge consuming” está claramente a verificar-se nas viagens de lazer e, por fim, o mercado das viagens de negócios irá demorar um pouco mais tempo a recuperar mas mesmo se podermos antecipar alguma redução estrutural resultante da substituição de algum tipo de viagens por reuniões virtuais assim como de uma maior preocupação ambiental por parte das empresas, iremos assistir a uma retoma progressiva porque vão surgir novos motivos para se viajar, em boa parte resultando também do trabalho remoto.
Recursos humanos e aumento de custos de contexto serão os principais problemas no setor para 2022? Que novos desafios se antecipam ou que outros que se podem acentuar?
Para alem das incertezas sanitárias e geopolíticas, este é claramente o grande desafio dos próximos anos. Há vários fatores que estão a provocar uma forte pressão sobre a área de Recursos Humanos: a forma como as novas gerações encaram o equilíbrio vida profissional / vida pessoal e procurando empregos que melhor consigam oferecer esse equilíbrio – todos sabemos que a indústria do turismo tem aspetos muito gratificantes que não vou aqui detalhar mas é também muito exigente a nível dos horários em detrimento da vida pessoal. Outro fator a que estamos a assistir nas atividades que não obrigam necessariamente à presença física, é o facto de algumas empresas localizadas fora de Portugal estarem a contratar pessoas em Portugal mas dando-lhes a possibilidade de trabalharem a partir de Portugal por um salário inferior ao que iriam receber no país onde operam essas empresas, mas superior ao salário pago por empresas locais…. Por fim, a inflação parece estar a instalar-se o que irá também contribuir para uma degradação da rentabilidade das empresas.
[blockquote style=”1″]As empresas vão portanto ter que reinventar as suas abordagens à gestão dos Recursos Humanos. Isto é perfeitamente possível e passa pela reinvenção dos formatos de remuneração dando, por exemplo, cada vez mais ênfase às componentes variáveis mas propondo também benefícios de “qualidade de vida”.[/blockquote]
As empresas vão portanto ter que reinventar as suas abordagens à gestão dos Recursos Humanos. Isto é perfeitamente possível e passa pela reinvenção dos formatos de remuneração dando, por exemplo, cada vez mais ênfase às componentes variáveis mas propondo também benefícios de “qualidade de vida”. Estes benefícios não consistem só em vantagens materiais mas começam com a qualidade do ambiente no trabalho, a flexibilidade e a capacidade de se relacionar com os pares, não como máquinas de produzir mas sim como seres humanos, precisando de sentir entusiasmo genuíno naquilo que fazem.
Numa altura de mudança de ciclo político, é necessário um novo fôlego para uma estratégia de turismo para o país? Ou apenas limar o trabalho que tem sido feito ao nível institucional e privado?
Seria muito injusto dizer que a forma como o turismo é gerido ao nível das instâncias políticas precisa de um novo fôlego porque os resultados estão à vista – fazendo abstração obviamente da crise sanitária – e têm sido muito promissores. Agora, como em tudo, devemos evitar o risco de acomodação e, mesmo no pico do sucesso, as empresas e as instituições devem antecipar mudanças de ciclos e, para tal, manter uma dinâmica recorrente de “reinvenção” e de melhoria da tão valorizada noção de “Experiência Cliente”. Pessoalmente, acho que o turismo beneficiou muito da qualidade dos seus respetivos responsáveis e, por sorte ou talvez mais porque todos sabem que o turismo é o motor da economia Portuguesa, esse qualidade tem-se verificado independentemente da cor política dos governos, o que é muito saudável.
[blockquote style=”1″]Agora, como em tudo, devemos evitar o risco de acomodação e, mesmo no pico do sucesso, as empresas e as instituições devem antecipar mudanças de ciclos e, para tal, manter uma dinâmica recorrente de “reinvenção” e de melhoria da tão valorizada noção de “Experiência Cliente”.[/blockquote]
Como é possível trazermos uma maior inovação e mais sustentabilidade à atividade turística nacional?
Em poucas palavras, à qualidade das pessoas, à qualidade dos líderes. Bons líderes saberão certamente promover inovação e endereçar da forma mais apropriada a temática importante da sustentabilidade.