A poucos dias de mais umas eleições legislativas em Portugal, e tendo o turismo a importância estratégica que todos lhe reconhecem, quisemos ouvir os Conselheiros Ambitur sobre quais as prioridades que definiriam para o país e para a indústria turística se fossem os próximos Primeiros-ministros. Frédéric Frère, CEO da Travelstore, considera que é a competência e o perfil de quem assume a pasta do Turismo em qualquer Governo que deve ser o principal critério, admitindo que prefere que a vertente mais política seja assumida por um Ministério da Economia, desde que o titular da pasta do Turismo seja “um grande conhecedor da nossa indústria”.
Se fosse nomeado Primeiro Ministro este ano, qual a importância na estratégia governativa que daria à atividade económica do turismo, dentro de um contexto de crescimento do país? Como suportaria essa prioridade?
É incontornável atribuir-se uma importância de primeiro plano à industria do turismo dado o potencial que esta tem no contributo ao crescimento económico do país. Dito isto, e correndo o risco de ser politicamente incorreto, também considero que a economia nacional deve procurar um maior equilíbrio das suas fontes de crescimento porque todos sabemos que os diferentes subsetores atravessam ciclos por vezes recessivos que não dependem só de nós e, nessas alturas, torna-se particularmente importante não se ter “todos os ovos no mesmo cesto”.
considero que a economia nacional deve procurar um maior equilíbrio das suas fontes de crescimento
A outra abordagem que teria, para além de promover ativamente a diversificação da economia, através nomeadamente de políticas fiscais muito favoráveis para estimular o investimento no setor secundário, seria de focar mais o setor do turismo em torno de objetivos qualitativos e não tanto quantitativos. Considero que devemos desenvolver um turismo muito sustentável, isto é, que tenha em conta os impactos não só ambientais mas também sociais porque, para além de isso ser o mínimo que podemos fazer para o país e para os seus habitantes, é também uma boa forma de atrair procura, uma procura muito mais sensível a esses critérios do que no passado.
Não interessa a Portugal encher-se de turistas até ao limite da saturação com todas as consequências nocivas do over tourism que outros mercados e destinos têm conhecido, mas interessa sim sermos reconhecidos como um destino onde a experiência do visitante continua a ser autêntica, onde os portugueses continuam a acolher o visitante com um sorriso de agrado genuíno, onde se sente que recebemos value for money mesmo que isso possa significar entregarmos muito valor a um visitante preparado para pagar pelo mesmo.
Acho que o setor do turismo é um pilar primordial da economia nacional e, como tal, pode perfeitamente ficar englobado num Ministério da Economia, não ficando isolado do mesmo dentro de um Ministério autónomo, havendo o risco de falta de alinhamento com outros setores importantes para o turismo.
Ao nível da tutela, que pasta atribuiria ao turismo (Ministério/ Secretaria de Estado/ outras pastas)? Que perfil deve ter o responsável pela sua tutela?
Correndo aqui também o risco de ser politicamente incorreto perante os meus pares da indústria, não considero que a pasta do turismo tenha que ser atribuída a um ministro. Acho que o setor do turismo é um pilar primordial da economia nacional e, como tal, pode perfeitamente ficar englobado num Ministério da Economia, não ficando isolado do mesmo dentro de um Ministério autónomo, havendo o risco de falta de alinhamento com outros setores importantes para o turismo.
preferia uma ou um gestor com provas dadas no setor e, de preferência, com uma passagem pelo privado, do que o contexto clássico na política que é o de se atribuir a pasta a um fiel “soldado” do partido no poder
Para mim, o critério mais importante ao nível da tutela é o da competência e perfil de quem a assume, neste caso a nível de uma Secretaria de Estado. Aqui corro também o risco de pensar que preferia uma ou um gestor com provas dadas no setor e, de preferência, com uma passagem pelo privado, do que o contexto clássico na política que é o de se atribuir a pasta a um fiel “soldado” do partido no poder. É mais um motivo para mim preferir que a vertente mais política – que não deixa de ter a sua importância – seja assumida pelo Ministro da Economia mas que o titular da pasta do Turismo seja grande conhecedor da nossa indústria.
Os meus ministros e secretários de Estado seriam remunerados ao mesmo nível dos gestores de grandes empresas porque é a única forma de se atrair talento
Uma nota também mais filosófica é a da remuneração dos ministros. Os meus ministros e secretários de Estado seriam remunerados ao mesmo nível dos gestores de grandes empresas porque é a única forma de se atrair talento, e não compro a ideia romântica de que se vai para a política unicamente com sentido de amor à Pátria. Isto significa que seriam inclusive remunerados com um elevado componente variável indexado à realização de objetivos e dos compromissos assumidos perante os eleitores.
Quais deveriam ser as principais linhas para a evolução turística nos próximos quatro anos?
Como referi anteriormente, considero que a estratégia de evolução do Turismo para os próximos anos deve estar inteiramente focada na sustentabilidade do destino e por sustentabilidade coloco em primeiro plano a preservação do seu caráter autêntico. Isso significa inclusive uma ação de fundo a nível de um conjunto de detalhes que afetam esse caráter de autenticidade e a experiência do visitante. Não os vou listar aqui mas estão relacionados com, por exemplo, uma intervenção a nível de um certo comércio de rua que propõe artigos para turistas provavelmente todos fabricados em países distantes e com custos laborais muito baixos e que nada têm a ver com o nosso artesanato local. Outro exemplo são as ruas com restaurantes a exibir ementas em várias línguas e com fotografias dos pratos, uma imagem que encontramos noutros países que “grita” tourist trap. Tenho muitos mais exemplos que ilustram esse tipo de turismo não sustentável mas que cada um poderá imaginar.
Como Primeiro-ministro, iria também promover uma certificação de autenticidade e sustentabilidade das cidades, localidades de turismo, unidades hoteleiras e outros intervenientes na cadeia de valor da indústria.
Como Primeiro-ministro, iria também promover uma certificação de autenticidade e sustentabilidade das cidades, localidades de turismo, unidades hoteleiras e outros intervenientes na cadeia de valor da indústria.
precisamos de dotar o destino de, pelo menos, um centro de congressos capaz de competir com os principais destinos do planeta nesse segmento assim como de promovermos a construção de unidades hoteleiras de grande dimensão
Para alem da sustentabilidade e da qualificação dos destinos, apostaria claramente no segmento dos congressos e grandes eventos corporativos que, como é sabido, trazem uma contribuição significativa para o nível de receitas. Para tal precisamos de dotar o destino de, pelo menos, um centro de congressos capaz de competir com os principais destinos do planeta nesse segmento assim como de promovermos a construção de unidades hoteleiras de grande dimensão, capazes de acolher várias centenas de hóspedes, algo que não existe em Portugal atualmente.
Considera essencial a alteração do papel do Turismo de Portugal?
Não porque sinto que a entidade Turismo de Portugal tem tido um papel muito positivo nos últimos anos e com pessoas de grande qualidade à sua frente, ora isso é o mais importante para se “fazer obra” e alcançar resultados tangíveis.
Enquadrando o turismo na restante economia, que prioridades daria ao Aeroporto de Lisboa, TAP, TGV e reforço da promoção do país?
Daria, sem hesitação nenhuma, a maior das prioridades à decisão de escolha do novo aeroporto e ao arranque do projeto. Daria sem hesitação nenhuma a maior das prioridades à ativação de linhas TGV em Portugal porque o comboio é um meio de transporte muito procurado e sem linha TGV entre Espanha e Portugal, Portugal fica de alguma forma desconectado do resto da Europa.
apesar de ter uma perspetiva bastante liberal relativamente à gestão de empresas, considero que o Estado deve manter uma posição minoritária no capital da TAP e, sobretudo, negociar, no momento da venda, certas condições que preservem o destino estratégico da companhia em relação ao setor do turismo
Relativamente à TAP, apesar de ter uma perspetiva bastante liberal relativamente à gestão de empresas, considero que o Estado deve manter uma posição minoritária no capital da TAP e, sobretudo, negociar, no momento da venda, certas condições que preservem o destino estratégico da companhia em relação ao setor do turismo. Ou então, tal como se pratica na hotelaria, manter o capital do seu lado mas realizar um contrato de gestão com uma entidade privada para que esta consiga assegurar uma gestão o mais independente possível das interferências políticas.
Que outros temas considera pertinentes que fossem colocados em cima da mesa governativa, desde a primeira hora.
Claramente a valorização dos empregos tentando promover mecanismos de remuneração variável em que este componente não seja tributado (até um certo limite na percentagem que representa no pacote total de remuneração) assim como introduzindo mecanismos atrativos de participação dos colaboradores no capital das empresas. Nunca o serviço é tão bom num restaurante quando este é gerido pelo seu proprietário…
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