A pandemia provocou uma paragem forçada da atividade hoteleira que, vendo-se sem clientes, por motivos de restrições à mobilidade (nacional e internacional), optou por se manter em funcionamento com os serviços e as equipas reduzidas ao mínimo ou preferiu mesmo fechar portas à espera de melhores dias. Mas isso não significa que os hotéis nacionais tenham deixado de investir na sua requalificação e procurado reinventar-se para responder à altura assim que a retoma se confirmar. Ambitur falou com alguns grupos hoteleiros que explicam de que forma têm ultrapassado este ano de pandemia e como esperam voltar a trabalhar em pleno.
Na DHM, a aposta na constante melhoria dos seus ativos para assegurar a excelência dos equipamentos já faz parte do ADN do grupo. O investimento de 21 milhões de euros na requalificação de algumas unidades tinha começado ainda no final de 2019 e estendeu-se durante todo o ano de 2020. Francisco Moser, managing director da DHM, destaca as intervenções no Palácio da Lousã Boutique Hotel, onde as áreas comuns, quartos e jardins foram totalmente renovados; no Monte Real Hotel, Termas & Spa, com remodelação de áreas comuns, salas de reunião e quartos; no Eden Resort, através da criação do Aqua Fun Park, a pensar nos mais pequenos, e de uma melhoria dos restaurantes, bares, receção, lobby e minimercado; no Praia Verde Boutique Hotel, que renovou os 40 quartos; ou ainda no Vila Monte Farm House, que passou a oferecer a Villa Indigo, uma moradia com três suites e piscina, capaz de conferir a tão desejada privacidade que os clientes procuram.
Mas as novidades não se ficam por aqui e a DHM irá abrir, ainda no primeiro semestre deste ano, inserido na categoria Design Collection, o Évora Farm Hotel & Spa, a segunda unidade no Alentejo, com 57 quartos num espaço com 11 hectares, e cinco vilas V3, ideais para famílias numerosas ou grupos de amigos. Já na categoria Hotels & Resorts, o grupo inaugurará o The Patio Suite Hotel, próximo da praia da Falésia, no Algarve.
Na Hoti Hoteis, a melhoria mais visível é a remodelação do atual TrypOriente com vista à mudança de marca para Meliá mas Miguel Caldeira Proença, CEO do grupo, confirma que os restantes hotéis também têm revisto algumas infraestruturas e a realizar trabalhos de manutenção, tudo para “estar melhor preparados para a retoma gradual da atividade”. Por outro lado, e conscientes de que a maximização da interação digital com os serviços do hotel veio para ficar, a Hoti Hoteis avançou com uma Webapp que integra um vasto conjunto de serviços internos dos hotéis, juntando ainda a inventariação de pontos de interesse da região circundante, tudo para “incentivarmos a interação dos clientes com os ativos relevantes a conhecer nas regiões onde se encontram os hotéis”, explica Miguel Proença.
Também nos hotéis Moov, que pertencem ao Grupo Endutex, a aposta foi dirigida ao hardware: “apostámos numa migração tecnológica dos serviços de atendimento e, durante o primeiro confinamento, desenvolvemos um sistema tecnológico de apoio às reservas e check-in que torna o processo mais autónomo e seguro”, garante André Ferreira, administrador do grupo espanhol. Com a nova App Moov Hotels o cliente pode contactar o hotel sem necessidade de interação pessoal, incluindo recomendações sobre o que fazer e visitar na cidade, e acesso exclusivo a campanhas e ofertas. Já ao nível das infraestruturas, o grupo não sentiu necessidade de fazer remodelações já que as unidades são ainda bastante modernas e recentes.
Algo que se verifica igualmente no Jupiter Hotel Group, cujo portfólio é “muito recente e moderno”, e composto por “unidades novas que foram lançadas no mercado nos últimos anos e/ou profundamente requalificadas nos anos mais recentes”. Mas Maribel Sequeira, administradora deste grupo, recorda que o grupo adotou uma política de “melhoria contínua que nos faz reinvestir todos os anos algo como 8% dos meios libertos operacionais do ano” no sentido de “garantir que os padrões de qualidade oferecidos pela nossa cadeia são estáveis e elevados, de forma consistente”.
A Vila Galé, por sua vez, ao longo do período pandémico, não só investiu em renovações como também na abertura de unidades. Foi o caso dos novos hotéis Vila Galé Serra da Estrela, Vila Galé Collection Alter Real e Vila Galé Paulista (Brasil), ou da expansão do Vila Galé Douro Vineyards. A paragem foi aproveitada para efetuar algumas melhorias em hotéis, explica Gonçalo Rebelo de Almeida, administrador do grupo. O Vila Galé Ericeira ganhou um novo espaço lounge e piscina interior; o Vila Galé Ópera tem um novo rooftop; os hotéis Vila Galé Cascais e Vila Galé Évora passaram a ter clubes NEP para crianças; o Vila Galé Náutico conta já com quartos temáticos dedicados ao NEP e com uma nova pizzaria Massa Fina; e os mais pequenos passaram a poder desfrutar de um novo espaço com piscina e escorregas aquáticos no Vila Galé Collection Palácio dos Arcos. Por outro lado, relembra o empresário, a cadeia portuguesa investiu nos recursos humanos, intensificando a formação em línguas e outras áreas operacionais, e acelerando os processos de digitalização a nível interno.
A reinvenção que se tornou uma oportunidade
Com a pandemia, os hotéis foram obrigados a limitar o uso de alguns serviços. Gonçalo Rebelo de Almeida acredita que “para funcionar bem e corresponder às expectativas dos clientes, os hotéis precisam de ter todos esses serviços em pleno funcionamento”. Perante o contexto pandémico, a Vila Galé procurou reinventar-se, de alguma forma, investindo em novas ofertas de serviços como os serviços de take away e delivery de refeições, serviços esses que poderão manter-se ultrapassada esta questão sanitária. O grupo lançou também uma loja online para comercializar produtos iguais aos que tem nos hotéis, como colchões, almofadas, mobiliário ou aparelhos de ginástica, a qual irá igualmente continuar a funcionar.
Por outro lado, foram várias as unidades hoteleiras que passaram a oferecer produtos que permitissem o uso dos quartos para trabalho. A Vila Galé também agarrou esta oportunidade e lançou uma proposta por um valor de 59 euros por dia, que inclui a utilização entre as 8H00 e as 18H00 do quarto preparado para trabalhar e com internet wi-fi de alta velocidade, pequeno-almoço e almoço executivo servidos no quarto, garagem e ainda 20% de desconto em massagens e tratamentos nos Satsnaga Spa & Wellness. Há packs de cinco dias ,cujo preço diário desce para 57€, e para quem opte pelo pack de 10 dias o valor é de 55€.
A reinvenção também fez parte do vocabulário da DHM durante estes tempos difíceis. “Se é verdade que foram impostas condições para a operação dos Spa, restaurantes, piscinas e centros de reuniões, também é verdade que os hotéis puderam olhar mais aprofundadamente para a sua oferta de atividades”, admite Francisco Moser. O grupo decidiu investir fortemente nas experiências que envolvem atividades ao ar livre, desde passeios por trilhos na natureza, piqueniques na praia, ioga ou meditação nos jardins, ou ainda visitas e workshops relacionados com as hortas dos hotéis. “A oportunidade para aliarmos o lazer ao bem-estar, principalmente numa época em que a saúde é o destaque, ajudou a que nos pudéssemos destacar e continuar a atrair clientes”, assegura o responsável.
A DHM também apostou no chamado “coworking”. O Villa C Boutique Hotel, em Vila do Conde, dispõe mesmo de uma sala para este efeito, com pacotes diários, semanais e mensais, adaptados às necessidades dos hóspedes e clientes exteriores. No Azor Hotel, em Ponta Delgada, o grupo está a planear o reaproveitamento das salas de reunião de que dispõe, seja para efeitos de “coworking” ou para eventos de natureza cultural.
Miguel Proença, da Hoti Hoteis, reconhece que as restrições aplicadas a vários serviços dos hotéis complicam a vida dos mesmos. “Faz sentido que o tempo mude o tipo de facilidades que os hóspedes valorizam mas não temos dúvidas sobre a insuficiência da nossa prestação de serviços se parte relevante das nossas facilidades não estiverem em operação, principalmente quando falamos de clientes de lazer”, admite. No grupo, a pandemia fez surgir novos produtos, preparando os hotéis para estadias longas ou providenciando serviço de takeaway através das estruturas existentes de F&B. Mas o empresário diz que os resultados “são marginais para a hotelaria generalista e de maior capacidade, onde o peso do alojamento se impõe de forma evidente na composição da receita total”.
Também nos Hotéis Moov, do Grupo Endutex, a pandemia permitiu identificar novas oportunidades de mercado, pelo aumento da tendência do “slow tourism” (estadias mais prolongadas, maioritariamente de lazer, mas também de trabalho). André Ferreira afirma que estão, por isso, a desenvolver um novo produto associado ao conceito de aparthotel, no Porto. “Poderemos reforçar a nossa resposta às novas exigências dos nossos clientes, que procuram as facilidades e benefícios da hospedagem em hotel, mas com maior conforto, privacidade, segurança e autonomia”, garante.
Procura nacional no comando
À medida que as restrições de mobilidade vão sendo levantadas, a hotelaria prepara-se para mais uma fase de trabalho que, espera, ser melhor do que depois do primeiro confinamento em 2020. Miguel Caldeira Proença acredita que, este ano, “será o movimento de lazer a despontar mais rapidamente e de forma mais visível” e que, mais uma vez, será “a procura nacional a comandar a procura de lazer”. O CEO da Hoti Hotéis também prevê que a distribuição do produto seja muito similar a 2020, com predomínio das reservas de última hora, do online e direto, não se esperando grupos ou eventos, nem movimentação e grandes contas ou GDS.
Também no Jupiter Hotel Group tudo aponta para que, no curto espaço, haja um aumento do online já que os operadores internacionais apenas começarão as suas operações com algum relevo a partir de junho. Maribel Sequeira, não prevê grandes alterações de atividade nos meses de abril e maio, aumentando as expectativas a partir de junho, e esperando que os meses de agosto, setembro e outubro atinjam “níveis de procura interna e externa bastante mais satisfatórios”. A administradora crê que os mercados de proximidade serão determinantes e está otimista quanto a alguma “ajuda internacional” a partir de junho.
Também na Vila Galé a esperança de que “de forma muito gradual e lenta” a procura internacional possa ressurgir a partir do segundo semestre do ano, apontando para que o mercado nacional comece a retomar em maio/junho. Gonçalo Rebelo de Almeida admite que a tendência pré-pandémica do aumento das reservas diretas e da distribuição online veio intensificar-se com o atual contexto.
Já a DHM confirma que mantém os parceiros habituais de distribuição, apesar de assistir a um crescimento de vendas através dos motores de reservas, que resulta da aposta do grupo neste canal. Francisco Moser está expectante de que abril e maio marquem já o início da retoma, dependendo da evolução da pandemia. “Sabemos que as pessoas estão a fazer a marcação das suas reservas com menor antecedência e, por isso, o real impacto só será sentido mais para a frente”, lembra o managing director do grupo. E admite que o mercado nacional possa continuar a ser aquele que mais negócio gerará, acrescentando contudo que, se o processo de vacinação nos países europeus se verificar mais acelerado, poderemos assistir a um aumento da procura externa ainda este ano.
Finalmente, o Grupo Endutex já está a sentir os primeiros sinais positivos da retoma da atividade económica. André Ferreira destaca que no que diz respeito ao target dos Hotéis Moov, o turismo de negócios, já se sentem algumas alterações nos comportamentos e hábitos dos clientes e há a perceção de que “ainda que as viagens a trabalho se mantenham, percebemos que são cada vez mais feitas individualmente e que o preço já não é o fator determinante no momento de reserva”. O administrador acredita que o turismo doméstico continuará a dominar as preferências dos portugueses e o grupo que dirige está preparado para “um fluxo muito instável de reservas, seja por cancelamentos ou por chegadas last minute”. Os Hotéis Moov vão aderir ao GDS, por enquanto apenas no Moov Oeiras, e estão otimistas de que tal “irá reforçar o reconhecimento mundial da marca, além de permitir identificar novos segmentos de mercado-alvo que podem estar interessados no nosso estabelecimento hoteleiro”, conclui André Ferreira.