A Ambitur.pt prossegue com a nova rubrica dedicada à Rota Vicentina que tem como missão convidar os nossos leitores a embarcarem numa viagem pelo Sudoeste e a conhecerem de perto o que é possível ver e viver nesta região. E quem melhor do que os empresários locais para mostrarem o que a Rota Vicentina tem de melhor? Por isso estamos hoje com João Ministro, CEO e fundador da Proactivetur, empresa de ecoturismo e turismo criativo, sediada em Loulé.
Quem é João Ministro e como surgiu a Proactivetur?
Sou um algarvio, natural de Loulé, com fortes convicções para com a necessidade de um desenvolvimento territorial sustentável (especialmente do interior) resultantes, talvez, de muitos anos a trabalhar e a colaborar com ONG’s de ambiente e derivado da própria formação académica (licenciado em engenharia do ambiente). Nesse percurso de aprendizagem, com mais de 30 anos, desenvolvi uma forte crença de que é preciso olhar para o território de uma forma integrada, harmoniosa e pragmática, onde o Homem tem um papel fundamental, mas no qual os valores ambientais e culturais não podem ser ignorados ou renegados para um plano inferior. E onde, claro, a economia tem um papel decisivo na mudança necessária, desde que produzida de forma responsável.
Enquanto empresário não me considero propriamente um “caso convencional”. Possivelmente, numa ótica essencialmente economicista, seria até classificado como um mau gestor. Isto porque essa minha função é muitas vezes secundarizada perante outros interesses, designadamente os ambientais, sociais ou voluntaristas. Na nossa empresa apoiamos iniciativas que numa visão meramente assente na criação de lucro, não seriam realizadas. Felizmente temos tido a capacidade de equilibrar as contas, crescer até, e não deixar de fazer projetos que nos dão enorme prazer e nos motivam na nossa missão diária de fazer algo útil pela região.
Que tipo de atividade desenvolve?
Somos, por um lado, um operador turístico de incoming que organiza programas de caminhada, observação de aves ou experiências culturais no sul de Portugal. A esse nível trabalhamos bastante com o mercado germânico, neerlandês, belga, sueco ou irlandês. Somos, também, empresa de animação turística e como tal preparamos e guiamos atividades diárias similares às referidas anteriormente. A este nível, temos vindo a ter uma enorme procura pelo mercado americano. Por outro lado, somos consultores em áreas relacionadas com desenvolvimento territorial, em particular na área do turismo de natureza e criativo, bem como na valorização das artes tradicionais. Neste campo, como exemplo, gerimos um projeto chamado TASA (Técnicas Ancestrais Soluções Atuais) (http://projectotasa.com) que procura valorizar o artesanato algarvio e garantir a sua preservação e sustentabilidade. Somos, também, fundadores de uma cooperativa, designada QRER (https://www.qrer.eu), através da qual apoiamos projectos focados no desenvolvimento integrado do interior algarvio.
Como surgiu o interesse em explorar este negócio? O que esta região tem de tão especial?
Desde muito cedo iniciei a prática de caminhadas e da observação de aves no Algarve e Baixo Alentejo. No início dos anos 90 já participava em atividades promovidas por organizações locais, como a Associação Almargem, que me permitiram descobrir uma região riquíssima do ponto de vista paisagístico, biológico e cultural. Mais tarde vim a exercer atividade profissional nessa mesma organização, onde coordenei a Via Algarviana e acompanhei de perto o nascimento da Rota Vicentina. Fiquei a conhecer muito bem o território, as pessoas que aí vivem e trabalham, bem como os mercados internacionais interessados nestes segmentos turísticos. Em 2010, quando terminei essa fase da minha vida profissional decidi então abrir a empresa para, no fundo, dar continuidade a este meu interesse pelas atividades ao ar livre e, sobretudo, dar um contributo positivo a este território que tanto precisa.
O Algarve e o Baixo Alentejo, ainda que diferentes em muitos aspetos, partilham muitos outros em comum: são riquíssimos do ponto de vista da biodiversidade, da cultural popular imaterial ou das paisagens, complementando-se entre si, permitindo uma oferta turística mais atrativa e distinta. A zona de influência da Rota Vicentina, em particular, abrange um dos territórios mais ricos do país em termos de fauna e flora, justificando por isso mesmo a existência de um parque natural (Sudoeste Alentejano e Costa Vicentina), vários sítios da rede Natura 2000, Geosítios e até uma reserva natural privada (em Aljezur). Tem ainda uma presença humana bastante enraizada nos recursos naturais locais, refletindo-se, por exemplo, numa agricultura tradicional bastante ativa, na pesca, nos produtos florestais e claro, numa gastronomia de excelência. É uma zona que tem atraído muitos novos residentes, de diversas geografias, que têm também trazido algo novo ao território. E tem, por fim, algo fundamental no desenvolvimento turístico: uma rede articulada de serviços de grande qualidade que são o garante da atividade na região.
Como contribui a Rota Vicentina para o desenvolvimento turístico da região?
A Rota Vicentina foi, o que vulgarmente se diz por “uma pedrada no charco”! Abriu a mente de muitas pessoas para o turismo de caminhadas, para o valor do território noutras vertentes que não apenas as materialistas e claro, impulsionou um aumento muito relevante da atividade económica na Costa Vicentina, especialmente nos períodos fora da época alta, que hoje se traduz em milhões de euros injetados diretamente na economia local e muitos empregos. Mas o papel da Rota Vicentina vai ainda mais longe: é hoje uma força local, composta por centenas de empresários, que tem capacidade em influenciar as políticas locais para a promoção de uma industria turística cada vez mais solidificada na sustentabilidade, responsabilidade e no respeito para com as comunidades. E isso é algo muito importante. O dinamismo impulsionado por este projeto é um contra-argumento valioso face a outros interesses, menos positivos, que se querem instalar ou expandir na região.
Por outro lado, a Rota Vicentina tem estado na linha da frente do pensamento e da reflexão em torno do turismo responsável e território, e como isso deve orientar o futuro para esta região. Este tema está, aliás, na ordem do dia nos fóruns internacionais de turismo e em Portugal a Rota Vicentina é, por ventura, quem mais tem procurado encontrar caminhos nesse sentido.
O que há de diferente na atividade de acolhimento/prestação de serviços aos turistas?
São áreas de negócio muito diferentes e com abordagens operacionais igualmente distintas. A forma como ambas se relacionam com os viajantes e visitantes são complementares, mas com exigências específicas. Ambas partilham algo em comum: a necessidade de prestarem um serviço de qualidade que agrade os visitantes e lhes dê conforto e felicidade. Enquanto no acolhimento há uma componente material importante, ao nível por exemplo dos quartos, casas de banho ou pequenos-almoços, nos serviços de guia e/ou apoio, há sobretudo uma componente humana que tem de ser desenvolvida, nomeadamente ao nível da comunicação, dos conhecimentos, da educação, entre outros aspetos. Naturalmente que isto também se aplica aos hospedeiros nos alojamentos, mas é mais essencial nos serviços exclusivamente imateriais. Há, contudo, algo que deve ser transversal em qualquer serviço turístico: o sentido de responsabilidade, a simpatia e capacidade de gerar confiança junto dos visitantes.
Qual a experiência que pretendem proporcionar aos vossos clientes? Que serviços vos distinguem?
Procuramos, no essencial, que os nossos visitantes tenham uma experiência enriquecedora, verdadeira, informativa e com muita qualidade. Queremos que saiam de cá com mais conhecimento do que traziam antes e uma perspetiva mais rica sobre o que é o Algarve ou o Alentejo. Queremos também mostrar que o turismo pode ser uma força positiva no desenvolvimento responsável da região e que os visitantes são parte ativa nesse processo. E tentamos transmitir isso nas atividades e ações que realizamos.
De que forma se relaciona a atividade/produto/serviço com a região?
Todas as nossas atividades têm em comum o facto de estarem muito assentes nos valores do território, sejam eles de ordem ambiental, cultural ou humano. Aliás, o turismo no geral tem essa característica. Mas a forma como as atividades assumem essa ligação, a promovem e dão a vivenciar varia imenso. Em muitos casos, nem reconhecem essa interdependência. Na nossa empresa procuramos que a ligação à região seja o fator de valor acrescentado e seja o motivo de atração dos visitantes. Como se estabelece tal ligação? De uma forma simples: com um bom conhecimento do território, pela criação de laços de confiança com as pessoas que vivem no mesmo e que aí exercem atividades relevante para a experiência turística (ex. artesãos, agricultores ou pastores) e por relações comerciais justas. Se todas as partes ganharem e ficarem satisfeitas, a região também ganha, seja pela preservação de uma arte ancestral ameaçada, pela manutenção de uma paisagem natural ou outro aspeto relevante na sustentabilidade territorial.
Da vossa oferta, se tivesse que eleger uma atividade/produto qual seria o que melhor reflete a identidade da região?
Na Rota Vicentina desenvolvemos diversas caminhadas, tanto no percurso histórico como no trilho dos pescadores, dando a conhecer as belas paisagens e os valores naturais associados às mesmas. Mas se há uma atividade que expressa bem as ligações de que falava antes é uma que fazemos com um agricultor local, o António Rosa, que consiste numa manhã passada com ele, na sua quinta biológica, a conhecer o seu oficio e a experimentar algumas tarefas, culminando com um belo de almoço tradicional preparado pelo mesmo. É uma experiência genuína, imersiva, bastante informativa e pedagógica até, recheada de bons momentos de convívio e de uma bela prova gastronómica de produtos locais de grande qualidade.