O The Fladgate Partnership agrega a intensidade do vinho do Porto, a hospitalidade e a cultura num negócio secular. A Ambitur rumou ao projeto mais recente, o WOW (World of Wine), em Vila Nova de Gaia, para desvendar um pouco sobre estes pilares em que Adrian Bridge, CEO do grupo, acreditou desde a sua chegada a Portugal, em 1994. Conheça aqui um empresário que se diz ambicioso por qualificar ainda mais o destino Porto. Leia a 1ª parte desta Grande Entrevista, publicada na edição 346 da Ambitur.
O Adrian vem para Portugal em 1994 para assumir o negócio da família nos vinhos do Porto e acaba por fundar o The Fladgate Partnership. Quando surge a ideia de formar este novo grupo?
Vim para Portugal em 1994 para assumir responsabilidades na Taylor’s e na Fonseca, que na altura se chamava Grupo Taylor Fonseca S.A. Só assumi, formalmente, o cargo de diretor-geral a 1 de Janeiro de 2000, porque o meu sogro fica responsável até ao fim do século. Em 2001, compramos a Croft e Delaforce, que passa a representar 50% do nosso volume de negócios. Na altura, o grupo tinha cerca de 140 pessoas e entraram mais 82, mas umas trabalhavam para a empresa Taylor’s e outras para a Fonseca. Eu não quis continuar esse sistema porque se a lógica é fazermos um novo grupo temos de estar todos debaixo do mesmo chapéu. As empresas entraram todas no mesmo grupo ao mesmo tempo, com a mesma importância, de forma a fazer a fusão das equipas e atingir os objetivos.
Vem assumir um negócio de família que adquiriu negócios de outras famílias. Era importante manter esta tradição familiar no trabalho?
A parte familiar ajuda numa empresa onde, ainda hoje, no caso do vinho do Porto, há pessoas com mais de 20 anos no ramo, o que dá uma sensação de pertença. O grupo The Fladgate Partnership dá duas coisas, esta ‘chapéu’, como já referi, e uma associação até ao século XIX das famílias ligadas ao vinho do Porto. Mas, para a eficiência das equipa e sinergias, é importante juntá-las. Por exemplo, o WOW – World of Wine, na fase de montagem do negócio, foi separado das outras empresas. Agora faz a fusão com o centro de visitas e com os hotéis, ligando tudo e onde todos os colaboradores têm conhecimento da história dos espaços. Essa sensação de que todos os negócios estão na mesma equipa é mais importante do que o facto de os donos serem ou não família.
Qual é o ADN do grupo?
O nosso grupo, em qualquer projeto que faz, baseia-se na qualidade. Na qualidade de nível mundial. Aqui em Portugal temos muita capacidade de concorrer com os melhores do mundo. Há uma necessidade de acreditar e a diferença é que, atualmente, há mais gente que acredita na capacidade de Portugal. Mas eu sempre acreditei na capacidade deste país atingir a qualidade de nível mundial. Em qualquer um dos nossos negócios, este é o nosso foco.
Quais os negócios que o grupo detém atualmente?
Temos quatro pilares: distribuição, onde temos produção em b2b (business to business) e b2c (business to consumer) e grossista; temos a parte da hospitalidade, com hotéis e atividades dedicadas ao turismo, seja restaurantes, centro de visitas ou museus; temos o vinho do Porto, com raiz no fim do século XVII, do qual celebramos 332 anos de atividade; e ao lado do vinho do Porto, temos a Fladgate Still and Sparkling Wines, que representa as novas empresas do vinho de mesa que foram compradas em agosto de 2023, com quintas e vinhos no Vinho Verde, Dão e Bairrada. São vinhos de muita qualidade, de referência mundial, que depois de serem estabilizados, serão um pilar que se juntará ao do vinho do Porto.
Qual é a força da marca e da imagem do vinho do Porto lá fora?
Quando falamos de vinho do Porto, falamos de categorias especiais que representam, atualmente, à volta de 25% do volume do setor e parece que este ano (2023) representa 50% da faturação do setor. Para nós, esse é o nosso negócio. Não temos vinhos do Porto correntes, temos as nossas categorias especiais do vinho do Porto que são vendidas em 105 países – é uma bandeira de Portugal e a realidade é que, lá fora, as pessoas conhecem Portugal pelo vinho do Porto, pelo futebol e pelo Cristiano Ronaldo. Por isso, esta capacidade de funcionar como uma bandeira do país dá-nos uma sensação de responsabilidade, mas também nos dá uma plataforma para angariar clientes para visitarem o nosso país, a nossa cidade, a nossa região e as nossas quintas. Desde o lançamento do The Yeatman, ou até antes disso, com o lançamento do The Vintage House, no fim dos anos 90, o objetivo foi chamar a atenção de pessoas apaixonadas por vinho do Porto. Fizemos a contratação de Ricardo Costa (para o The Yeatman) e ganhámos a nossa primeira estrela Michelin em 2011 e recebemos a segunda em 2016. Este prémio sublinha a excelência porque as regras da estrela Michelin são as mesmas em Portugal, em Paris ou em Xangai. Para a nossa lógica, pessoas interessadas no vinho do Porto vêm visitar a cidade e, por consequência, o produto vai entrar na alma delas e elas vão querer voltar, contar aos amigos e à família. Vão, assim, estimular mais pessoas a visitar a nossa cidade, e com isso podemos construir este ciclo positivo, onde o visitante tem uma boa experiência, fala com os seus familiares que acabam também por vir e que começam igualmente a consumir vinho do Porto. Isto, do ponto de vista do marketing do vinho do Porto, funciona muito bem. E vamos continuar a expandir. Não só o vinho do Porto, mas também o The Yeatman, que também é de alta qualidade.
Começa com os negócios do vinho e entra para o mundo da hotelaria. Foi uma estratégia para atrair mais pessoas?
Sim, mas é mais do que isso. O Porto era um destino de negócio, não era um destino de lazer, ou seja, quando analisámos os dados em 2006/07, quando começamos o planeamento do The Yeatman, a taxa de ocupação dos hotéis de cinco estrelas era de 42% e com preços à volta dos 110 euros, e os hotéis de quatro estrelas tinham uma taxa de ocupação à volta dos 50% e preços nos 60 euros. Na realidade, quando começámos o The Yeatman, este destino tinha hotéis a mais e preços baixos que não suportavam o investimento que se fazia. Obviamente que o desafio foi construir um destino de lazer, um destino de turismo de luxo, um turismo onde as visitas pagam bem, ou seja, pagam o valor correto pela qualidade que se oferece. Na altura, todos acharam que eu estava louco por abrir um hotel em Gaia, deste lado do rio do Douro, fora do centro de negócios do Porto, fora da zona de Bessa, onde estavam o Porto Palácio e o Sheraton. E o The Yeatman é um hotel pequeno, sem uma marca de renome internacional, gerido por um grupo que tem experiência em vinhos do Porto e não em hotéis, e com preços ao dobro do melhor hotel da cidade. Eu acreditei muito no destino e no potencial desta cidade. Construímos e quem na altura disse que o The Yeatman ia ser impossível, hoje diz que o sucesso do hotel era óbvio porque tem as vistas [para o rio Douro]. Mas eu não construí as vistas, eu construí o hotel.
Temos os vinhos, a hotelaria, o destino Porto e aqui o nascimento de uma parte cultural – o WOW – World of Wine – que agrega todas as vertentes. Foi um projeto importante?
Eu considero importante um negócio de turismo sustentável. E nós temos sorte. O The Yeatman funciona muito bem, é uma referência no Norte e parece que é um dos melhores hotéis no nosso país e o melhor hotel vínico na Europa. Mas um negócio sustentável precisa de conteúdo. As pessoas não vão prolongar a sua visita se não houver nada para fazer, por isso, criámos o que fazer. Em 2010, os armazéns de 50 mil m2 no centro da cidade deixaram de ser usados como tal e atribuiu-se outra utilização, passando os novos armazéns para junto das adegas no Douro. Tínhamos duas opções: ou vendíamos estes armazéns e faziam mais hotéis ou alojamentos, algo fora do nosso controlo, ou controlávamos a evolução do espaço. Esta é a nossa cidade há mais de três séculos e é importante controlarmos o que se faz no nosso terreno. Não quero um vizinho ao lado a construir prédios feios. Se não houvesse terreno não iríamos comprar cinco hectares para construir o WOW, mas como somos donos, tivemos a opção de fazer algo que vai ajudar a cidade a trazer mais pessoas, que terão a oportunidade de provar o vinho do Porto, os vinhos portugueses e a comida portuguesa. Esta é uma maneira de gerar consumidores para o nosso produto. É um negócio, mas é um bem pela cidade e pelo destino. E este tipo de investimento de 110 milhões de euros já estimulou, à sua volta, em construções e empreendimentos, mais de 600 milhões de euros de investimento. Isso é bom para a economia portuguesa.
Por Diana Fonseca. Fotos @Raquel Wise.
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