A Ambitur, em parceria com a AHP – Associação da Hotelaria de Portugal, organizou a sua primeira Ambitur Talks na Decorhotel na passada quinta-feira, na FIL, em Lisboa. Os oradores abordaram ao longo da conferência várias temáticas relacionadas com a “Liderança na Hotelaria”, entre as quais a importância da retenção do talento e o problema da elevada rotatividade no setor.
Miguel Velez, CEO da Unlock Boutique Hotels, não hesitou em afirmar: “Não gostamos de crescimentos de aviário, mas fazemos crescimentos rápidos para quem efetivamente tem talento”. E explica que a empresa que
fundou há cerca de sete anos não tem qualquer problema em pagar salários elevados ou promover rapidamente quem o merece, independentemente da idade, acrescentando mesmo que, durante o mesmo ano, pode acontecer haver duas progressões e dois aumentos salariais. “As regras são muito flexíveis porque queremos reter aqueles que são os melhores para nós, para a nossa realidade”, frisa.
O gestor recorda que a Unlock Boutique Hotels foi criada com o propósito de dar origem a uma rede de hotéis boutique em Portugal a partir de unidades independentes. E, esclarece, “tentamos explicar este princípio” a todos aqueles que entram na empresa, a partir de um determinado nível, “tentamos muito que percebam a nossa missão”. Na prática, adianta, isso significa reuniões semanais com todos os diretores para partilha de novidades, por exemplo. E tudo isso leva à existência de um espírito de missão. “Para nós tudo começa no espírito de missão” e a partir daí “queremos ser muito proativos a dar os aumentos salariais e as progressões de carreira, exatamente para reter esses elementos”, indica Miguel Velez. Claro que o orador admite que é impossível chegar a todos e, por isso, “concentramo-nos nos talentos”, mas reconhecendo que haverá sempre entradas e saídas, porque “o mercado é assim”. E é por esta razão que, explica, ao nível dos responsáveis de hotel, “temos um turnover baixíssimo”, pois “as nossas equipas genuinamente vibram com aquilo que vai acontecendo na empresa de positivo”.
“Trabalho numa empresa que assume que se não tiver pessoas boas a trabalhar, fica sem negócio”
Também na Discovery Hotel Management (DHM) existe esta noção de que 50% do tempo tem de ser dedicado ao capital humano interno. Joana Soeiro, COO da empresa, garante que “trabalho numa empresa que assume que se não tiver pessoas boas a trabalhar, fica sem negócio”. E este é um reconhecimento que faz parte do ADN da DHM, aponta a oradora, porque “há uma assunção de que o nosso negócio é feito de pessoas e para
pessoas”.
A responsável indica que a sua inspiração tem muito por base a cultura de serviço asiática: “Sou eu a servir as minhas equipas” e isso significa “estarmos muito atentos a escutar e a personalizar as nossas decisões”. Mas a linha é muito simples: pessoas. “Temos identificadas as necessidades, tentamos investir muito tempo a ouvir as pessoas, a estar próximo das pessoas”, sublinha.
E Joana Soeiro refere que esta disponibilidade é reconhecida pelas pessoas que trabalham na DHM, onde apenas nas equipas base o turnover é mais alto, pois “não somos exceção a nenhuma indústria”, tal não se verificando a nível dos diretores gerais e das chefias intermédias. E, acredita, “quando se retêm connosco, é porque, de alguma forma, estão a acreditar que estão no sítio certo”.
A mudança motivada pela geografia e pela ascensão rápida
Já Diana Castello Branco, Regional Director of Public Relations and Communications do Ritz Four Seasons Lisboa, fala da experiência de trabalhar numa cadeia internacional com hotéis de luxo por todo o mundo. E
esclarece que o que evidencia é que hoje os jovens facilmente dão o salto para trabalhar noutra cadeia hoteleira “sem um piscar de olhos”, não havendo a ideia de solidificar uma posição.
O que os move? Quando questionada, a oradora acredita que, normalmente, acaba por ser uma questão de geografia mas também o facto de “não quererem esperar” para atingir determinados cargos. “Saltam para ter uma ascensão mais rápida, e não necessariamente pelo salário, e na Four Seasons as coisas normalmente demoram um pouco mais, há passos a dar”, justifica. Por outro lado, a possibilidade de alguém que está em Lisboa poder saltar para o Dubai, Londres ou Paris existe “e normalmente são os mais jovens quem as aproveita”.
O que faz a diferença “é a pessoa com quem vou trabalhar”
Marta Sotto Mayor tenta explicar a razão desta necessidade de mudança por parte das gerações mais jovens que trabalham no setor hoteleiro. “Eles saltitam até encontrarem o que é melhor para eles e para onde sentem
que faz sentido”, aponta a formadora e consultora internacional. A verdade é que, lembra, noutros tempos isso talvez não acontecesse pois o mercado não era tão aberto e não havia tantas oportunidades. “As possibilidades hoje são muitas, e ainda bem”, reconhece. Por outro lado, a oradora recorda que chega a uma altura em que o salário está “absolutamente equalizado”, independentemente da empresa, e aí o que faz a diferença “é muitas vezes a pessoa com quem vou trabalhar, e aí batemos no líder”.
Marta Sotto Mayor admite que, durante a pandemia de Covid-19, houve muitos profissionais que acabaram por abandonar a hotelaria, e o turismo, e abraçar outros setores. Até porque, frisa, “temos profissionais que falam vários idiomas, que têm este carácter de servir e da hospitalidade, e de estarem ao serviço do outro, que foram formados pelas nossas escolas hoteleiras, que estiveram nos nossos hotéis, e a quem transmitimos esta forma de se fazerem as coisas”. O que aconteceu foi que, ao descobrirem “que há um admirável mundo novo” fora do setor, não querem voltar. Além do que, explica, “esse admirável mundo novo também nos descobriu a nós, enquanto profissionais do setor, e isso colocou desafios muito grandes”.
Mas a oradora volta a apontar a importância de ser líder, ou seja, de fazer com que os resultados apareçam à conta do trabalho de terceiros. “Como é que isso se faz de uma forma que seja boa para todos”, é a questão que deixa no ar. E é nesse sentido que Marta Sotto Mayor também alerta para a importância de recrutar bem, e aí o setor pode aprender com outros, “para que não haja simplesmente a retenção mas sim que sejam eles a querer ficar”.
Por Inês Gromicho. Fotos de Raquel Wise/Ambitur
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